7 | Encontro cruel

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Valente

Assim que chego em Megapolis, ainda em cima da nuvem voadora, uma estrutura estranha me chama a atenção. Uma gigantesca jaula está se sobressaindo na área mas remota da cidade. Engulo em seco, meu adversário destinado deve estar preso lá.

Em terra, observo através das grades, um inseto gigante ressonando no meio de seu cárcere. Respiro fundo e agarro minha Power Rod. Algo dentro de mim diz para parar e voltar. Isso deve ser medo. Esse monstro estraçalhou o mestre que possui anos de experiência de luta contra tais seres. Seria coragem ou idiotice enfrentar algo assim?

Não. Se sou a garota que veio acabar com o caos, não faz sentido me esconder ou ter medo. Atravesso as grades, vou até a cabeça do inseto que está mais para um artrópode temível: um escorpião.

Sua cabeça é bem maior do que eu, daria umas vinte de mim tanto em largura quanto em comprimento, talvez até mais.

Ainda dá tempo de voltar...

Sem chance. Vim até aqui, estou diante do meu oponente, devo aproveitar que ele está vulnerável.

Levanto o bastão, miro onde acho mais frágil e o cravo entre seus olhos.

A besta acorda, seus olhos vermelhos cintilam em meio ao breu da noite. Que loucura, não acredito que fiz isso...

Tento tirar meu bastão que agora é tão patético quanto um graveto, tudo que consigo é ser lançada contra as grades e sentir uma dor lancinante se apoderar de minhas costelas, espero não ter quebrado nada. Do chão, vejo o monstro se aproximar, baba escorre por onde passa, seu esporão vem em minha direção. Fecho os olhos.

Nada acontece. Nada comigo acontece. Sinto algo quente respingar em mim. Abro os olhos devagar e... vejo algo que foi minha culpa acontecer: Sun Wukong está perto de mim, seu peito possui um vergalhão, uma espécie de esporão foi deixada nele. Sinto minhas lágrimas escorrerem. Isso ia ser atirado em mim.

- Consegue sair da jaula? - ele questiona, sôfrego.

- Não... - respondo em um fio de voz, com a visão embaçada.

Meu coração acelera. O que foi que eu fiz?

- Macaque, agora! - Wukong ordena e um macaco negro invoca sombras semelhantes a si, tais sombras impedem o monstro de abocanhar o mestre e eu. Wukong me tira de dentro da jaula e, logo em seguida, deita no chão, bem ao lado onde estou estirada.

- Desculpa. Desculpa, desculpa.

Ele não me responde, fico angustiada, será que desmaiou?

- Wukong?!

- Estou bem...

Depois do que pareceu uma eternidade, Wukong consegue se sentar e retirar o vergalhão. Ele urra e só me resta fechar os olhos cheios de lágrimas. Rugidos do monstro me lembram que o outro macaco ainda está lutando, por estar deitada, paralizada pela dor, com olhos cerrados, não consigo ver o que ele faz.

- Ainda quer ser a minha discípula? - a voz de meu mestre serpenteia meus tímpanos.

E agora?

Se eu disser não, com certeza vou parar atrás das grades e algo pior vai acontecer: o mundo vai ser destruído, tudo porque a princesinha do crime não consegue parar ninguém. Seria melhor ou pior desistir de enfrentar algo que nunca poderei vencer? Quem deu as profecias que me apontam como uma guerreira? Eu mal posso ficar de pé, ainda mais depois desse desastre.

- Meus parabéns, Valente. - Wukong coloca a mão em minha testa por meros segundos.

- P-pelo quê? Sou inútil, olha meu estado.

- Se hesitou, não quer abrir mão.

- Ainda não sei se quero continuar.

- Vou te levar ao hospital. Depois, para casa. Lá podemos conversar melhor.

Sou bem cuidada no hospital da ilha, por sorte, não quebrei nem um osso mas foi por pouco. Wukong não deixava a angústia sair de seu rosto. Vê-lo assim está sendo tão ruim quanto ver ele se sacrificando para me manter em segurança horas antes. Ele percebe, talvez pelas minhas expressões faciais, que estou preocupada com seu peito machucado. Faz questão de me explicar que é imortal e devo me importar mais com minha situação no momento.

- A primeira lição que você deveria ter aprendido: bom senso. Não te mandei para lá pois conheço as suas limitações.

- Eu...

- Espera, deixa eu terminar - ele aperta uma gaze.

- Ai.

- Pronto.

- Falta você - estendo a mão e toco seu peito.

- Já estou melhor.

Wukong conversa comigo, enquanto remédios para dor não surtem efeito ainda. Exijo que ele me fale mais sobre o que está acontecendo, de fato não é só um monstro qualquer, me exalto até ele me contar que boa parte do mundo já foi devastada por tal ser que ele nomeia de deus Yama terreno e me mostra quais países não foram destroçados. Choro de alívio: meu lar ainda está inteiro.

Flashbacks junto dessas informações do monstro me trazem a certeza de que aquela jaula mágica não vai durar muito tempo.

Aos poucos, adormeço, mais com ajuda de medicamentos. Uma semana se passa, volto para meu recente lar. Wukong me chama para conversar na sala, desço e já me acomodo no sofá que fica de frente ao que ele está. Wukong sorri e vai me perguntando:

- Tudo bem?

- Mais ou menos.

- Relaxe.

- Sinto muito. Seja lá quem tenha te falado sobre eu vencer aquilo, essa pessoa não sabia o que estava falando. Sério.

- Como você ainda está aqui, creio que vai continuar como minha discípula. Amanhã vamos prosseguir com o seu treinamento.

Ele se levanta do sofá, para ganhar a rua.

O que acabou de acontecer aqui?

Esse macaco esqueceu tudo que passamos? Só me chamou aqui para avisar que vamos continuar com essa loucura?

Levanto do sofá, agarro um pequeno vaso da cômoda do meu lado e o atiro na parede mais próxima ao Wukong. Ele se vira lentamente, olhos arregalados se destacam em sua face um tanto pálida.

- Está zoando com a minha cara? Quase morremos naquela porcaria de jaula, não consigo matar nem mosquito, como acha que posso fazer algo contra aquilo?

Um silêncio paira sobre nós feito chumbo grosso.

- Val...

- Não, deixa eu terminar. - Levanto as mãos como se estivesse sendo rendida, por segundos, e reprimo a vontade de gritar com ele. Queria até rir de tão nervosa e furiosa que estou. - Não sou trouxa o bastante para continuar sendo sua ratinha de laboratório. Aquele... aquela coisa era MK, não era? Seu aprendiz? Quando ia me contar? Quando conseguisse me transformar em uma aberração igual? Me poupe.

Passo por ele e, dessa vez, eu que ganho a rua. Tiro meu bastão do bolso, ótimo ele ser retrátil, e avanço em direção a minha antiga casa, cortando caminho com bordoadas rápidas e certeiras, desferindo golpes contra o matagal que antecede meu antigo lar, não dando a mínima para insetos. Vou juntar o restante das minhas coisas, devolver o que não é meu e voltar para o meu país, aproveitar os últimos segundos da existência desse planeta pois sou inútil e a aura que MK me passou mostra quão longe estamos da paz.

A Discípula de Sun WukongМесто, где живут истории. Откройте их для себя