Fonte da vida

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   Depois do meu "encontro" com o ser que há tempos vinha assombrando as histórias do poço, todas as crenças e horrores sobre ele simplesmente haviam sido deixadas de lado por mim, ao invés do medo de encontrar novamente com aquele par de olhos misteriosos eu estava genuinamente curiosa para saber mais sobre sua origem.

Acho que fiquei louca...

  Pensei enquanto vasculhava os caminhos escuros tateando as paredes, sem a luz do colar a única escolha era caminhar às cegas seguindo apenas minha intuição.

De qualquer forma estou presa aqui, o que mais eu poderia fazer?

  Estendi o braço sem machucados em frente ao corpo, toda vez que tocava algo que não fosse o vazio eu mudava de direção e assim continuei por um longo tempo até que as dores no meu pé me obrigaram a parar, foi então que ouvi, há alguns metros de distância, o som de ruídos se aproximando.

—Sei que está aí — disse me sentando nas rochas que estavam no chão — Não tente me assustar, não daria certo.

  Os sons pararam, mas ainda conseguia ouvir uma fraca respiração perto de onde eu estava. Graças ao longo tempo caminhando em um lugar de silêncio absoluto e a falta de visão meus ouvidos se aguçaram ao ponto de perceber o mais sútil dos ruídos.

—Se eu dissesse para qualquer pessoa que estou falando com o ser que habita o poço, aí sim eles achariam que sou uma feiticeira — ri da minha própria ironia — Mas você estava certo quando disse que havia satisfação em condenar e ditar o fim dos outros, bom, pelo menos as pessoas que me jogaram aqui pareciam muito felizes quando fizeram isso — me lembrei dos gritos que enalteciam minha sentença enquanto eu era jogada no buraco — Mas também há muita satisfação quando ajudamos alguém, os sorrisos, as palavras de agradecimento, a alegria — escorei minha cabeça na parede olhando para o que imaginei ser um teto irregular de terra e pedras — No final das contas há vários tipos de fins, só escolhemos o que mais nos convém.

—Nem sempre há escolhas.

  Fiquei surpresa ao ouvir novamente a voz amargurada.

—Ou por acaso foi sua escolha ser jogada aqui?

  Fechei os olhos pensando naquela pergunta.

—De certa forma sim, afinal, foi minha escolha ajudar aquela garota, estar aqui é apenas a consequência — respirei fundo — Há consequência para tudo o que fazemos, sejam elas boas ou ruins.

  Novamente o silêncio.

—Sabe, eu ainda não consigo acreditar que estou aqui sentada falando com você, a criatura que habita o poço — sorri, um sorriso descrente — Minha vida toma rumos inacreditáveis às vezes...

Você...

  Olhei em direção a voz sem conseguir ver nada, depois de longos segundos em silêncio ele continuou.

—Faz tempo que não escuto alguém me chamar por você.

—Imagino que também faz muito tempo que não conversa com ninguém.

  Desde de pequena eu lembrava de ouvir da boca dos mais velhos as temíveis histórias sobre o monstro do poço, passadas pelos seus pais que foram passadas pelos seus avós, vindo de geração em geração, imaginar quantos anos, ou até mesmo séculos aquele ser tinha chegava a ser espantoso.

—O que é você afinal? — as palavras saíram da minha boca sem que eu percebesse — Está a tanto tempo aqui, as histórias dizem que foi aprisionad-

Corpo e alma, a pior das maldições (Projeto em fase de criação)Kde žijí příběhy. Začni objevovat