Mentiras

511 24 0
                                    

Poncho cogitou milhares de vezes a idéia se ir embora, de nunca mais aparecer e esquecer que Anahi um dia existiu.
Sua parte lógica dizia isso alertando que ele iria sofrer, que ele iria sair machucado de novo.
Porém seu lado emocional dizia que ele não poderia abandona-la, queria saber dessa história pela boca dela! E nada o sossegaria.
Ele precisava abraçá-la, sentir que ela está bem. Anahi, frágil como era sofrera muito quando soube que a vítima do acidente havia falecido, e ele tinha certeza disso.
Sabia que ela se arrependia desse ato impensado de abandonar a vítima, mas sabia que ela não fez aquilo por mal. E teve que pagar por esse crime.
No fundo ele sabia que Anahi era uma pessoa boa, e que não machucaria uma mosca por vontade própria.
Ele queria cuidar dela, mostrar que ele estaria lá para ela sempre. Mostrar que confiava nela, apesar de ter escondido isso. Estava pronto para perdoar tudo.
Porém seu inconsciente ainda o chamava de maluco por estar se deixando levar novamente, e que ele acabaria machucado de novo.
Mas Poncho ignorou isso, o que ele mais queria naquele momento era ver Anahi.

-/-

Anahi estava deitada de barriga para cima, usava uma espécie de tipoia que mantinha seu braço imobilizado, tinha um pontinho falso na boca e um acesso no braço, por onde corria um soro com remédio contra dor.
Por sorte os policiais viram que ela eram apenas uma vítima, e não a intimidaram.
Uma coisa Anahi aprendeu nesse tempo na cadeia é que haviam policiais e policiais.
Existiam aqueles policiais que apenas gostam de ostentar o título que possuíam, condenando qualquer um que fosse suspeito, intimidando e até mesmo humilhando.
E também existiam os policias honestos, que estavam preocupados em ouvir a sua histórias e não te julgar na primeira oportunidade. Esses sim sabiam ser justos, mas também eram firmes quando necessário.
Anahi agradecia aos céus por serem policiais dessa segunda categoria que a tinham atendido.
Claro que Anahi não podia contar que era seu cunhado que a ameaçara e quase a matara. Mentiu nesse caso, dizendo que era um trombadinha tentando levar seu celular, mas como a mesma disse que não tinha, ele a encurralou na parede, batendo nela e quase a matando por achar que era uma mentira.
Com mais uma série de perguntas depois os policiais foram embora, e ela ficou sozinha naquele quarto.
Na cabeça dela só se passava a imagem de Poncho decepcionado após descobrir do passado dela. Óbvio que ele não estaria mais lá. Já deveria ter ido para sua casa, correr daquela mulher, ex-presidiaria que poderia fazer mal a ele na primeira oportunidade.
Seus pensamentos foram interrompidos por batidas na porta.
- Entra.. - sussurrou não dando importância, deveria ser apenas uma enfermeira.
Mas ela havia se enganado. Logo sua atenção foi tragada por aquela imensidão verde que eram os olhos dele, sentiu as bochechas corarem e baixou os olhos em seguida.
- Como se sente? - ele enfiou as mãos nos bolsos e se aproximou dela devagar.
- Bem.. - ela sussurrou. - Por que você não foi embora? - ela perguntou erguendo os olhos.
- Estava preocupado... - ele falou dando os ombros. - Por que? Você queria que eu fosse embora?
- NÃO! - ela rapidamente respondeu. - Quer dizer, claro que não queria, mas achei que não iria mais querer olhar na minha cara depois que soubesse...
- Por que não me contou? - ele foi direto olhando para ela.
- Vergonha... - ela sussurrou. - Não é motivo de orgulho nenhum falar sobre isso... Você é incrível e eu sou apenas uma ex-presidiária.. Eu tenho muita vergonha disso...
- Os policiais me contaram o que aconteceu... - ele disse. - Então é esse o motivo que não fala com Anabelle?
- É.. - ela respondeu simplesmente.
- Mas como ela sabia? Anahi, você estava sozinha no dia do atropelamento.. Como ela poderia ter te entregado... - ele sussurrou tentando ver qual seria a resposta dela.
- Tem muita coisa nesse processo que ninguém sabe Poncho... - ela baixou os olhos. - E infelizmente eu também não posso contar...
- Mas por que Annie?
- Porque não é a hora... - ela suspirou. - Um dia vai chegar o momento e a história verdadeira virá a tona..
- Você não confia em mim? - ele perguntou parecendo ofendido.
