Você morreu. Não há como voltar.

A luz branca no banheiro piscou. Ele não sabia mais quantas vezes já tinha encarado aquele espelho. Levantou o rosto devagar, e o homem à sua frente fez o mesmo — olhos cansados, mas afiados como lâminas.

Lavou o rosto mais uma vez, respirou fundo e tentou se acalmar. A sucessão de choques o obrigara, aos poucos, a aceitar o impossível. Mesmo sendo materialista até os ossos, não havia argumento que conseguisse negar a realidade.

A água escorreu pelo cabelo da testa e bateu nos cílios antes de cair. Ele fechou os olhos por um instante e tomou sua primeira decisão concreta desde que acordou neste mundo:

Se é aqui que estou... então vou viver aqui.

Pela primeira vez, analisou de verdade o corpo que estava usando.

O nome era o mesmo. A altura era parecida. Mas o rosto... não era o dele.

Seu rosto original era "bonito na média alta". Este, porém, era quase agressivo de tão perfeito: nariz alto, lábios finos, maxilar marcado, traços tridimensionais como esculturas. Bonito, sim — mas carregando uma ferocidade fria, especialmente pelas sobrancelhas carregadas.

E este corpo era muito mais alto. Se antes ele tocava o topo das portas só com o cabelo, agora o batente quase raspava na cabeça dele.

Mesmo em meio ao caos, seus hábitos antigos apareciam: organizou a camisa branca impecável, ajeitou a gola. O reflexo parecia arrumado... mas não menos perdido.

Aproveitando que o hospital faria sua revisão final, Jiang Yunshu pegou o registro médico e perguntou:

— Doutor... eu tenho família?

Quando acordou pela primeira vez, lembrava vagamente de uma figura ao lado da cama — cabelos longos, pretos, cobrindo o rosto. No entanto, com o caos, esqueceu esse detalhe completamente.

O médico respondeu num tom tão natural que pareceu até piada:

— Você diz... seu ômega?

Jiang Yunshu piscou.
— ...O quê?

Minutos depois, foi literalmente empurrado para fora do consultório com um panfleto de educação sexual e um bilhete com um endereço.

Uma hora depois, parou diante de uma comunidade chique, com guarita grande, calçada impecável e árvores alinhadas como sentinelas.

— O Sr. Jiang voltou? Quanto tempo! — disse o segurança.

Jiang Yunshu confirmou que realmente era o endereço certo.
— É... quanto tempo.

O segurança o observou indo embora e murmurou, confuso:
— Três anos e é a primeira vez que ele responde uma saudação...

Após caminhar mais de meia hora, encontrou a casa. Era uma vila de dois andares, com um pátio grande, grama impecável e uma enorme árvore no centro — verde, viva, bonita. Por um segundo, aquela visão acalmou seu peito.

Tocou a campainha. A tela eletrônica acendeu. Depois de alguns segundos, um menino muito magro surgiu correndo, ofegante. Ele era tão leve que o vento parecia empurrá-lo para trás; o cabelo balançava como se fosse pesar menos que o ar.

Por um instante, Jiang Yunshu achou que era Zhou An — um paciente de dois anos atrás. Mas logo percebeu que não. Este menino era ainda mais frágil.

Como médico, o diagnóstico silencioso veio automático: desnutrição por longo prazo, anemia, quase nenhum músculo, pele amarelada e marcada.

Mas mesmo debilitado, o garoto era absurdamente bonito — olhos grandes e caídos, nariz pequeno, rosto delicado, pele clara como porcelana.

E, mesmo assim... perdido. Apagado. Assustado.

Quando o menino finalmente falou, sua voz tremeu:

— S-senhor... você voltou...

"Senhor?"
"Você?"

Jiang Yunshu reconheceu os cabelos longos — devia ser a pessoa que viu no hospital. Talvez algum empregado? Babá? A relação era um mistério.

Ele simplificou:
— Eu... perdi minha memória.

O menino baixou a cabeça tão rápido que parecia pedir desculpas ao chão.

— Eu sei... me desculpe, senhor... por favor, entre...

Quando Jiang Yunshu passou pela porta, testemunhou algo que o deixou congelado.

O menino se ajoelhou.

Sim — ajoelhou.

Pegou um par de chinelos masculinos no armário e estendeu as mãos para calçar Jiang Yunshu, como um servo antigo servindo a um nobre cruel.

O choque foi tão grande que o médico recuou automaticamente.

— Não faça isso! — disse, segurando o braço magro do garoto.

O menino ficou ali, ajoelhado, sem entender a repreensão. O rosto vermelho de vergonha, os olhos baixos, as mãos tremendo.

Jiang Yunshu trocou os sapatos sozinho, respirou fundo e perguntou com toda a calma que conseguiu manter:

— Qual é exatamente... a sua relação comigo?

O garoto congelou. Depois abaixou ainda mais a cabeça, a voz tão baixa que parecia sumir no ar:

— S-senhor... eu... eu sou seu ômega...

Why Is It Possible For This Type Of A To Also Have An O?Where stories live. Discover now