01 | bem-vindo ao inferno

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Quando o som estridente semelhante a uma sirene se iniciou algumas horas mais tarde, os Clareanos já sabiam perfeitamente bem do que se tratava ─ com exceção de Chuck, o mais novo entre eles.

Bastou uma questão de poucos minutos para que a maioria dos garotos se encontrassem amontoados ao redor do buraco por onde a caixa chegava, empurrando uns aos outros em uma tentativa de abrir espaço para enxergar melhor a chegada do novo colega.

Lizzie ficou um pouco distante, sem dar muita importância ao novo rosto com quem passaria a conviver. Estava farta de sempre ver garotos subindo pela caixa, todos exatamente iguais: confusos, desconfiados, com medo e desmemoriados. Não, não havia novidade alguma naquilo, absolutamente nada que a interessasse.

Uma vez por mês, sempre no mesmo dia e mesma hora, sem atraso, um novo garoto era enviado pela caixa. Todas as vezes, ao ouvir o soar do alarme, indicando que o novo Clareano estava prestes a chegar, quase todos os garotos se juntavam para receber o novato, ansiosos para ter o vislumbre de um novo rosto ─ alguns ainda esperançosos de que mais uma garota seria enviada. Aquele era o único momento em que todos estavam reunidos no mesmo lugar, absortos demais em seus próprios pensamentos para prestar de fato atenção no que estava acontecendo ao redor. Era a oportunidade perfeita.

Com cuidado, Lizzie esgueirou-se em meio aos garotos, se esforçando para passar o mais despercebida possível. A garota esticou-se, ficando na ponta dos pés para ver por cima de alguns ombros, buscando pelos cabelos cacheados de Chuck. Encontrá-lo não foi um problema, visto que a diferença de idade entre o menino e o restante do grupo o destacava, de certa forma.

Ela deu alguns passos na direção do amigo, esticando um dos braços para segurar o pulso dele e puxá-lo para perto de si.

─ Liz! ─ ele a cumprimentou, empolgado.

─ Shhh ─ a garota tampou a boca de Chuck com as mãos, falando em um sussurro para não correr o risco de os outros a escutarem ─ Preciso de um favor.

─ Agora? Quero ver o novato chegar.

─ Relaxa, você não vai perder nada ─ ela garantiu. Chuck havia sido o último a chegar pela caixa e estava animado para ver quem seria seu novo colega. Lizzie não teria coragem de fazê-lo perder isso, mesmo que não significasse muito para ela ─ Só quero que fique de olho nos garotos e não deixem que percebam que saí. Pode fazer isso?

─ Claro. Mas por quê? Aonde você vai?

─ À sala dos mapas.

─ Mas só os corredores podem ir lá! ─ ele lembrou, surpreso com a revelação ─ Se o Alby descobrir, ele vai ficar uma fera.

─ E é por isso que você não vai deixar que ninguém descubra.

Chuck hesitou por um momento, desviando o olhar de Lizzie para o grupo de Clareanos ao redor da caixa, absortos demais em seus próprios pensamentos e comentários para notar os sussurros suspeitos dos dois há poucos metros de distância. As chances de alguém notar o sumiço da garota eram baixas, mas não nulas.

Com um suspiro de quem havia se convencido, Chuck voltou-se para Lizzie novamente. Ela sabia que ele a ajudaria, mesmo receoso.

─ Tudo bem. Mas vai rápido.

─ Eu vou, prometo ─ ela passou uma das mãos na cabeça do menino, bagunçando os cachos recém arrumados de seu cabelo.

Em troca, Chuck lhe lançou um olhar de descontentamento, mas não teve tempo para reclamar. Lizzie já havia lhe dado as costas, indo em direção a pequena construção localizada entre as árvores do bosque.

