Capítulo 8 - Faith

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Pior do que deixá-lo adormecido na cama, só a vontade de permanecer junto dele. Com certo assombro, eu deixei aquele apartamento, ciente de que havia passado algumas das melhores horas da minha vida ao lado de um completo desconhecido. Nunca havia pensado ser possível atingir um nível tão alto de intimidade com alguém que só havia visto duas vezes. Se eu disser que transcendeu o ato físico, talvez colabore com a visão esotérica que Max tem de mim. Eu realmente não ligo.

Não sou promíscua, entretanto também não sou nenhuma virgem enclausurada. Tive alguns amantes. Uns experientes, outros nem tanto. Posso dizer, sem medo de errar, que com nenhum deles estive perto de alcançar tal sintonia. Em muitos momentos, nós nos entendemos apenas com um olhar, sem a necessidade de palavras. Confesso, isso me assustou, percebi que a ele também, contudo nosso medo não diminuiu em nada a intensidade do encontro e a qualidade de nossos orgasmos.

Os meus devaneios sobre a tarde maravilhosa foram interrompidos quando cheguei ao hotel. Descubro que a paciência do meu tio chegou ao fim, já que ele me aguarda no saguão, com uma expressão nada amigável. Ele está um pouco mais velho do que me recordo, entretanto ainda é o altamente charmoso, com seu cabelo grisalho e sua elegância britânica. Jamais esqueceu os anos que morou nas terras da rainha, talvez, por isso, mantenha o rigor com os compromissos.

Faith! – diz o meu nome e abre os braços para mim, recebendo-me com um caloroso abraço. Não se enganem, ele está bravo comigo, só está esperando a melhor hora e o lugar mais apropriado para me dar uma bela bronca.

Meu tio não se parece em nada com a minha mãe. Não digo só fisicamente, refiro-me à personalidade também. Ele tem um jeito racional de lidar com coisas que saem da rota considerada normal, ao contrário de minha mãe. Se ela fosse tão racional quanto ele, talvez eu não precisasse ter viajado até aqui.

Podemos ir até o seu quarto? – questiona, porém, não é uma pergunta, é exatamente o que faremos, ele só está me comunicando. Leio nas entrelinhas que quer ficar a sós comigo.

Claro! – faço um gesto, indicando-lhe o elevador e caminhamos lado a lado. Ele acabou de reprovar meus trajes de corrida, percebo pelo jeito como franze a testa de modo quase imperceptível. Nenhuma palavra no elevador deve ser um mau sinal.

Chegando ao meu andar, sigo na frente e abro a porta do quarto e peço que entre, mas cavalheiro que é, ele faz questão que eu entre primeiro. Indico-lhe que espere no sofá.

Vou trocar de roupa e já volto – anuncio e vou para o quarto tentar decidir, em menos de cinco minutos, uma roupa apresentável para ouvir uma bronca.

Não me transformei em nenhuma princesa de Mônaco, mas estou muito bem-vestida para a conferência com o meu tio. Muito melhor do que eu estaria, se estivesse sozinha no quarto. Ainda que não seja nenhuma roupa esportiva e o clima esteja ameno, optei em continuar usando mangas compridas, para ele não perceber os curativos.

Ele ainda não se sentou, ao contrário, está em pé, examinando o lugar que escolhi para me hospedar. Faço novamente o gesto para que se sente e me sento. Diante dele, não ouso sentar sobre as minhas pernas, como gosto, porque isso renderia outra palestra.

Não pode continuar agindo assim, Faith – inicia, sentando-se finalmente ao meu lado – Era imprescindível que tivesse ido me ver, assim que chegou à cidade. Eu falei isso para o Seth, não sei o motivo que o fez não seguir minhas recomendações.

Eu estendo a mão para ele, como se estivesse me apresentando.

Prazer, eu sou o motivo – digo séria – Meu Deus, eu não tenho doze anos, tio. Eu iria amanhã, após ter feito algumas coisas na cidade.

Como correr até essa hora? – o olhar de censura dele é pior do que a pergunta – Você não pode agir como se nada estivesse acontecendo, Faith. Se essa é a sua forma de lidar com a situação, sinto muito, mas não vai dar certo.

O que o senhor pode saber disso, tio? Não vejo o mal que existe em fazer o que tenho vontade. É a minha vida, a mim cabe fazer o que acho certo ou errado.

Ainda que isso provoque o sofrimento de sua mãe, das pessoas que lhe amam? – quer saber e eu sinceramente não tenho uma resposta para dar por alguns segundos.

Eu não tenho poder nem sobre a minha vida, que dirá sobre a das outras pessoas – dou de ombros, visivelmente irritada – Só não espere que eu seja diferente do que eu sou. Porque isso é impossível.

Tudo bem, eu não estou aqui para lhe deixar nervosa – seu tom é mais calmo – Quero que vá para minha casa, será mais fácil com você perto de mim.

Eu olho para cima, pensando. Não sei realmente se quero ir. Penso em uma moeda de troca boa o suficiente. Se ele aceitar, eu me mudo imediatamente para sua rica mansão.

Eu só irei, se o senhor cumprir a promessa que me fez – digo de uma vez.

Não é hora para chantagens, Faith.

Não é propriamente uma chantagem, se traz benefícios para mim e para o senhor – digo irredutível – Você, pelo menos, assistiu?

Ele faz que sim com a cabeça, mas sua expressão não me deixa adivinhar se achou bom ou ruim.

E então? – pressiono, se ele me quer tanto como hóspede, terá que ceder.

Depois de alguns minutos em silêncio, ele faz que sim com a cabeça.

Tudo bem, entretanto será apenas para um grupo restrito, não para toda a comunidade, como você desejava. É isso ou nada.

Quando podemos fechar a conta do hotel? – sorrio vitoriosa, enquanto ele se levanta e me pergunta sobre as minhas malas.

ELA (Degustação)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora