Capítulo 9

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Gustavo estranhou ao encontrar Thalles na sala. Era muito cedo ainda, o que denotava que o amigo ou não tinha dormido, ou havia dormido bem pouco. Para completar, ele estava no escuro.

— Insônia? — aproximou-se e, ao chegar mais perto, viu que segurava o celular no qual ele próprio, na noite anterior, havia atendido a ligação de um potencial cliente.

— Tentei verificar o número com o qual você falou ontem, no entanto percebi que consta como restrito — Thalles respondeu sem encará-lo.

— O cara disse que queria sigilo — Gustavo fez questão de lembrá-lo.

— Entendo, no entanto não acha estranho que as duas ligações, tanto a primeira que o Leo atendeu, quanto a segunda atendida por você, tenham sido originadas de números privados? — demonstrou que ficara intrigado.

— As pessoas estão cada vez mais desconfiadas... Quer saber mesmo o que acho? — Gustavo sentou-se no sofá diante ao que ele estava — Ter sabido que o cliente foi recomendado pelo doutor Siqueira mexeu com você.

Thalles deixou o celular no sofá e se levantou. Gustavo acertara em cheio, pois não esperava ouvir aquele nome tão cedo. Foi em direção à sacada e o amigo, imitando seu gesto, seguiu-o.

— Nunca me disse o que o incomodou tanto naquele trabalho.

— Talvez porque eu não tenha certeza — Thalles foi sincero — A única coisa que sei é que a Lorena merecia coisa melhor do que aquele cara. Sei que não podemos nos orgulhar dos trabalhos que pegamos, porém, tem uns piores do que os outros. Se ele ao menos gostasse dela, mas a impressão que nunca consegui apagar é a de que ele queria apenas ganhar; no fim das contas, queria provar que sua vontade deveria prevalecer.

— Todo homem que nos contrata quer isso. Veja o meu trabalho atual: seduzir uma mulher mais velha para que seus filhos possam interditá-la e tomar conta da empresa. Todos querem a mesma coisa: ganhar.

— Porém, aquele canalha não visava lucro. Aliás, ela era de origem humilde. Ele só queria convencê-la de que era a melhor opção, mesmo sem nunca ter chegado perto de sê-lo.

—Talvez tenha razão, mas não acha que continuar pensando nisso depois de um ano seja um problema? Quer dizer, será que você não se apaixonou por esta moça?

— Claro que não! Para homens como nós, não existe essa coisa de se apaixonar — Thalles riu nervoso — No entanto, aquele advogado é um dos piores clientes que já tive o desprazer de conhecer.

— E por isso estava com o telefone?... Quer dizer, o que pretendia? Ligar para o cliente e, só por ele ter sido mal recomendado, fazê-lo mudar de ideia? — Gustavo tentou compreender.

— Não — negou com a cabeça — A minha aposentadoria ainda está longe e não posso me dar ao luxo de dispensar clientes sem ouvi-los. Na realidade, e não me pergunte o motivo, pois não saberia explicá-lo, quero esse trabalho.


****

IIsadora suspirou, achando maravilhoso encontrar a redação em silêncio. Todos compenetrados no trabalho. Nem mesmo Geanne havia aparecido para lhe dizer um bom dia falso e forçado. Assim, pôde sentar-se em sua baía e torcer para que a leve dor de cabeça que sentia a abandonasse. Tinha certeza de que ela fora resultado do vinho que tomara ao jantar. Heloísa e André haviam ficado em seu apartamento até quase meia-noite e, embora não os tivesse visto ainda, sabia que, bem diferente dela, estariam com uma ótima aparência, como se tivessem dormido por oito longas horas.

O telefonema de André para o número presente no cartão, na noite passada, ainda ressoava em sua cabeça. Havia prometido à Lorena mantê-la informada sobre qualquer novidade, porém, não imaginava que aquela história mirabolante fosse confirmada tão rapidamente. Ao mesmo tempo em que queria manter sua palavra, não queria magoá-la ainda mais.

Projeto Don Juan (Degustação)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora