Ficamos por um longo período nos olhando até que ela, por fim, começa a andar em minha direção com certo tédio, com a expressão cansada e arrogância. Os olhos mortais dela perambulam entre a minha face e a de Rustan, como se fôssemos os inimigos ali, os impostores que a impediam de viver - Rustan, de certa forma, já era mesmo por ser um soldado soviético, porém, eu, talvez, na visão dela, ela me considera pior do que eles. E eu não entendia o por que disso.
- Ainda está viva? Eu jurava que eles te matariam quando... - eu arregalo os olhos e minha boca se abre perplexa com suas palavra. Eu escutava a voz dela e ainda não acreditava no que ela me dizia.
- Beike! - eu exclamo exasperada, interrompendo a sua fala. - Como pode ser tão cruel? Você estava lá, viu o que eles queriam fazer comigo e fugiu! Você me abandonou!
Grito relevando para Rustan uma das pendências que me impediam de seguir em frente. Não era somente pela situação na qual vivia, mas por ela, depois de 6 anos comigo, ter-me largado para aqueles homens desfrutarem de meu corpo e alma. Mesmo nunca tendo sido próxima a ela, eu achava que poderia contar com ela, por buscar água, comida, vestes melhores para o frio, uma vez que eu a mantinha viva! Contudo, eu fui enganada por ela, pela minha inocência, crendo que minhas ações bondosas alcançariam o seu coração e ela teria algum apego sentimental. Eu só fui um objeto em suas mãos, e quando ela viu que não teria mais utilidade, deixou-me sem nem olhar para trás.
- Era a minha vida ou a sua. Apesar de não estar vivendo no momento um luxo na qual sempre sonhei, eu não permitiria ser desonrada e humilhada por essas pragas vermelhas! - ela cuspe mais uma vez no chão, aos pés de Rustan demonstrando seu completo ódio e desrespeito com o seu inimigo.
Ele se mantinha calmo, mas eu sabia que sua paciência teria um fim e ele não permitiria mais que ela falasse daquela forma com ele. Só continuava quieto porque sabia que aquele assunto era meu e eu não o chamaria para me ajudar - não ainda.
- Mas é uma baita ironia, aquele que te estuprou, agora é o homem que você ama. Amar - ela solta uma irada diabólica, rindo de sua própria fala sem muito nexo para mim -, essa é uma palavra forte. Desde quando começou a se prostituir com o inimigo? Depois que eles de deturparam, perdeu o juízo das coisas?
Ela anda mais um passo e perde a compostura, com o corpo desequilibrado e não aguentando nas pernas. Ela ergue a mão para mim, porém, pisca várias vezes parecendo ter esquecido o que iria me dizer para agredir-me.
Olho para a prima de meu pai mais atenta do que antes e reparo em traços que minha raiva não estava me permitindo enxergar: Beike estava bêbada, não tanto, mas o suficiente para falar asneiras e todas as mágoas que guarda em seu coração. Finalmente eu comecei a conhecer quem é Johanna Beike.
Ela se aproxima de mim e cai desmaiada nos meus pés. Viro meu rosto para Rustan procurando alguma ajuda no que fazer naquela situação tão inesperada. As vestes dela eram novas, porém, já estavam gastas, rasgadas; o seu cabelo bem mais embaraçado e sujo sem encontravam - lembro-me que ela é uma mulher bem vaidosa com a aparência e estar assim é o fundo do poço. Em sua pele via-se marcas estranhas, vermelhas como se algo se prendeu em seus braços - até eu entender que eram mãos fortes agarrando-a.
- O que aconteceu com ela? -pergunto a Rustan, examinando a mulher caída como se ele fosse entender. Porém, com o andar dele pelo apartamento, algo me dizia que ele sabia sim do que se tratava.
- Leah, desde quando a guerra se deu o seu início, todas as pessoas buscaram por abrigos, proteção, ou fugiram para o exterior, mas você precisa se lembrar que tanto ir quanto ficar restou uma consequência: a sobrevivência - olho para ele, observando o maxilar rígido e a postura tensa, ele ficava assim quando não queria me revelar alguma coisa. No entanto, para a minha surpresa, ele continua em uma voz baixa e pesarosa: - Para sobreviver, você é obrigado a fazer qualquer tipo de coisas, das quais muitas vezes não se orgulha. A maioria das mulheres que não tem condição para encontrar comida, abrigo ou água, começou a se prostituir em troca dessas condições aos soldados. Estes soldados tem mantimentos e podem facilmente furtar um pouco de comida e água em troca de um prazer carnal, porque, a senhorita não faz ideia do inferno que é estar diariamente naquele campo de guerra e não encontrar algo para escapar desta realidade.
![](https://img.wattpad.com/cover/229981272-288-k587372.jpg)
YOU ARE READING
Amor a Toda Prova
היסטורי בדיוניNo final da segunda guerra mundial, Leah, uma alemã que vive com uma prima de seu falecido pai, sente em sua própria pele os horrores que uma guerra produz, sentindo a extrema necessidade pela sobrevivência, ainda mais com a notícia do avanço dos so...