Ausência: 1

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A noite caia serena sobre São Paulo dando lugar a uma movimentação noturna interessante de se observar.

Simone observava em um silêncio mortal a rua da varanda do hotel no qual estava hospedada. Coberta por um robe de seda preto que escondia o vestido de mesma cor e tecido, com um braço abaixo dos seios e a mão livre em seu busto a morena parecia vaguear em pensamentos distantes daquele ambiente. Os olhos brilhavam em lágrimas não derramadas, o orgulho entalava em sua garganta, a mandíbula estava tensionada em uma fúria contida e sua respiração profunda demonstrava sinais de uma paciência que se esgotava. Apesar de suas tentativas de não ponderar sobre a situação na qual vivia, mesmo tendo prometido a si mesma que suportaria aquilo pelo bem das aparências, a mulher sentia que sua resiliência era cada vez menor a medida que seu então cônjuge se tornava mais descarado no que fazia. A primeira traição o homem havia lhe jurado que fora apenas um deslize isolado e que não voltaria a cometer tal ato e apesar de sua confiança já quebrada Simone aos poucos cedeu aos pedidos de perdão do mesmo não querendo prejudicar suas filhas ainda tão novas com uma separação, mas com o passar dos anos essa traição se acumulou a tantas outras até que a conta fosse perdida, Eduardo procurava menos a esposa na cama, a interação entre eles diminuiu até quase não existir e a Tebet sentiu toda a dor de um amor que se perdía entre seus dedos, não havia mais sentimentos e sequer respeito um pelo outro, suas brigas com o tempo foram se tornando menos frequentes e a mulher se sentia anestesiada após tanto sofrimento. Naquela noite sua raiva superava os limites da tolerância sobre o adultério pois pensava que aquele não era o momento para que seu marido fosse tão indecente mundo a fora, a mesma tinha uma imagem a zelar e o homem pouco se importava em ao menos manter isso intacto já que o casamento desgastado já estava e o amor que um dia os uniu e gerou dois frutos era extinto. Nesse momento, ao pensar em suas adoradas filhas, Simone pressionou seus lábios tentando segurar a emoção que lhe tomara e fechou os olhos querendo escapar do mundo a sua volta e se deixar envolver pelas lembranças boas que tinha e nas quais a mulher se refugiava para manter suas forças.

- Ainda acordada mulher? - Indagou Eduardo com um sorriso, ao adentrar o quarto percebeu a varanda aberta e ao se aproximar encontrou a mulher de costas para ele - Não me diga que estava me esperando? - Ironizou.

- Como você tem o descaro de chegar a essas horas, Eduardo? - Questionou se virando para o mesmo e se aproximando.

- Pensei que já tivesse se acostumado - Deu de ombros - Está preocupada comigo, meu amorzinho? - Brincou.

- Estou pouco me importando com o que você faz ou o que venha a acontecer com você - Em um tom frio a mulher continuou - Mas eu tenho uma reputação a zelar e tínhamos combinado de manter essa farsa de casamento da melhor forma possível. O primeiro turno passou, mas ainda estou em campanha em prol do Lula e pretendo me manter afastada de escândalos enquanto isso, só que fica bem complicado quando a droga do meu marido sai altas horas da noite e com certeza não é para rezar - Reclamou.

- Depende sabe... - Riu.

- Seu porco! - Simone empurrou o ombro do homem a sua frente - Estou falando sério, Eduardo, ou você se mantém comportado esse mísero tempo de final de campanha ou vamos fazer o que deveríamos ter feito anos atrás - Ameaçou com os braços cruzados.

- Quer saber Simone? Faz o que quiser, eu vou sair de novo - Avisou virando as costas - Divirta-se sozinha -

- Você está avisado - Alertou a mulher enquanto o via sair do quarto.

- Já passamos por isso tantas vezes que, sinceramente, nem você acredita mais nessas ameaças de divórcio - Eduardo se virou mais uma vez com um olhar indiferente para a esposa.

O reflexo em seus olhosWhere stories live. Discover now