Onde dói?

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Sem tirar os olhos grandes e cinzentos do rosto dele,ela cuidadosamente colocou o cordão de seda,onde a gema estava pendurada,em volta do pescoço longo e delgado. Depois pegou a faca que tinha embainhado no cinto da fina cintura e,curvando-se tão próxima dele que ele pôde novamente sentir o seu frescor,cortou com facilidade a corda que amarrava os pulsos de Jungkook. Livre,ele levantou-se ficando completamente ereto,e olhou pra ela. S/N,sendo mais baixa que Jeon,batia em seus ombros,olhava para ele impassível,um raro evento para Jeon,que gerava tanto medo quanto admiração no coração da maioria das mulheres que conhecera. Talvez o irmão dela só tivesse e preocupado com que ela levasse uma vida protegida,sem nunca saver sobre a crueldade da qual os homens são capazes,ele pensou. Garoto inocente! Era melhor a garota saber a verdade: que a maioria dos homens  não tinha interesse sinceros. 
Mostre-me onde dói - disse ele,tentando manter a voz calma. Havia algo em relação à proximidade dela,e ela muito próxima,o que lhe causava bastante desconforto. Ele não sabia se queria surrá-la ou beijá-la.
Sem dizer uma palavra,ela voltou a se sentar no afloramento de rocha e levantou a blusa branca de linho até o início da curva do seio direito,revelando uma machucado que já estava ficando roxo. Jeon apoiou-se sobre um joelho para examiná-lo,depois esticou uma das mãos na tentativa de tocar a pele sensível. Quando S/N afastou-se com a expressão claramente desafiadora,antes mesmo de ele tocá-la,ele olhou dentro dos imensos olhos dela e perguntou educadamente:
- Posso?
Ela tinha a expressão debochada.
- O que você sabe - ela perguntou - sobre cuidar de machucados?
Que outra escolha você tem? - ele perguntou com rispidez. - Não vejo nenhuma de suas irmãs por perto,e você?
Prendendo o lábio inferior carnudo entre os dentes brancos e parelhos,S/N negou com a cabeça,fechando os olhos contra a dor antecipada - ou talvez,Jeon considerou,contra a humilhação de ser tocada por ele.
Cuidadosamente,ele posicionou a mão no machucado,sentindo a pele mais lisa que já tinha encontrado,macia como seda,mas quente como uma testa febril. Ela tinha pouquíssima gordura nos músculos bem definidos pelas cavalgadas e pela caça. As costelas projetavam-se levemente sob os seios,e a que apalpava estava certamente machucada pela pancada de Peter,embora muito provavelmente não estivesse quebrada. Jeon tinha uma longa experiência com ferimentos por ter passado uma década no campo de batalha,e era versado na arte da medicina. 
Mas,em todo esse tempo,nunca tivera uma paciente tão graciosa.
Esperando que a voz não demonstrasse nenhum sinal do desejo que sentia ao tocar a pele nua e sedosa de S/N,ele perguntou:
- Dói quando você respira?
Mantendo o rosto completamente virado para o outro lado,o que fazia com que ele visse somente a curva de seu queixo,ela disse:
- Um pouco. É a minha costela?
- É.
- Está quebrada?
- Acho que não - disse ele,esforçando-se para manter a voz baixa. - Machucada,com certeza. Mas um machucado tão leve certamente não é nada para uma mulher com sua energia.
O olhar cinzento virou-se na direção dele,e os cílios estreitaram de forma suspeita,o fazendo arrepiar todos os pelos de seu corpo,apenas com aquele olhar.
- Você está debochando de mim?
- Eu,ousar debochar de uma caçadora maravilhosa como você? De jeito nenhum!
As maçãs do rosto dela,que estavam pálidas,ficaram coradas em um tom rosa forte.
- Você vai se arrepender de fazer pouco caso dos meus talentos de caçadora quando eu jantar hoje à noite um coelho assado e deixar você ir a procura de comida sozinho.
- Ah,mas é responsabilidade do sequestrador garantir que o prisioneiro seja bem-alimentado. - Vendo que ela erguera as sobrancelhas,ele acrescentou,para ver como ela reagiria : - E que durma melhor ainda.
 Ela olhou para ele com apenas um vestígio de sorriso no rosto.
