Ameaça

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Ela tentava, mas simplesmente não conseguia resistir ao cappuccino. Céus, como havia sentido falta disso na cadeia. Havia colocado uma blusa cacharel pois a noite da Cidade do México era muito fria.
Bebericava sua bebida devagar enquanto repassava os acontecimentos do dia.
Sorria atravessado lembrando da conversa com Anabelle, ela havia ficado assustada e isso era ótimo. Afinal, nada como começar a vingança com um pouquinho de suspense.
Lembrou da graciosidade da sobrinha e como a amava, mesmo depois de anos sem vê-la, o amor de tia continuava em seu coração. Mais forte do que nunca.
E por fim, tocou seus lábios, lembrando do doce sabor de Poncho. Fechou os olhos entorpecida, havia se encantado com ele também. Mas infelizmente, não podia deixar ele se aproximar, baixou a cabeça triste e subiu os olhos, arregalando-os em seguida.
"Eu só posso estar sonhando... " - pensou esfregando os olhos, mas não. Era realmente ele, sentado no balcão enquanto bebia um café preto e comia um sanduíche.
Pensou em tantas possibilidades, chamá-lo para se sentar com ela,sair fugida antes que ele a visse, surpreende-lo com um beijo, e quando estava prestes a tomar sua decisão, os olhos dele se encontraram com o dela e um sorriso sincero surgiu em sua face. Assim como na dela.
- O que uma Srta linda como você faz sozinha em uma noite fria de quarta-feira? - ele perguntou enquanto se mudava para a mesa dela. Anahi apenas sorriu, colocando uma mecha atras da orelha.
- Tomando um café, cansada de esperar o príncipe encantado... - ela sussurrou e Poncho ficou sério de repente.
- Tomou um bolo? - ele estreitou os olhos para ela, quase não acreditando no que ouvira.
- Oh! Não!!! - uma gargalhada surgiu dela. - Tentei fazer uma piada e saiu pela culatra.. - Ele suspirou aliviado. - Apenas estava com vontade de tomar um cappucino!
- Ah.. - ele sorriu. - Você gosta bastante disso né?
- Cappucino? - ela perguntou e ele assentiu. - Nossa! Muito!! Senti muita falta disso nesses anos fora... - ela suspirou.
- Como assim? Não tinha cappucino em Monterrey? - ele perguntou achando graça.
Anahi ficou seria de repente, dando conta da besteira que havia falado.
- Er.. Não... Não como o daqui! - ela disse rápido.
- Ahhh sim.. Entendi... - ele disse, um pouco desconfiado.
Ela suspirou, precisava tomar cuidado com aquilo que falava, poderia colocar tudo por água abaixo.
- Poncho.. Eu preciso ir! - ela disse de repente.
- Eu te acompanho.. - ele respondeu.
- Não! - disse rápido e assustada. - Poncho, eu não sou quem você pensa... Eu não sou uma pessoa boa, e... Eu não quero que se aproxime de mim...
- Mas... - antes que ele falasse qualquer coisa, Anahi saiu em disparada para fora da padaria. Lutando contra as lágrimas que queriam escorrer de seus olhos.
Andou um pouco e logo se sentiu ser puxada pelo braço, estava pronta para mandar Poncho parar de segui-la quando percebeu que não era Poncho que lhe segurava. Ele usava um moletom cinza com um capuz na cabeça, mas era impossível não reconhece-lo. E ela tremeu.
- O que pensa estar fazendo Anahi? - ele perguntou frio, encostando-a em uma parede e apertando seus braços com força.
- Eu.. Me solta! Está me machucando! - pediu fraco.
- Se você ousar se aproximar delas de novo... Eu te mato Anahi! Eu juro que eu te mato!
- Eu não tenho medo de você, seu covarde! - disse e cuspiu na cara dele, que soltou um de seus braços limpando o rosto.
- Pois deveria ter Anahi.. Eu posso te fazer muito mal!
- Eu não sou mais aquela menina idiota! Eu mudei, a cadeia me mudou imbecil... E agora vocês vão pagar por tudo o que eu sofri lá!
- Quem vai pagar é você, sua prostitutazinha de quinta! Achou o que, que ameaçaria Anabelle e Johanna e ficaria por isso mesmo? Você me conhece e sabe como sou Anahi, eu não vou permitir que você encoste um dedo nelas...
- Claro... É você quem vai fazer isso, não é? Só você tem o direito de bater na Anabelle, não é?? - ela parou vendo a expressão que o rosto dele assumira. - Oh, achou que eu havia me esquecido das surras que você já deu na minha irmã? Você não passa de um covarde Thomas! UM COVARDE!
