A Cara do Pai (2,continuação)

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      O ódio de Andy pelo mundo, pelas pessoas, foi crescendo, e tudo isso graças ao pai que o alimentava daquela maneira. E, de certa forma, eu também fui alimentada com tudo aquilo, com aquela atmosfera execrável da casa.

Certo dia, um garoto da rua, que sempre andava pelas redondezas do bairro, as vezes capinando terrenos, outras fazendo favores a pessoas, como ir ao mercado, coisas do tipo, sem pedir permissão, pulou o muro de casa para pegar uma pipa que havia caído lá. “O que você quer aqui?”, perguntei, intrigada ao ir estender uns lençóis. “Só vim pegar essa pipa, senhora”, disse ele. “Pois pode deixar aí que ela agora é do meu filho”, disse eu, com rispidez. “É minha”, redarguiu ele. “Cai fora da minha casa, seu ladrãozinho”, disse eu, com ódio. O menino, sentido com o que eu lhe falei, me olhou com os olhos doloridos, e disse: “Quando foi que eu lhe roubei alguma coisa, senhora?”. Então jogou a pipa no chão e pulou o muro de casa, voltando para a rua. Depois ajuntei a pipa e a quebrei no meio. Fiquei tão irada naquele dia que espalhei para todos os vizinhos que aquele garoto era um verdadeiro larápio, que não era de confiança, e que deviam ter mais cuidado com ele. Aquela minha informação foi rapidamente espalhada pelo nosso pequeno bairro.

E Andy continuava pior no colégio, se tornando uma má influência para muitos garotos. A professora dizia que Andy era o líder dos meninos que não queriam nada com a vida, que andavam vagabundando pelo colégio, escalando muro para fugir das aulas, entrando em salas e riscando todos os materiais dos professores. Andava, também, fumando, igual ao pai, e, quando este soube, nada disse, deu de ombros lendo seu jornal na sala.

— Ele sempre chega na sala de aula, baixa a cabeça e começa a dormir. — continuava me dizendo a professora. —Nem sequer leva seu caderno pra cá, apenas uma folha que rasga do caderno dos outros quando estes não estão presentes na sala. Depois da primeira aula, ele sempre some. Parece um mágico. Só aparece no dia seguinte com uma cara de quem não toma banho, entediado e com cara de poucos amigos. Está vendo este menino aqui! — a professora disse chamando um garotinho branquinho, de óculos e com o rosto todo vermelho, além de alguns hematomas. O menino se aproximou, meio que cambaleando. — Ele foi vítima da violência do seu filho.

— Meu Deus! — exclamei aflita. — O que ele fez com você?

Então a professora deixou o menino fazer seu depoimento.

— Andy me pegou na saída do colégio só por não ter emprestado uma caneta pra ele. Eu estava perto da pracinha de futebol quando ele me deu uma gravata. Depois me jogou no chão e começou a me chutar. Caí perto de uma enorme casa de formigas em forma de vulcão. As formigas estavam transportando seus alimentos, e meu avô dizia para que nunca a provocássemos naquele momento, pois elas soltariam todo o seu ferrão em cima de você, disso você podia ter certeza. Fiquei estirado naquele chão, com o rosto bem próximo daquele formigueiro que me dava agonia só de ver. "Você já tomou leite com formigas?", ele disse. "Elas nunca me fizeram mal pra barriga", disse Andy aproximando cada vez mais o meu rosto daquela casinha. Algumas formigas se puseram em estado de alerta sobre aquela invasão. Então Andy afundou a minha cara com seus pés naquele formigueiro todo e a casa das formigas veio toda abaixo. As formigas ficaram iradas e subiam pelo o meu rosto me mastigando todo com aqueles ferrões, aquelas bundas enormes que elas têm. A casa das formigas já tinha sido toda demolida e ainda me deu tempo de pensar: que pena daquelas formigas todas que trabalharam arduamente dia e noite para construir sua moradia. Acho que Andy percebeu que estava passando dos limites comigo, então tirou seus pés da minha cabeça e eu pude respirar melhor. Mas as formigas continuavam a me picar. "Lava o rosto na lama", disse Andy. Então fiz aquilo, e as formigas saíram do meu rosto, mas ainda tinha algumas pelo meu corpo. Daí tirei a camisa e fui me limpando. Vendo que eu já estava bem, Andy disse um "até logo, otário", e fui pra minha casa. Pro meu azar, ainda apanhei dos meus pais que diziam pra eu nunca brigar na rua.

Fiquei absorta com a crueldade do meu filho. Comecei a ficar preocupada. Preocupada com o que ele ia se tornar da vida vivendo como um monstro igual ao pai. Ele nunca me escutava, apenas o pai. Obedecia o cretino do pai apenas com o o olhar.

                           CONTINUA ...

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