- Ah,o senhor vai dormir bem - ela assegurou-lhe. - Com os cavalos.
Jeon sorriu de volta,gostando do temperamento dela.
- Se a senhorita me permitir,vou atar seu machucado.
Ela inclinou a cabeça suntuosamente como resposta,tão orgulhosa quanto a princesa que tinha dado a Jungkook a gema que agora S/N usava em volta do pescoço,e talvez mais merecedora. Afinal de contas,a filha do sultão possuía grande beleza...mas não a habilidade com um arco e flecha.
Rasgando o forro de sua capa um pedaço largo de tecido,que era cetim e não irritaria sua pele delicada,ele a faria inspirar fundo e enrolaria a atadura improvisada em volta da estreita costela. Seria o suficiente,ele concluiu. Agora só tinha de convencê-la a tomar algo para dor (o que não seria tão fácil como imaginava).
- Eu tenho essência de papoula em um dos meus alforges - ele começou sem preâmbulos. - Algumas gotas ajudarão a diminuir a dor. Você tomaria?
- Você me considera algum tipo de idiota? Sei de uma mulher que tomou isso e não se lembrou de mais nada do que fez nas vinte e quatro horas seguintes,embora a aldeia inteira a tenha visto saltando em direção ao poço.
Por mais tentador que pudesse parecer,Jeon já se sentia responsável por aquele machucado. Também não seria estigmatizado como o espoliador dela. Não podia se esquecer do irmão.
- Não... - falou suavemente - eu não deixaria tomar tanto. Só um pouco,para a dor.
Ela desconfiava dele,com certeza,mas que outra escolha a garota tinha tão longe de casa e com tanta dor? Jungkook sentiu uma repentina e quase esmagadora raiva do irmão desnaturado,que tomava conta tão mal de suas mulheres,que permitia que S/N perambulasse pelo interior usando calças de couro,completamente indefesa. Faria mais do que ter uma simples conversa  com Robert Crais quando voltasse para o solar. Talvez também o fizesse passar um tempinho na prisão.
De repente,S/N rendeu-se,dizendo que tomaria o remédio,e que,ao fazer isso,"o faria calar a boca". Engolindo uma reprimenda,Jeon apressou-se até sua montaria para pegar o frasco no qual se guardava o líquido fétido. Ela torceu o nariz com o cheiro e em seguida,finalmente,permitiu que pingasse duas gotas em sua língua rosa e pontuda. Ela engoliu,parecendo nada impressionada,e depois,com muita urgência,insistiu que seguissem seu caminho.
- Porque - ele disse com a voz rouca - o sol está baixando rapidamente e ainda temos um longo caminho pela frente se quisermos chegar a Stephensgate amanhã antes do anoitecer.
- E o que - Jungkook quis saber,olhando para ela com seriedade - tem em Stephensgate?
- É lá que eu moro - ela gritou,como se ele fosse o homem mais estúpido a ter andado sobre a Terra. - Tenho que entregar você para Mellana.
 - Mellana? E quem é essa tal de Mellana que tem meu destino nas mãos assim de forma tão casual?
- Mellana é uma de minhas irmãs. Prometi que capturaria um homem para que ela pedisse um resgate.
Jeon não ficou nem um pouco incomodado ao ouvir isso.
- Você está querendo dizer que não é você quem pretende pedir meu resgate?
Ela fez uma careta de desgosto,enrugando seu nariz perfeito de um jeito quase caricato.
- Claro que não! - falou ela como se ele a tivesse ofendido só por ter pensado aquilo. - Quando preciso de dinheiro,tenho maneiras mais sensatas de consegui-lo.
Ao ver o olhar fracamente questionador de Jungkook,ela deu de ombros,depois gemeu quando o gesto fez doer a costela machucada.
- Simplesmente mato um ou dois cervos e vendo na estalagem local. Eles sempre têm demanda para carne de veado,e as florestas do conde de Stephensgate estão cheias deles. - Ela olhou para ele,os olhos arregalados por causa da indiscrição. - Não - ela acrescentou,falando como uma criança recitando a lição - que eu mate a caça do conde. Isso seria ilegal. Caçar em propriedade alheia é muito errado.