Um bofetão atingiu-lhe o rosto e Anahi sentiu o gosto de sangue na boca. Arfou sentindo o rosto arder com mais um tapa que levou. Ele então segurou seu pescoço com uma só mão, enforcando-a. O rosto de Anahi foi perdendo a cor, seus olhos estavam vermelhos e ela lutava para respirar. Bateu as costas dela com força contra a parede e ela sentiu uma dor alucinante no ombro.
- Eu vou te matar Anahi! - ele sussurrou e ela viu ele tirar uma faca do bolso.
- EI... O QUE É ISSO? - ouviram uma voz atras deles e Thomas prontamente largou Anahi, que caiu no chão, tossindo e tentando puxar o ar.
Anahi viu Poncho tentar correr atras dele, mas quando ele bateu o olho nela, assustou-se.
- ANAHI!! - gritou e correu até ela. Viu seu estado no chão prontamente se aproximou dela, tocando seu rosto com carinho.
- O que ele fez com você Annie? - perguntou preocupado.
Anahi não se agüentou mais, estava com medo , sabia que se Poncho não tivesse chegado, provavelmente ela estaria morta naquele instante. Começou a chorar tapando o rosto com as mãos e sentiu braços fortes a abraçarem.
Permitiu-se ser abraçada e deitou a cabeça em seu peito, em seguida tirou as mãos do rosto e o abraçou também, usando apenas um braço. Forte e pedindo internamente que ele não a soltasse nunca mais.
- Vem, vamos sair daqui.. Vou cuidar de você!
Poncho a segurava firme pela cintura, enquanto Anahi não parava de chorar, ainda agarrada a ele. Seu ombro doía muito onde havia se chocado com a parede e ela não conseguia nem mexe-lo. Caminharam mais um pouco até o prédio dela e subiram juntos.
Anahi tentou abrir a porta da casa com as mãos tremulas, mas não conseguia colocar a chave no local certo, tamanho seu nervosismo. Poncho tirou a chave da mão dela delicadamente e abriu a porta.
Caminhou com ela até o banheiro e ajudou a lavar seu rosto.
- Está bem feio esse machucado... - ele sussurrou tocando a parte de sua boca que havia um corte. - Vem aqui..
Ele a puxou pela mão e fez com que ela se deitasse no sofá, apoiando a cabeça em uma almofada.
Foi até a cozinha, abriu o freezer e pegou algumas pedras de gelo, colocou em um saco plástico e também pegou um pano fino, que ajudaria na hora de colocar o gelo para não queimar sua delicada pele. Procurou um pouco pela casa e achou uma caixa de remédios, pegou duas pomadas, uma para passar em seu rosto que estava vermelho da bofetada, e outra, cicatrizante, para passar no machucado de sua boca.
Pegou também gaze, esparadrapo e uma tesoura, para fazer um curativo.
Voltou para a sala segurando tudo isso e sentou no chão, ao lado dela. Percebeu que ela havia caído no sono.
Aproximou o gelo devagar e quando tocou seu lábio, Anahi deu um pulo, empurrando a mão dele com violência.
- Calma... - ele sorriu fazendo um carinho no cabelo dela. - Sou eu..
Anahi se acalmou e voltou a deitar, enquanto ele segurava o gelo em sua boca.
- Deveríamos procurar a polícia... - ele disse bravo.
- NÃO! - ela prontamente respondeu. Sabia que como ex presidiaria teriam um arquivo dela, e se envolver em brigas de rua não era nada bom para ela que havia acabado de ser libertada.
- Como não Anahi? - ele perguntou e ela fez um careta de dor, ele logo tirou o gelo um pouco.
- Não vai adiantar nada... Eu nem lembro a cara do infeliz... Ele só queria me assaltar e eu reagi mal!
- Anahi, por Deus! Sabe que não se pode reagir a um assalto! - ele voltou a colocar o gelo em sua boca. - A vida hoje em dia não vale nada! Eles matam por nada!
- Eu sei.. - disse sentindo lágrimas chegando aos seus olhos. - Não foi o certo mesmo...
- Ele te machucou em mais algum lugar? - ele perguntou preocupado.
Anahi tocou o ombro, era lá que ela sentia mais dor. Poncho puxou a gola da blusa para baixo, e ela grunhiu de dor. Ele logo estranhou e puxou mais, só que dava para ver sem machuca-la. Pegou a tesoura e cortou a blusa dela, até a parte do ombro.
