6. The Breakfast Club

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Assim como tudo em sua vida, o quarto dele era tudo que o meu não era.

Enquanto as paredes do meu quarto estavam cobertas com recortes de jornais e alguns posteres de bandas que comprei ao longo dos anos, as dele se pareciam mais uma galeria de arte. Do lado direito tinha dois quadros emolduradas com fotos de carros em movimento, um pôster de filme com cinco adolescentes apoiados uns aos outros logo abaixo e outros três quadros do lado esquerdo. Em cada um delas tinha a foto de um jogador de futebol diferente. Ao lado da escrivaninha estava uma estante dourada com vários troféus ganhados por ele em diversos campeonatos, todos de tamanhos variados e com formatos aleatórios, além de algumas medalhas penduradas. 

Era realmente grande a diferença entre nós dois.

Caminhei pelo cômodo, completamente maravilhado com a tamanha masculinidade daquele lugar. Tinha um pequeno banheiro no fim do quarto com uma porta grande de vidro, uma pia tão elegante quanto o vaso e um espelho com armário cheio de produtos de higiene como colônias e desodorantes daqueles que os comerciais usam para melhorar a insegurança dos adolescentes. O quarto era como um planeta alienígena para mim, não tinha nada que não fosse feito para um jogador, tudo era másculo, até mesmo o relógio em formato de bola de futebol na mesinha que gritava "eu sou um garoto!". 

E isso me lembra que esteriótipos de gênero são uma merda.

"Então, o que você acha?" ele perguntou após sentar-se na beirada da cama king size, afundando-se no colchão visivelmente mais fofo e mais confortável do que o meu.

Eu sabia o que sua pergunta queria dizer, é claro. Eu não sei como isso funciona com as garotas, mas para nós garotos, não existe nada mais sagrado do que nossos quartos. É a única parte da casa onde nós podemos deixar da forma que queremos, e com razão, pois é um lugar onde nossas personalidades são refletidas. Não há nada que diga mais sobre como um garoto é do que seu quarto, mas você precisa saber como interpretá-lo. Para mim, as fotos dos carros não insinuavam desejo por automóveis caros, mas sim o desejo de ser livre, de poder correr. Movimento e velocidade — algo que poderia te levar para o mais longe possível. As fotos dos jogadores de futebol demonstravam o que ele queria se tornar, eram sua motivação para fazer dar o seu melhor e se tornar alguém um dia. Todos os três eram brancos, de boa aparência provavelmente com vidas perfeitas, assim como Harry. Notei também que mesmo sendo estrelas do futebol, nenhum deles era realmente famoso na vida real. Diferente de algumas pessoas que usavam o esporte para alcançar o sucesso, esses homens eram apenas jogadores de futebol e nada mais. Talvez por amor, não por luxo.

Mas foi o pôster do filme que me deixou confuso.

Eu quero dizer, todo mundo já viu esse filme. Independente do ano em que ele foi lançado — o filme define como é estar no ensino médio. Diferente dos contos de fada com finais felizes, o filme retratava cinco alunos que eram forçados a passar o dia juntos até perceberem que tinham mais em comum do que imaginavam. O fato é que, na vida real, as coisas não eram bem assim e mesmo que fossem, quando chegasse segunda-feira todos já teriam esquecido do que aconteceu, ou pelo menos fingiriam que sim. Esse filme mostrava como cada estudante gostaria que as coisas acontecessem, mas ele tinha mais significado para nós que não somos tão descolados. Ele foi feito para os nerds, os desajustados, os fracassados, e ver aquele pôster pendurado na parede do garoto mais popular da escola me fez perceber que tinha muito mais coisas sobre ele do que eu ou qualquer pessoa conseguia enxergar. Harry poderia ir para a escola pelado no dia seguinte e se tornaria mais popular antes mesmo de alguém lhe oferecer uma toalha. Ele poderia declarar que água "não é legal" e haveria uma multidão de pessoas morrendo de sede logo em seguida. Pensar que ele assistiu ao mesmo filme que eu e gostaria que sua vida fosse diferente... 

Bem, isso era intrigante.

"Eu amo esse filme," eu disse, apontando para o pôster.

Eu achei que já tivesse visto todos os sorrisos que ele conseguiria mostrar desde que nos esbarramos naquele corredor, mas agora, enquanto ele assente com a cabeça, exibe um sorriso ainda mais maravilhoso do que qualquer outro. Foi então que percebi que aquela era a primeira vez que eu realmente o via sorrir. Quero dizer, um sorriso de verdade, sem precisar forçar ou fingir um. "Então, qual deles é você?" Ele perguntou com curiosidade.

Outra pergunta popular na escola, e mesmo que parecesse simples, ela era complexa e precisava ser bem pensada antes de respondê-la. Se você disser que é o atleta, está dizendo que está em melhor forma do que todo mundo. Se disser que é a princesinha, está assumindo que é uma vadia. Se disser que é o encrenqueiro, está falando que é mais popular do que pensa ser. Se disser que é o nerd, está alegando que é mais esperto do que todo mundo. E se disser que é o que não sabe de nada, estará assumindo que você está escondendo algo que não quer que ninguém saiba. Não existia resposta certa. Todas elas te entregariam.

"Nenhum, eu acho," menti, sabendo exatamente qual deles eu era. Coloquei minha mochila no chão e me sentei na beirada de sua cama, tentando fazê-lo esquecer do assunto. "Então, quer começar agora?"

Houve um silêncio que perdurou por alguns segundos enquanto eu pegava meu livro de história dentro da mochila e começava a folheá-lo. Quando ergui o rosto para fitá-lo, pude ver que seu sorriso ainda estava lá. Aquele sorrido maldito que parecia dizer "eu sei que você está escondendo alguma coisa". Então ele balançou a cabeça e ajeitou-se sobre a cama. "Você que sabe," ele respondeu, deitando-se com a cabeça próximo a beirada da cama, me olhando de lado com uma expressão divertida. "Por onde nós começamos?"


Boys Don't CryOnde as histórias ganham vida. Descobre agora