Corrida

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Em alguns lugares as mudanças das estações são marcadas pela passagem de pássaros migratórios, ou pela maré alta ou baixa. 

Na nossa cidadezinha, as estações são marcadas pela volta dos turistas. 

Começa aos poucos, as pessoas saltando dos trens ou dos carros usando casacos impermeáveis coloridos, segurando seus guias de viagem e suas carteirinhas de sócio do National Trust.

 Depois, quando o calor aumenta um pouco e começa a temporada, os turistas são expelidos de seus carros e enchem a rua principal: americanos, japoneses e um bando de estudantes estrangeiros vão surgindo ao redor do castelo. No inverno, quase todas as lojas fecham. 

Os comerciantes mais abonados aproveitam os longos meses sem movimento para passar as férias em casas fora da cidade, enquanto os mais resistentes promovem eventos natalinos e faturavam com corais ou feiras de artesanato.  

Quando a temperatura sobe, os estacionamentos do castelo lotam, os pubs recebem mais pedidos de sanduíches de queijo com picles e, alguns domingos ensolarados depois, passamos outra vez de modorrenta cidadezinha a tradicional destino turístico inglês. Subi a colina desviando dos primeiros visitantes da temporada, com suas pochetes de neoprene presas à cintura, os guias turísticos bastante manuseados e as câmeras já prontas para fotografar o castelo na primavera. 

Sorri para alguns e parei para tirar fotos com as câmeras daqueles que me pediam. Alguns moradores locais reclamavam da alta temporada por causa dos engarrafamentos, dos banheiros lotados, dos pedidos estranhos no The Buttered Bun ("Vocês não têm sushi? Nem rolinhos primavera?"), mas eu não me incomodava. 

Gostava do jeito dos estrangeiros, dos relances de vidas tão diferentes da minha. 

Gostava de ouvir diferentes sotaques e tentar adivinhar de que região eram, observar as roupas de quem nunca viu um catálogo da loja de departamento Next, nem comprou um pacote de cinco calcinhas na Marks and Spencer's.

— Você parece animado — disse Dean, quando larguei minha mochila no corredor. 

Seu tom dava a entender que minha animação era quase uma afronta.

— É porque é hoje.

— O que tem hoje?

— A nossa saída. Vamos levar Sam para ver a corrida de cavalos. 

Dean e Sam se entreolharam. Eu quase ri. Senti um enorme alívio ao ver como estava o tempo, e ao constatar a presença do sol soube que tudo ia dar certo.

— Corrida de cavalos?

— É. Está tendo uma corrida acirrada em... — tirei o bloco de anotações do bolso — Longfield. Se sairmos agora, chegamos a tempo de ver o terceiro páreo. E quero apostar cinco libras no cavalo Man Oh Man, portanto é melhor irmos logo.

— Corrida de cavalos.

— É. Sam nunca foi a uma. 

Em honra da ocasião, coloquei meu jeans justo e um camisa social branca com um lenço com estampa de arreios de cavalo amarrado ao pescoço e um par de botas de montaria de couro.

Dean me estudou cuidadosamente, depois deu marcha a ré em sua cadeira e virou-a de lado, de modo a poder ver melhor seu enfermeiro.

— Este é um desejo seu de longa data, Sammy?

Dei a Sam um olhar de advertência.

— Sim — disse ele, e abriu um sorriso. — Quero ir, sim. Vamos ver os cavalinhos. 

Nós tínhamos combinado, claro. Liguei para Sam na sexta-feira e perguntei que dia ele estaria livre para o passeio. Os Winchester aceitaram pagar horas-extras (a filha deles tinha ido para a Austrália, e acho que eles queriam garantir que alguém "sensível" me acompanharia), mas até o domingo eu não estava bem certo sobre o que faríamos. 

Como eu era antes de você - DestielWhere stories live. Discover now