- MEU DEUS! - ele se levantou rápido.
Continuou tocando e percebeu que seu ombro havia saído do lugar.
- Vou ligar para uma ambulância. Você deslocou a clavícula, isso é muito perigoso!
- Não!!! Não! Médico não! Ambulância não!
Anahi tentou se levantar desesperada. Ela não podia ser levada a um hospital. Poncho descobriria tudo!
- Calma, Annie! Por favor! Se acalma!
Ele ligou para a ambulância ao mesmo tempo que tentava mantê-la deitada.
- Poncho, eu estou bem! Sério! Por favor, não ligue... - lágrimas começaram a escorrer dos olhos dela. Ela sentia dor, mas o desespero era maior.
- Hey! Calma! - ele acariciou seus cabelos. - Eu sei que está assustada, mas o que eu quero é cuidar de você.. É te ver bem! Por favor!
Anahi se debatia no sofá, mas Poncho era forte e impedia que ela se levantasse.
- ANAHI! - ele disse alto e sério. Ela se assustou de imediato e se encolheu no sofá.
Ele percebeu o efeito que isso teve sobre ela e também se assustou.
- Hey, calma! Sou eu.. Não vou te machucar Annie! - ele disse carinhoso tocando seu cabelo. - Só quero te ajudar, só quero cuidar de você...
Anahi pareceu se acalmar, e jogou o braço bom em volta de seu pescoço, abraçando-o.
- Onde esta sua bolsa com seus documentos? - ele perguntou e ela indicou o quarto.
Voltou com a bolsa dela nas mãos e pegou seus documentos na carteira. Parou olhando atentamente uma foto que ela estava na carteira dela.
- Sim... - Anahi respondeu antes que ele perguntasse. - É a Johanna, minha sobrinha...
- Puxa, que bebê mais linda! - ele disse. - Puxou a tia!
Ele sorriu e Anahi o acompanhou, com as bochechas vermelhas.
Minutos depois a ambulância chegou e os enfermeiros a prenderam na maca, usando o colar cervical em seu pescoço, e imobilizando o braço dela com uma tala improvisada.
- Vai ficar tudo bem Annie, eu prometo! - ele sussurrou pegando a mão dela.
O enfermeiro chefe se aproximou deles com uma prancheta nas mãos.
- Nome da paciente?
- Anahi Portilla. - Poncho se apressou a responder.
- Idade?
- 24.
- Problemas cardíacos, diabetes, pressão alta ou baixa?
Ele olhou para ela, essa pergunta ele não sabia responder.
- Não! - ela respondeu.
- E você jovem? Vai nos acompanhar no resgate?
- Sim! - ele prontamente respondeu.
- Não! - Anahi disse em seguida assustando-o. - Quer dizer, não precisa Poncho! Eu estou bem e amanhã você trabalha!
- Não me importo! Não vou te deixar sozinha Annie... - disse baixo e deu um beijo em sua testa.
- Preciso dos seus documentos também então.
Segundos depois já estavam seguindo para dentro da ambulância.
Anahi pedia internamente para que não falassem nada sobre seu passado na hora de preencher a ficha, mas até ela achava que isso era praticamente impossível.
Uma lágrima fina escorreu de seus olhos com o balanço da ambulância.
- Annie.. Está doendo alguma coisa? - ele perguntou preocupado.
- Meu coração... - sussurrou baixo. - Desculpa estragar tudo... Eu vou entender se você me odiar depois de hoje, vou entender se você não quiser mais olhar na minha cara.. Eu juro que vou entender...
- Não fale besteira linda... - ele disse sorrindo. - Não tem porque eu te odiar... Não fale mais isso...
- Você vai descobrir em breve... - ela sussurrou virando a cabeça para o lado.
No mesmo momento a ambulância parou e logo os enfermeiros tiraram ela de dentro.
Poncho seguiu ao seu lado enquanto os enfermeiros checavam para onde ela seria levada.
Logo ela achou um jeito e segurou a mão dele, fazendo com que ele a olhasse.
- Só me perdoa por não ter tido coragem suficiente para te falar a verdade...
- Mas que verdade? - ele perguntou mas não foi respondido. Anahi foi levada para dentro daquelas portas vai-e-vem.

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Até tentou correr atras dela, mas foi impedido por uma enfermeira que disse que aquele era um local apenas de médicos e pacientes. E pediu que ele a acompanhasse para fazerem a ficha dela.
Entregou todos os documentos para a mulher da recepção, mas uma coisa ainda martelava na sua cabeça. O que ela estava escondendo?