De repente,as razões por trás da relutância em se encontrar com o xerife local tornaram-se bastante claras para Jungkook. Mas ele não queria deixá-la irritada,não agora,e então fingiu não ter escutado esse descuido e apenas disse:
- Você deve amar muito sua irmã Mellana para ter esse trabalho todo por causa dela.
- Ah - S/N respondeu,uma sombra escurecendo os olhos. - Todo mundo a ama. Mellana é a mais linda da família. - Jungkook achou extremamente difícil acreditar nessa parte,porque,embora a beleza de S/N pudesse ser tão aparente para todos,era difícil de ser superada. - Não é nem um pouco parecida comigo. Não saberia como puxar a corda de um arco para salvar a própria vida,é extremamente tímida. Ou pelo menos era antes de conhecer aquele maldito menestrel.
- Perdão?
Como resposta,S/N apenas suspirou.
- Mas ela faz a melhor cerveja que você já tomou na vida.
Jungkook riu alto com essa afirmação. Do lado dele,S/N lançou-lhe um olhar magoado,insistindo:
- Você não vai mais rir quando experimentar a cerveja. Mellana tem um verdadeiro talento quando se trata de fazer bebida.
- E eu vou experimentar a cerveja dela? - Jungkook quis saber.
Ela foi maliciosa:
- Vou querer ter certeza que você experimente uma caneca ou duas antes de Mel soltar você.
Jungkook sorriu parao rosto franco abaixo do seu. Ela era totalmente prática e,embora recentemente restituída,estava de bom humor,bem diferente de qualquer outra mulher que já tinha conhecido.
-  E é para ela que você está me sequestrando?
- Ah,sim. - S/N fez um gesto com a mão,demonstrando irritação. - Prometi pra ela,sabe,em um momento de fraqueza. Fiquei distraída com toda a agitação em torno do casamento de Robert.
- Seu irmão vai se casar? - Jungkook desejou saber se isso era desculpa o suficiente para a lamentável negligência do garoto em relação ao bem-estar da irmã mais nova,e concluiu que não era.
- Com toda certeza,e com a filha do prefeito. Será o casamento do ano. É claro,se tornará um funeral se Robert descobrir sobre aquele maldito menestrel. 
- É a segunda vez que você fala dessa pessoa desafortunada. O que o camarada fez para merecer essa desaprovação?
Ela franziu a testa.
- Não importa. O que importa é que fiz uma promessa para Mellana antes de saber o que ela queria que eu fizesse,e agora estou comprometida,e você também. Espero que não se importe demais. Eu jamais - confessou ela com seriedade,virando os olhos acizentados maravilhosos na direção dele - teria machucado você com minha faca. Foi tudo um show. Acho que fiz um trabalho admirável assustando você e seu escudeiro,não acha?
Jungkook sorriu,considerando a jovem inocente demais. Falava de forma confiante demais com ele,mesmo sem conhecê-lo. Mas depois lhe ocorreu que talvez ela soubesse um pouco mais do que deixava transparecer. Ela sabia que ele viria para a cachoeira,e sabia que viria até o afloramento e a veria se banhando. Mas como?
Quando ele perguntou,ela deu de ombros e de repente pareceu preocupada e ocupou-se em calçar as botas,que tinha buscado de trás de uma moita de violetas.
- Sabão que tinha familiaridade com a região pelo caminho que estava fazendo - ela confessou relutantemente. - Todo mundo que já esteve nesta área conhece a cachoeira,e ninguém que já tenha vindo à cachoeira resistiria voltar. E além disso... Bem,você me lembra um pouco alguém,e eu o conheci exatamente do mesmo jeito que encontrei você,só que não com a ponta de uma faca.
Mas essa referência dúbia não seria mais bem explorada,não importava o quanto ele insistisse. Finalmente,em uma tentativa óbvia de desviá-lo daquela linha de questionamento,ela insistiu que seguissem caminho,pois,caso não andassem logo,complicações de grande importância acontecem e que,por favor,ele se virasse para que ela pudesse atar as mãos dele novamente.
Jungkook olhou para ela sem acreditar.
- Pensei que tivéssemos chegado a um acordo em relação a isso. Cuidei do seu machucado e você me desamarrou. 
- Mas não posso arriscar que você fuja quando eu virar as costas - ela declarou com firmeza. - Como um soldado de guerra,você certamente entende.
