CAPÍTULO 03: Atrasos e skates caros

227 52 643
                                    

Ding Dong.

Já é a terceira vez que toco a campainha e minhas mãos já estão suadas pelo nervosismo. Então, começo uma tentativa apressada e inconstante de secá-las na calça jeans.

— Não acredito que ela vai me dar o cano no primeiro dia! Não é possível. – Murmuro encostando a cabeça no batente da porta. — Nem sei porque estou tão nervoso. Não é como se estivesse prestes a conhecer a Scarlett Johansson! – Dou uma bituca na porta e desisto.

Desisto da minha vida! Sério. Não tem condições! Qual a possibilidade de euzinho vir num dos bairros lá na casa da mãe Joana, encontrar a sobrinha neta da bruxa professora de português, ficar quinze minutos além do horário combinado e ainda plantado na frente da varanda? Reviro os olhos negros e começo a descer as escadinhas de madeira, indo em direção a minha bicicleta.

Porém, antes de dar partida, observo a casa particularmente interessante. Sua faixada era branca, mas os detalhes principais que davam o toque Fátima no lugar eram azuis. Tudo de madeira.

Uma coisa engraçada em Ares do Campo é que as casas não têm muros ou cerca elétrica, nem nada do tipo. Confesso que estranhei quando cheguei aqui a seis anos atrás.

Eu tinha vindo de Salvador e uma das coisas que mais temos é proteção nas casas pelo medo de algum assaltante. Só que isso não tem em Ares de Campo.

O lugar é tão pequeno com seus dez mil habitantes que o perigo é quase nulo. Tanto que estamos em terceiro lugar no ranking das cidades mais seguras em todo o Brasil e esse foi um dos motivos da minha mãe querer mudar da cidade grande.

A última vez que tivemos algo do tipo aqui, havia sido um parente distante de alguém que veio visitá-lo... Mas não deu muito certo, já que o cara foi tentar roubar as galinhas do seu Adalberto da rua Flores Vermelhas. O velho pegou logo uma espingarda, não dando nem tempo do assaltante tocar na Gertrude, sua galinha premiada.

Mas não houve morte. Somente o senhor Juliano, o único policial ativo daqui, correndo com sua pancinha — que mais parecia uma grávida de cinco meses — em direção ao meliante e prendendo-o para levá-lo à delegacia da cidade mais próxima.

— Aquilo foi a coisa mais fora do comum que aconteceu nesse fim de mundo... – Sopro um riso e coloco o pé no pedal para dar partida, mas ouço uma voz conhecida e paro no mesmo lugar.

Fátima vinha cheia de sacolas de supermercado nas mãos com uma cara nada satisfeita e quase caindo pelo peso. Prenso os lábios um no outro para conter a risada. Era engraçado de se ver aquela coisinha carregando sacolas que facilmente poderiam ser do seu tamanho.

Desço da bicicleta, encostando-a próximo à cerca branca da casa e indo em direção à Fátima. Ela nem se quer percebe minha aproximação, mesmo já estando atrás dela, em frente à entrada.

— Quer ajuda? – A garota dá um grito fino, deixando as compras caírem no chão e eu rio nasalado com as mãos no bolso. — Não imaginava que fosse tão desatenta.

Fátima vira-se para mim com os olhos arregalados claramente de susto e raiva. Porém, quando suas íris castanhas fitam a mim e a compreensão de ser eu atinge seu sistema nervoso, seus ombros parecem relaxar e o dedo indicador, já levantado e apontado na direção do meu peito, abaixa.

— Oi. – Fala com a voz constrangida, mas que não deixada de ser fofa e aveludada.

— Oi. – Responda-a e olho para as coisas no chão também percebendo os famosos all star azul nos pés da garota. — Foi mal pelo susto... Ainda quer ajuda? – Ela pisca algumas vezes e uma luz parece passar pelo seu cérebro, quando olha para baixo e vê a bagunça.

A Garota do All Star Azul || ✔Where stories live. Discover now