A primeira vista, a sala dos mapas não parecia ser muito interessante. Afinal, era apenas uma pequena construção feita por alguns dos Clareanos, um lugar simples cuja a única função era guardar as dezenas de mapas que os corredores desenhavam do labirinto que os cercava. Lizzie sempre teve curiosidade em analisar alguns dos papéis, mas nunca o bastante para que valesse a pena entrar escondida no local. Mas agora, horas depois de acordar de um sonho particularmente estranho, ela teve a sensação que talvez estivesse na hora de fazer algo realmente útil para encontrar uma saída.

Assim, ela vasculhou a sala, surpresa pela organização com a qual os garotos a mantiveram. Os mapas haviam sido separados a partir das datas nas quais foram feitos e dos setores aos quais pertenciam ─ numerados de um a oito.

Ela começou com o primeiro setor. Não foi muito esclarecedor. Tudo o que viu, ao observar atentamente as linhas desenhadas no papel, foram rabiscos sem sentido, provavelmente por nunca ter estado dentro do labirinto.

Tentou com outro setor. Ainda parecia confuso. Assim como o próximo, e o que veio depois.

Lizzie suspirou. Ela se lembrava claramente de ouvir uma voz, em seu sonho, lhe dizendo para não se esquecer, a avisando sobre a importância que aqueles mapas tinham. Era um garoto. Seu rosto não passava de um borrão, como se tivesse vindo de uma memória antiga que se perdeu em sua mente; sua voz não se parecia com a de nenhum dos Clareanos, mas ainda assim ela sabia, de alguma forma, que devia confiar nas palavras do desconhecido. Sabia que não era apenas um sonho, como Clint afirmou poucas horas mais cedo.

─ Lizzie! ─ uma voz conhecida vinda do lado de fora da sala a assustou. Era Gally.

─ Mértila ─ ela murmurou, começando a enrolar os mapas com pressa, correndo para guardá-los de volta em seus respectivos lugares.

A julgar pelo volume de sua voz, Gally ainda devia estar longe o bastante para que Lizzie tivesse tempo de sair dali sem que ele a visse.

─ Eu sei que você está na sala dos mapas! ─ ele gritou ─ Não devia estar aí dentro!

Lizzie não respondeu.

Ela correu para a porta, dando uma última olhada para o lado de dentro da sala antes de sair, indo para a direção oposta a da voz de Gally. Não pôde evitar murmurar um xingamento para Chuck por não ter contido o garoto.

Concentrada demais em não se deixar ser pega, Lizzie não notou os gritos do restante dos Clareanos.

Ao enfim sair do meio das árvores, em um ponto próximo de uma das portas para o labirinto, a garota seguiu em direção a caixa, olhando para trás por apenas alguns poucos segundos, mas que foram o bastante para fazê-la chocar seu corpo contra o de outra pessoa, que aparentemente também corria, a toda velocidade. A força do impacto levou os dois ao chão, ambos resmungando devido a dor da queda.

Alguns metros a frente, os Clareanos gritavam e riam, entretidos pelo pequeno desastre, a maioria deles sem se preocupar em ir ao encontro dos dois para oferecer ajuda.

Lizzie apoiou as mãos no chão para que pudesse voltar a ficar de pé. Sentia as pernas levemente doloridas e haviam alguns fios de cabelo caídos em seu rosto.

─ Que droga... ─ ela afastou os cachos dos olhos e bateu em suas próprias roupas para limpá-las.

Quando enfim olhou para frente, para a pessoa com quem havia trombado, ela encontrou um rosto diferente. O garoto, já de pé, olhava para o ambiente ao seu redor com confusão no olhar. Era o novato.

Mas, por alguma razão, mesmo sabendo que aquele era o primeiro dia do garoto na Clareira, Lizzie teve a sensação de que aquela não era a primeira vez que ela o via.

─ Parabéns ─ Lizzie obrigou a si mesma a dizer para ele ─ Você ganhou uma passagem só de vinda ao Inferno. Bem-vindo.

GAME OF SURVIVAL, minho (maze runner)Where stories live. Discover now