Jeon encarou-a,incapaz de imaginar um argumento razoável frente a uma lógica dessas. Então,de repente,o argumento lhe veio. Ela era leve e ficaria muito bem sentada na sela na frente dele. Ele não poderia fugir com ela sentada ali.
Ele fez a sugestão e,embora ela tenha rejeitado a princípio,ele sabia que seria apenas a primeira reação. S/N Crais era uma jovem que apreciava as coisas feitas do seu jeito e que parecia insistir imensamente em ver as mãos dele amarradas. Jeon tinha certeza de que ela considerava isso uma maneira de evitar que ele fugisse ou de garantir que aquelas mesmas mãos vagueassem por onde não deviam. Apesar do exibicionismo mais cedo na cachoeira,S/N era uma pessoa com uma grande incoveniente modéstia,um traço  um tanto surpreendente para uma sequestradora,Jungkook pensou.
Finalmente,ela cedeu,mas só depois de mais uns resmungos sobre como deveria ter amordaçado desde o início e como nunca na vida tinha encontrado um cavaleiro tão tagarela.
- Você vai ficar o tempo todo brigando,praguejando e jogando conversa fora? - perguntou ela,da mesma forma mal-humorada que Peter,enquanto colocava a espada e a adaga nos alforges da montaria.
- Com certeza,não- Jungkook declarou. - Um cavaleiro é o exemplo da virtude. Seu único objetivo é a justiça pelo bem do reino.
- Hunf- S/N rio com desdém. - Eu nunca vi um cavaleiro assim.
- É uma pena. Conheci homens assim - mentiu Jungkook - ,e apreciei horas de conversas enriquecedoras àmesa deles. - Geralmente enquanto dançarinas balançavam os seios à sua frente,verdade seja dita,mas não havia razão para ela saber disso.
S/N riu novamente com desdém.
- Já passei horas à mesa de um lorde e só ó que ouvi foram arrotos. E ele era um conde.
Jungkook encarou-a com curiosidade.
-  O que você estava fazendo à mesa com um conde?
- Não importa - S/N disse,franzindo as sobrancelhas. - Você tem o hábito irritante de querer arrancar informações de mim. Eu juro,nunca vi um cavaleiro tão tagarela.
- E eu - Jungkook opôs-se,olhando em desaprovação para S/N,que enfiava dentro das calças a barra da blusa grande demais para seu tamanho - nunca na minha vida vi um comportamento tão impróprio para uma moça.
S/N apenas sorriu,colocou um pé delicado no estribo e acomodou-se habilmente na sela,aparentemente não se importando com a costela machucada.
- Bem - ela disse,impaciente,olhando pra ele. - Você vem ou não?
Jungkook olhou para a égua da garota.
- E a sua égua? Devemos prender o freio dela ao Skinner?
- Com certeza,não- S/N disse com escárnio. - Violeta nos segue.
Jungkook ergueu uma sobrancelha.
- Violeta? - ele repetiu,com um sorriso irônico.
-Sim,o nome dela é Violeta,e eu apreciaria que você tirasse esse sorriso irônico do rosto. Ela é tão bem treinada quanto qualquer corcel,e tem um temperamento bem melhor. Tenho-a desde criança,e não a trocaria por nada.
Jungkook sorriu para a indignação sincera na voz de S/N.
- Desde criança,é? - Jungkook deu risada. -  E o que você é agora,diga-me? Você tem  a aparência de quem fez 16 anos há menos de uma semana.
Quando S/N apertou os lábios em uma linha fina,obviamente determinada a não permitir que ele a incitasse a perder o controle,de forma arrogante atirou os cabelos longos para trás dos ombros fazendo-o sorrir novamente. Ela era uma pequena força da natureza,essa S/N Crais,e ele enfrentaria grandes dificuldades para manter as mãos longe dela. No fim das contas,talvez devesse ter permitido que ela o amarrasse novamente.
Sorrindo,Jungkook acomodou-se na sela atrás da garota indignada e começou a esticar os braços em volta da cintura dela para pegar as rédeas,mas levou um belo tapa nas costas das mãos por ter feito isso.
- Eu seguro as rédeas - S/N informou-lhe em poucas palavras. Na verdade,ela já estava com a guia de couro nas mãos cobertas por luvas. - Não faz sentido você segurar. Você sequer sabe o caminho.
