38 | Destino

128 13 0
                                    

Quando acordo, já pela noite com as luzes das luminárias ao redor acesas e sob os raios lunares, avisto Wukong conversando com Macaque ao longe. Pelo visto, os dois se tornaram próximos de novo. Ainda bem, depois de tantos anos, era o que eu mais queria. É um sonho realizado. Ainda lembro da conversa que tive com Wukong na última reencarnação antes dessa...

"- Acho que vocês tem muito o que conversar - me encostei no balcão da cozinha da nossa casa. Macaque voltou a vida de alguma forma e vi nisso a possibilidade de recomeço entre meu esposo e quem eu chamava de cunhado. Wukong segurava uma fruteira de porcelana vazia e, ao me ouvir falando sobre ele e Macaque, deixou ela atingir o chão e se esfarelar em vários cacos.

- Valente! Macaque não deu a mínima para a nossa amizade! Naquela época, quando apareceu depois de tantos anos, foi para agredir Tripitaka, roubar as escrituras, agredir o Sandy, usurpar o trono de Aloai e, como se isso tudo não bastasse, ainda queria ser promovido a Buda sem ter passado por nenhuma provação e só pela fama! Está me dizendo que acha isso certo?

- Wukong, não distorce o que eu disse! Não coloque palavras na minha boca! Nunca afirmei isso!

- Macaque me traiu! Ainda imagino o que aconteceria se o próprio Buda Sakyamuni, seu exército e a bodhisattva Kuan Yin não tivessem me ajudado a capturar ele...

Monkey King arfa. Falei com o máximo de calma possível:

- Se acalma. O que Macaque fez... não foi certo. Eu sei. Mas você não precisava revidar daquela maneira - a mente me leva ao momento em que vi a cicatriz deixada no Macaque e seu corpo inerte. - Foi grave? Foi! Mas... Céus, Wukong, isso já faz tanto tempo... E vocês dois erraram! Se você mudou... sabe bem disso!

Na mesma noite em que eu disse isso, Wukong foi dormir em outro quarto mas antes olhou para mim e disse:

- Prometo nunca mais fazer mal a ele..."

Balancei a cabeça no intuito de lançar longe tais lembranças, está na hora de deixar esse terror para trás. Eles estão bem agora, não tem porque eu ficar remoendo o passado.

Monkey King voltou para mim e, conversa vai, conversa vem, me explicou que não poderia fazer mais nenhuma viagem no tempo. Essa capacidade foi adquirida graças a um elixir que ele tomou e não pode mais ser criado pois a única flor usada para isso foi extinta, não tinha como replicá-la nem em laboratório. O Fake tinha essa capacidade limitada, também, graças a mesma flor.

Cito como me senti feliz quando enviei uma boa dose de ouro para minha família com uma carta datada antes da minha suposta morte. Deixei bem claro nela que sentia falta da mãe e só percebi o quão importante ela foi para mim depois de tanto tempo longe. Meu avô foi legal comigo mas só porque estava velho demais para ignorar a família como fazia quando era novo. Talvez um dia eu fure a farsa que Macaque criou para me ajudar e abrace mamãe novamente. Wukong e seu povo me presenteou com ouro quando souberam da nossa vitória sobre o Fake. Imagino o que fariam se soubessem que sou a esposa do rei...

Voltamos para o salão onde a festa continua, dessa vez, com música lenta. Pedi esse tipo de atividade com antecedência quando Mei me perguntou o que poderia ter na festa que eu gostaria de vivenciar. Obviamente, um pedido atendido. Sinto Wukong laçar minha cintura com a cauda e me guiar para uma dança calma. Suas mãos passeam pela minha cintura. São macias, são quentes, são amáveis.

Sorrisos não são suficientes para expressar o quão feliz estou ao seu lado. Ao seu lado me encontrei, aprendi lições incríveis, me apaixonei, me entreguei, me permito banhar nesse instante de ternura.

Quantas vezes pensei em desistir mas, ao lembrar do rei, repensei e mudei minha vontade, superei fraquezas, me inspirei no Grande Sábio. Fui resiliente. Fui discípula fiel o máximo que pude, segui seus passos. Estou sendo recompensada como nunca fui antes.

Um passo para o lado, dois passos para o outro, sou embalada pelo seu ritmo tranquilo, assumo minha forma monkey e unimos nossas caudas, unimos nossos lábios, encostamos nossas testas. É época de se permitir ser feliz, estamos leves, estamos livres.

Enquanto dançamos, Wukong fala ao meu ouvido:

- Lembra daquela sopa que lhe dei antes de servir seu pedido na época em que nos conhecemos nessa vida?

Me afasto um pouco para falar encarando suas orbes douradas cheias de vida:

- Lembro... como não poderia lembrar? Até joguei na sua cara... desculpa...

- Pfff! Valente... nem precisava me pedir desculpas! Sou o Monkey King! Certo? Uma sopinha quente na cara não é nada comparado as fornalhas e as montanhas flamejantes que já enfrentei!

- Certo, certo mas... e aí? Porque está me falando dessa sopa logo agora?

- Não consegue se lembrar?

- Wukong, diz logo, eu mal sei o que fiz ontem.

- Há! Não se lembra mesmo.

- Affs! O que tinha naquela sopa? Para mim era uma normal, com legumes e tal.

- Na penúltima reencarnação você me pediu manfruits.

- Hum... espera...

- E ae?

- Ah não. Tinha manfruit nela?!

- Sim! Eu coloquei! Como me pediu.

Dei um tapinha no seu bíceps.

- Au! - ele massageia o local atingido por alguns segundos.

- Demorou muito! - digo sem rodeios.

- Dá para ver que se dedicou de corpo e alma aos treinos. Ai!

- Foi mal mas morri antes de receber ela na outra vida.

- Sinto, pelo menos agora aquela fruta não será extinta tão cedo...

- Monkey King Sun Wukong! O que o senhor fez?

- Amo quando fica assustada assim a ponto de me chamar pelo título e nome completo!

- Não enrola! Por acaso plantou manfruit na Caverna da Cortina de Água?

- Shhh! Fala baixo.

- Céus!

- Nenhum de nós dois será punido se ninguém ficar sabendo!

- Fez a mesma coisa quando plantou pêssegos da imortalidade ao lado do seu casebre... você não existe, sério...

- Casebre? Aquilo é a nossa mansão, o nosso palácio!

- Pior que cheguei a nomear de palácio mas a caverna pois é a mais linda que eu já vi.

- Acredito, já visitou tantas cavernas...

- Consegui me lembrar de algumas delas ultimamente...

- Que bom. Quando posso contar aos outros que a minha querida Chi Chi voltou?

- Melhor esperar um mês ou dois. Vou estar mais preparada até lá.

- Tudo bem.

- Aliás. E se eu não fosse a sua esposa como desconfiava? Não seria uma má ideia deixar sua discípula viver tanto sem nem ao menos perguntar se ela queria?!

- Eu daria um jeito de ir atrás de um antídoto, caso ela não quisesse viver tanto. Ainda bem que não precisa...

- Monkey místico inconsequente!

Levanto a mão e ele se encolhe e, ao invés de lhe dar um tapinha como antes, puxo seu rosto para mais um beijo.

O mal não nos dominou, lutamos e prevalecemos, nenhum presente de bodas pode ser mais magnífico do que esse dia de glória, essa renovação de votos que aquece o meu coração. A meses atrás jamais poderia pensar em vivenciar um evento assim ao lado do Grande Sábio, com certeza, Igual ao Paraíso.

A Discípula de Sun WukongOnde as histórias ganham vida. Descobre agora