- Confio Poncho... Como há muito tempo não confiava em ninguém... Você me inspira isso, me deixa de um jeito que achei que nunca mais iria ficar.. Mas eu ainda não posso contar.. Não quero cúmplices nisso, como você viu, sou ex-presidiária e qualquer coisa que acontece comigo é motivo para um escarcéu. Se souberem que você está envolvido, podem te acusar como cúmplice...
- Você... Você... Está pensando em cometer um crime? - ele sussurrou.
- Não!! - ela deu risada. - Só me vingar de Anabelle, mas de um jeito justo... Nada de matar ou torturar ninguém...
- Ah! - ele respondeu soltando o ar.
- Agora me diz.. Por que ainda está aqui? - ela perguntou sendo direta.
- Já disse, estava preocupado...
- Não Poncho... - ela balançou a cabeça devagar, o ombro ainda doía. - Agora que você descobriu quem eu sou você deveria ir embora e nunca mais olhar na minha cara!
Ele balançou a cabeça e sentou na ponta da cama, segurando a mão dela.
- Juro que isso realmente passou pela minha cabeça Annie... Você mentiu para mim, você escondeu uma coisa muito séria... Mas, eu simplesmente não consegui ir embora!
Anahi baixou os olhos, encarando as próprias mãos. Logo viu suas próprias mãos serem cobertas por outras, grandes e fortes. Levantou os olhos e ele a observava, agora muito mais próximo.
- Me perdoa... - ela sussurrou engolindo em seco. - Eu tenho tanta vergonha disso... - soltou as mãos das dele e cobriu o rosto, escondendo as lágrimas.
Ele passou o braço por seus ombros e ela deitou a cabeça em seu peito, lá parecia ser o lugar certo para ela estar. Desde o dia que se conheceram sentiu isso.
- Shi... - ele sussurrou acariciando seu cabelo. - Já passou!
Ela levantou a cabeça de seu peito e o encarou.
- Eu sou inocente... Fui presa injustamente.. Eu não faria mal a ninguém, e de repente tudo isso acabou com a minha vida... Eu não tenho mais emprego, minha vida é uma droga, não falo com a única pessoa que conheço da minha família, sou uma fracassada... - as palavras saiam rapidamente da boca e antes que ela se desse conta, foi calada pelos lábios de Poncho sobre os seus.
Ele a segurou pela nuca e manteve os lábios colados por breve segundos, tempo suficiente para que ela fechasse os olhos e entreabrisse os lábios.
Mas assim que ela o fez, ele se afastou. Ela baixou a cabeça, envergonhada. Claro que ele não iria querer mais nada com ela depois de descobrir seu passado.
- Mesmo querendo muito isso.. Não quero te machucar.. Sua boca ainda está muito ferida.. - ele tocou com as pontas dos dedos o canto da boca dela, fazendo ela fechar os olhos.
- Não se preocupe com isso... Faça o que quer fazer... - ela sussurrou ainda de olhos fechados.
Poncho fechou os olhos uns instantes antes de se dar conta do que estava prestes a fazer. Tocou novamente os lábios dela com os seus, lentamente e carinhosamente.
Quando ela entreabriu os lábios novamente, ele não se afastou, apenas deixou que o beijo acontecesse naturalmente. Ele tomava muito cuidado e segurava seu rosto entre as mãos, como se ela fosse de cristal.
As línguas dançavam juntas, porém ele não permitia que a pressão do beijo fosse muito forte, para não machuca-la. Separaram-se segundos depois, ambos ainda com os olhos fechados. Ele abriu os olhos primeiro e tocou o rosto dela, que deitou a cabeça em sua palma.
- Me deixe cuidar de você... Me deixe te ajudar a reescrever a sua história.. Me deixe apagar tudo que você sofreu..
Ela abriu os olhos e ambos se encararam durante alguns segundos.
- Você não sente vergonha de mim? - ela disse tão baixo que se o hospital não estivesse tão silencioso, ele não teria ouvido.
- Não! - ele respondeu seguro de si.
- Nem um pouco? - os olhos dela estavam marejados.
- Nada! - ele acariciou o rosto dela, limpando uma lágrima que escorreu.
Ela fungou e jogou seu braço bom em volta do pescoço dele, o apertando contra si.
- Você deixa eu cuidar de você? - ele repetiu a pergunta enquanto afagava seus cabelos.
- Si-si-sim... - ela gaguejou e ele se afastou do abraço, sorrindo. Juntou seus lábios com os dela novamente.
- Eu prometo que nunca mais ninguém vai te machucar! - ele a abraçou de novo, fazendo com que ela deitasse a cabeça em seu peito.
- Eu confio em você! - disse apertando a cintura dele e depositando um beijo em seu peito, onde estava deitada.
Anahi adormeceu minutos depois, ainda amparada nos braços de Poncho.

Bad TwinsWhere stories live. Discover now