Enquanto ele enrolava a tira de tecido, Freya observara que o homem usava um anel no dedo anelar da mão direita.


- Esse anel parece ser da nobreza.


- Mas não é - rebate ele lavando as mãos ensanguentadas na água turva do rio e levantando-se. Em seguida vira-se de costas caminhando até o seu cavalo.


Freya, meio desajeitada devido as mãos amarradas, também se levanta e o segue.


- Você não precisa fazer isso.


- Fazer o que?


- Levar-me até o Tribunal do Santo Oficio.


- Você é uma bruxa. - Ele dispara virando-se para ela e encarando-a carrancudo. - Vai subir por bem ou por mal no cavalo?


Freya tenta subir no corsero preto, com certa dificuldade por causa das mãos atadas e também devido a sua estatura baixa, então o homem a segura pela cintura ajudando-a a subir. Ele monta logo em seguida e coloca o animal em cavalgada.


- Eu poderia me curar facilmente dessa ferida se não fosse essa maldita corda.


O caçador não responde ignorando-a.


- Será que você sabe a razão de eu não conseguir usar magia devido a essas amarras? - Ela continua tagarelando.


Ele continua mudo e focado na trilha a sua frente.


- Eu não sei como não pensei nisso antes. - Freya olha para trás encarando os olhos azuis do homem, encobertos pela sombra do capuz. - A igreja é tão hipócrita - conclui ela com um sorriso cínico no rosto.


- Do que você está falando? - Ele a fita por alguns segundos e volta a se concentrar no caminho.


- A igreja usa de algum modo magia negra para bloquear outros tipos de magia, só isso poderia explicar o fato de eu não conseguir usar a minha.


- Com certeza tem outra explicação.


- Qual?


Naquele momento, um raio corta o céu clareando as árvores ao redor por alguns segundos e logo em seguida escuta-se o ruído estrondoso de trovão, que chega a assustar o cavalo. Instintivamente, Freya e o caçador olham ao mesmo tempo para o céu.


- Isso não é bom - comenta ela.


As primeiras gotas de chuva começam a cair, mas, aos poucos, sua intensidade vai aumentando, encharcando-os


- Não tem como continuar com essa chuva - comenta ela se encolhendo em seu manto marrom desbotado.


- Eu sei, estou tentando achar abrigo.


Eles cavalgam mais alguns metros até o homem parar o cavalo em frente a uma abertura nas pedras. Ele desce do animal puxando Freya para baixo pelos pulsos e caminhando em direção a caverna. O caçador, após amarrar seu corsero negro a uma árvore, pega outra corda maior de dentro da bolsa de pano, que trazia pendurada nas rédeas, e a amarra no pulso direito da bruxa e no próprio pulso esquerdo prendendo-a a ele para que não tentasse fugir.


Freya se encolhe sentada no chão abraçando os joelhos com seu manto e vestido rasgados, manchados de sangue e ensopados pela chuva. Ela tremia de frio pela umidade da caverna e pelo vento que começara a soprar lá fora. O homem senta-se a frente dela com as pernas dobradas apoiando os cotovelos sobre os joelhos e observando-a.


- Precisamos de uma fogueira. - Ele se levanta. - Vou pegar alguns galhos, mas você precisará vir comigo - diz o caçador erguendo o pulso mostrando a corda que prendia um ao outro.


- Você poderia me desamarrar - provoca Freya dando uma piscadela para ele.


O homem ignora o comentário dela caminhando para a entrada do abrigo e dando um puxão na corda obrigando-a a levantar-se e segui-lo. Ele pegava os galhos mais secos perto da abertura e os entregava para Freya, que ficara em silêncio e com expressão emburrada, segurá-los.


Os dois voltam para o fundo da cavidade e a bruxa joga os galhos no chão voltando a se sentar encostada na rocha, o homem junta os gravetos e acende o fogo. Quando a fogueira já estava crepitando, Freya se aproxima para se aquecer.



No meio da noite, a bruxa acorda e percebe que a chuva havia diminuído e o fogo apagado, virando a cabeça para o lado, em meio a escuridão vê que o caçador estava dormindo. Devagar, ela pega seu punhal, que estava escondido em sua bota de cânhamo, e arrasta-se até o homem encostando a lâmina na garganta dele.


Ela hesita por um instante e então sente uma mão agarrar seu pulso fazendo-a sobressaltar-se.


O homem abre os olhos e a encara com expressão austera em meio a penumbra da caverna. Ele aperta o pulso dela torcendo-o até fazê-la largar o punhal, que cai ao chão. Freya ainda tenta recuperar a arma, mas o caçador é mais rápido e o pega guardando-o dentro de sua capa. Frustrada, ela se afasta sentando-se de frente para ele.


- O que pensou que ia fazer? - pergunta ele sentando-se.


- Matar você - responde ela, sem rodeios, encarando-o com semblante sério.


- E você realmente achou que conseguiria fazer isso? - questiona ele sarcástico.


Ela continua encarando-o sem responder.


- Vamos embora - diz ele levantando-se e sacudindo a poeira de sua capa.


Freya abaixa o olhar, mas não se move.


- Prefere que eu te carregue?


Ela ergue o olhar para encará-lo arqueando uma sobrancelha. O homem ameaça se aproximar dela dando um passo em sua direção, então Freya, desajeitadamente, levanta-se. Ele sai da caverna na frente puxando-a pela corda, que os ligava pelos pulsos, até ao lado do cavalo.


- Consegue subir? - pergunta ele desamarrando a corda de seu pulso.


- Estou com fome - desconversa a bruxa mantendo distância.


- Você vai comer quando chegar ao Tribunal.


- Eles vão me matar de fome antes de me queimar na fogueira.


Freya aproxima-se e tenta subir no animal sozinha, mas devido à sua dificuldade, o caçador, impaciente, segura-a pela cintura e a lança para cima no dorso do corsero montando logo em seguida atrás dela. Ele agarra as rédeas e sai em disparada.


Caça às Bruxas (CONCLUÍDO)Where stories live. Discover now