1. Far Away

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Eu não me lembro do momento em que eu estava quebrado.

Eu tinha dezessete anos e estava perto de completar dezoito, o que parecia assustador para um garoto que não tinha certeza sobre sua sexualidade. Eu sabia que gostava de garotos, mas ainda me iludia com a ideia de que isso não me fazia ser gay, só me fazia ser diferente, e como todo mundo sabe, não tem nada pior na escola do que ser diferente. Mesmo que as séries ou filmes te digam que aquele cara chato e sem graça é um componente necessário para deixar as coisas mais interessantes no meio dos outros personagens, ninguém nunca fechou os olhos e desejou ser estranho.

Eu nunca assumi que estava quebrado, vindo de uma família desestruturada que consistia em uma mãe que passava a maior parte do tempo bebendo do que sendo uma verdadeira mãe - não que eu soubesse como uma mãe de verdade se parece. Mas ainda sim, a cultura pop ensinou que as mães ou estão fazendo tortas usando pulseiras e colares de pérolas, esboçando um sorriso de comercial de creme dental com cabelos louros brilhantes, ou são aquelas mulheres de meia idade que usam suéteres e trabalham duro, mas não são capazes de se sentir bem consigo mesmas para ter um relacionamento duradouro. Minha mãe não era nenhum dos dois, e o conceito de pai para mim era tão familiar quanto andar na lua.

Eu era emocionalmente retardado de uma forma que sempre me fez ter medo de interagir com outro ser humano pelo medo de que isso me desencadeasse uma crise de ansiedade que me faria parar de respirar e desmaiar, tudo ao mesmo tempo. Desde o ensino fundamental, os garotos sempre me fizeram sentir diferente, e não de uma forma boa. Mas daquele jeito bobo, que faz suas pernas balançarem, assim como a maioria dos garotos se sente perto das garotas. Deixe-me lhe dizer que ninguém gagueja como eu quando é pego fazendo algo de errado. Todo o som ao meu redor fica mudo e minha visão se embaralha sempre que algum garoto ficava pelado ao meu lado. Perdi as contas de quantas vezes eu tive que me forçar a olhar para o lado enquanto me trocava no vestiário da escola.

Quando eu comecei o ensino médio, eu construí um iglu imaginário que mantinha as emoções distantes de mim e de todo mundo ao meu redor. Eu projetei uma geleira dentro de mim que beirava o esnobismo. Eu era o garoto que todo mundo sabia quem era, mas que ninguém se atrevia a conversar pessoalmente. Eu me imaginava como uma lenda urbana na Foster High School, como o pé grande ou o chupa cabra. Todo mundo tinha um amigo que supostamente tinha me visto conversando com alguém, mas a verdade é que ninguém nunca falou comigo pessoalmente. Eu era um fantasma passeando pelos corredores com a cabeça abaixada, a mochila sobre um dos ombros, os olhos focados em onde meu próximo passo iria me levar e nada mais. Em um ambiente onde ser legal e divertido era quase uma moeda de troca, eu era um monge que vivia da pobreza. Eu evitava conversas, almoçava sozinho e praticamente corria para casa depois da escola.

Eu não sabia disso, mas eu estava quebrado de uma forma que não era visível para as pessoas ao meu redor.

E como todo mundo que já leu revistas em quadrinhos deve saber, quando um dos seus sentidos é tirado de você, os outros ficam mais aguçados e você se torna quase um super humano, o que te dá a habilidade de alcançar o seu melhor na vida. Desde que eu completei o meu último nível de conhecimento sobre como as emoções funcionam para as outras pessoas, todos os lugares da minha mente que eu não usava foi ocupado por essas descobertas, o que amplificou meu intelecto ao nível Rain Main. Eu aquela pessoa que nunca precisava estudar, que nunca lia algo mais do que uma vez, e que sempre terminava as provas primeiro. Eu queria ter nascido em algum tipo de universo paralelo onde ser o nerd da escola é legal, onde todo o meu vasto conhecimento sobre as coisas me desse algum tipo de crédito ou fama e me transformasse em uma celebridade, mas infelizmente isso não aconteceu. Ao invés disso, a natureza me fez ser um nerd dos piores e me deu o título de ser melhor em ficar quieto e nunca olhar para cima enquanto caminho.

Eu acho que é por isso que eu não o vi chegando.

Boys Don't CryOnde as histórias ganham vida. Descobre agora