- Anahi Portilla sim? - a recepcionista falou.
- Isso mesmo.. - ele respondeu ainda um pouco confuso.
- Teremos que chamar a polícia para acompanhar esse caso...
- E por que? - ele perguntou. Ficou mais confuso ainda, não havia mencionado o assalto e nem nada. Será que a moça achava que ele que havia feito isso com Anahi?
- É o procedimento para caso como o dela, senhor! - a moça respondeu.
- Caso como o dela? Como assim? Em quem sentido?
- Sim.. Temos uma ficha nesse computador ligada com o banco de dados da polícia, e toda vez que damos entrada à um ex-presidiário, temos que contatar a polícia, é o procedimento do hospital!
Poncho piscou algumas vezes demoradamente. Aquela frase não fazia sentido nenhum, não havia nenhum ex-presidiário ali.
- Ainda não consegui entender, me desculpe... - ele sussurrou bobamente.
- Senhor, como a Srta Anahi é ex-presidiária, temos que contatar a polícia do ocorrido, mesmo que ela seja a vítima, entende?
- Ex- presidiária? - ele sussurrou e desabou na cadeira mais próxima, colocando as mãos na cabeça e esfregando as têmporas, confuso.

-/-

Minutos depois a polícia chegou ao local e encheu Poncho de perguntas, das mais variadas.
O que eles eram. Há quanto tempo se conheciam. Se ele tinha passagem pela polícia. Se ele estava com ela no momento que foi atacada. Como ela foi atacada. O que ela falou. Como o bandido era. O que houve em seguida. Porque não chamaram a ambulância no local do crime. Estavam tentando encobrir algo.
Poncho estava tonto depois de tantas perguntas, por sorte, os policiais acreditaram em todas as suas palavras, e colocaram Anahi como vítima e não como possível cúmplice ou mentora.
Entraram na sala que ela se encontrava e voltaram quase uma hora depois.
- Pegamos todas as informações do ocorrido. Ela realmente foi uma vítima, e pela que vi no prontuário da cadeia, ela tinha um excelente comportamento lá. Realmente não acho que ela tenha algum envolvimento com isso, estava apenas no local errado e na hora errada. - Poncho ouviu o policial falando à recepcionista. - Conversamos também com o médico dela, que já explicou todo o ocorrido, parece que houve apenas um deslocamento da clavícula, mas foi dado o que chamam de "tranco" e colocaram no local. Ela está bem e consciente. O médico apenas disse que ela ficará internada para tratarem de seus ferimentos e também para observarem sua clavícula. Mas em breve terá alta.
Poncho se aproximou da bancada.
- Por favor, será que vocês podem me contar o que houve?
- Como assim, o que houve? - o policial perguntou. - Não foi você quem a socorreu?
- Não! Não hoje! Quis dizer se podem me contar o que houve para que ela fosse presa anos atras...
O policial contou tudo a ele, mesmo dizendo que não poderia, mas contaria de qualquer jeito porque essa história corria já o bairro todo.
A historia era que Anahi dirigia em uma estrada a noite, atropelou uma pessoa, saiu do carro para avaliar o que havia acontecido, e foi embora sem prestar socorro. O que levou sua prisão é que infelizmente, a vítima veio à óbito no hospital.
Poncho passou a mão pelos cabelos. Não podia acreditar nisso, era estranho demais.
- E quem fez a denúncia foi a própria irmã... - o policial balançou a cabeça.
- Mas como a irmã sabia?
- Ela contou para a polícia que Anahi foi a sua casa depois do ocorrido, com as roupas e mãos sujas de sangue e confessou o crime... Anabelle a aconselhou a se entregar para a polícia, mas Anahi fugiu... Dias depois Anabelle foi à delegacia dizendo não agüentar mais segurar esse segredo!
Era muita coisa para processar, em pouco tempo. A cabeça de Poncho doía e ele não conseguia organizar seus pensamentos.
- Bom.. Temos que ir.. Até mais jovem! E cuidado por aí! - o policial falou e os dois logo saíram pelas portas do hospital.
Poncho ainda ficou parado, encostado na bancada, tentando convencer seus pés a se moverem e irem embora daquele lugar.
- Aqui está a guia da paciente Anahi Portilla.. - um médico chegou e entregou uns papéis para a moça da recepção.
Ele finalmente conseguiu se mover e tocou o braço do médico.
- Como ela está? - perguntou.
- Está bem, pode ficar tranquilo... - ele respondeu.
- Será que eu posso vê-la? - perguntou envergonhado.
- Claro! - a moça da recepção sorriu.

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