Jeon deu de ombros e posicionou as mãos nos quadris da garota,apreciando a sensação aveludada nas calças de couro em seus dedos.
Desta vez,ele recebeu uma cotovelada no diafragma por essa falha.
- Meu Deus,mulher - ele praguejou,apertando a cintura. - Para que isso? 
(Gente,eu ri muito mas eu não sei porque,na hora que eu pensei nessa fala eu comecei a rir,comenta aí se você riu também jkkk)
- Se você não consegue ficar com as mãos quietas,vou amarrá-lo atrás das suas costas,juro.
S/N tinha virado para trás para encará-lo e,ao fazer isso,o traseiro atrevido encostou na parte da frente das calças de Jungkook,causando uma reação tão imediata e inesperada que Jeon ficou momentaneamente perplexo. Movendo-se para que ela não percebesse,Jungkook perguntou-se sobre a espontaneidade da reação do corpo dele ao sentir o dela. O que havia de errado com ele? A garota era atraente,tudo bem,mas parecia que cada poro do seu corpo estava implorando o toque dela. Não era assim que costumava reagir a uma mulher bonita. Normalmente,tinha controle sobre si mesmo,e esse autocontrole era o que trazia mulheres aos seus braços. Nenhuma mulher suportava ser ignorada,e era esse o truque para atraí-las. Ignore-a,e ela virá até você.
Mas como podia ignorar esta garota quando cada fibra do seu corpo estava contorcendo-se para juntar-se a ela? Como podia ignorá-la quando a leve fragrância dos cabelos ondulados e volumosos estava constantemente em suas narinas,a lembrança das coxas delgadas presas em volta de sua cintura constantemente em sua cabeça? E ele não achava que faria diferença se estivessem sentados sobre a mesma sela ou à mesa de uma taverna,distantes vinte léguas um do outro; S/N Crais,como uma lasca de madeira,entrara sob sua pele com uma velocidade notável,e tirá-la,ele percebeu,não seria fácil.
Balançando a cabeça,ciente de que aqueles olhos cinzentos estavam curiosamente fixados nele,ele cerrou os dentes e tentou se acalmar. Ele não podia deixar que ela tivesse conhecimento do efeito devastador que tinha sobre ele.
Mas era tarde demais. Os cílios negros anaixaram sobre os olhos,e S/N perguntou desconfiada,olhando fixamente para o cinto dele:
- O que é isso?
- O quê?
-  Isso - ela disse,e não havia como se confundir em relação ao que ela estava se referindo quando ela aproximou o quadril e lançou uma olhar acusador para a expressão mortificada de Jeon. - É o cabo de uma faca? Você tem uma arma sob o cinto e não me disse?
A garota estava falando sério? Ele podia perceber,pela feição zangada que a boca tinha formado,que ela honestamente não fazia ideia do que havia sob as calças de um homem. Novamente,ele teve um ataque de raiva em relação a Robert Crais por deixar esta 'criança' perambular pelo interior sendo tão inocente. Certamente,uma daquelas irmãs deveria ter lhe contado sobre os fatos da vida,e,no entanto,ela parecia verdadeiramente incomodada por ele não lhe ter entregado sua arma mais poderosa.
Jungkook não estava totalmente certo de como proceder. Não tinha qualquer experiência com virgens. E esta estava armada. O simples pensamento do que ela poderia fazer quando ele desembainhasse o objeto duro sobre o qual ela estava fazendo tanto estardalhaço o fez suar frio. Ela parecia não sentir remorso algum ao empunhar aquela lâmina que tinha na cintura.
- Não é o cabo de uma faca - Jungkook disse finalmente,incapaz de evitar que a dignidade ferida ficasse evidente ao seu tom de voz. Afinal de contas,era consideravelmente maior que o cabo de uma faca.
 - E então,o que é? - S/N perguntou. - Não consigo ficar confortável com essa coisa cutucando minhas costas.
Jungkook abriu a boca para responder,hesitando por estar incerto de como colocar em palavras o que queria dizer,e ficou aliviado ao saber que não seria preciso explicação adicional. De repente,o rosto de S/N ficou vermelho. Os olhos dela ficaram arregalados e o queixo caiu. Sim,uma das cinco irmãs tinha lhe falado sobre os fatos da vida. Essa,no entanto,parecia ser a primeira vez que se deparava com uma situação que requeria que ela colocasse a informação em prática.
Desviando rapidamente os olhos,S/N agarrou as rédeas do cavalo,exclamando um horrorizado "Oh!".
O desconforto de Jeon começava a se dissipar,mas a graça que estava achando de como o fato tinha desconcertado S/N crescia conforme as bochechas da garota ficavam com um tom de vermelho cada vez mais forte.
- Sinto muito,mas é uma reação natural à sua proximidade,madame - disse ele,referindo-se com a mortificação de S/N. - Talvez não tenha visto uma reação tão forte em nenhum de seus prisioneiros anteriores.
S/N estava falando com a voz tão baixa que ele teve que curvar o corpo para conseguir escutar sua resposta.
- Nunca fiz isso antes - sussurrou ela. - Você é o primeiro homem que eu...eu nunca...- Ela ficou sem voz,obviamente frustrada. - Ah,droga - ela praguejou e chutou os flancos do cavalo de Jungkook com violência. - Apenas guarde pra você ou eu...vou cortá-lo fora!
Sorrindo,Jungkook ajeitou-se na sela,satisfeito com o rumo que o dia estava tomando. Quem pensaria,quando ele acordou esta manhã sobre um monte de feno,com palha no meio dos cabelos castanhos e o orvalho nas roupas,que à noite ele seria o prisioneiro de uma sequestradora tão atraente?
Ficava admirando ao pensar que,durante todos aqueles anos,antes de ter partido da Inglaterra,ele cavalgava perto do moinho do pai e não dava a mínima possibilidade de,sob aquele telhado de sapê,haver uma distração tão agradável quanto S/N Crais. Ele desfrutaria muito mais a volta pra casa,algo que jamais imaginara,graças a essa Valquíria (ou Valkíria) na sela à sua frente,ignorando-o tão obstinadamente.
Ele riu para si mesmo,com prazer,sem dar importância sobre se a garota o consideraria louco.
O cavaleiro intratável parecia estar de divertindo de verdade,e isso a enfurecia.
Não que a esperasse aterrorizar seu prisioneiro,mas como uma caçadora habilidosa - e totalmente armada -, esperava um pouco de respeito.
Mas a implicância constante do Sr. Jeongguk provava que ele realmente não a considerava uma ameaça séria.
Ela não sentia que estava no controle da situação,embora fosse ela quem estivesse com a adaga. Sua autoridade lhe fora usurpada,primeiramente quando aquele escudeiro cabeça de ervilha a nocauteou e depois quando teve de desamarrar o Sr. Jeongguk para que ele pudesse cuidar de seu ferimento.
Talvez esse tenha sido o erro fatal: Não desarmar o escudeiro quando teve a oportunidade. Mas tinha ficado com pena dele,berrando,pendurado,os braços golpeando o ar. Certamente nunca imaginaria que ele teria o bom-senso de esconder uma faca na bota,muito menos conseguir se soltar. Era uma queda de dois metros ou mais.
Mas ele escapara,e ela teve de pegar por sua falta de prudência.
Quando apertou de leve a costela machucada e viu que a dor era tolerável,S/N achou que deveria agradecer a Saint Elias por ter lhe dado um prisioneiro com um toque tão delicado. Esse Sr. Jeongguk,apesar do nome tamanho e uma pouca quantidade de cabelo no rosto (a barba por fazer), a tinha surpreendido com a gentileza,examinando sua costela machucada com os dedos longos e reconfortantes. Aquele breve vislumbre da verdadeira natureza dele,o lado que não estava armado de cinismo,foi iluminado.
No entanto,ela trocaria,a qualquer hora,toda essa sensibilidade por um prisioneiro mais civilizado e menos amoroso.
Jeongguk não tinha medo nenhum dela,mas não era isso que a incomodava. Havia algo no modo examinador dos olhos castanhos do cavaleiro que a devassavam a cada relance,um jeito levemente irônico na curva dos lábios,que a enervava e a deixava tímida. S/N normalmente não era uma garota acanhada e não conseguia entender o que o Sr. Jeongguk estava fazendo para que se sentisse daquele jeito. Ela ressentia-se por isso. Profundamente.

Free My Heart (Jeon Jungkook)Onde histórias criam vida. Descubra agora