M I G U E L

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— Ainda não aprendeu a bater na porta antes de entrar?

—Não, quando sei que está sem paciente. O último bebê saiu há um minuto.

Miguel ouviu a explicação do seu melhor amigo Antônio,  sem levantar a cabeça, continuou fazendo anotações do seu último paciente, sabia o que o amigo desejava dele. Fingindo está concentrado na tela do computador, mas para quando ele levanta da cadeira e se aproxima da sua.

— Está bem, Antônio, diga logo o que quer. Sei que não vai desistir enquanto não conseguir minha total atenção.

— Não só sua atenção, mas conseguir te levar para uma balada, mulheres bonitas, gostosas e muitas bebidas.

— Rebeca sabe disso? Se não, vou ligar para ela agora.

Ele riu, quando o Miguel pegou o celular, empurrando os óculos no rosto com a ponta do dedo e voltou a sentar e falou:

— Ela está me mandando fazer isso, já não aguenta mais me ouvir falar de você – Puxou a cadeira para mais perto da mesa. — Miguel, é sério, você precisa ver que a vida tem mais do que sua profissão, está na hora de sair dessa sala, meu amigo.

Eles são amigos desde sempre, suas famílias são vizinhas há muitos anos em uma cidade do interior, sempre tiveram o sonho de ser médico, o Antônio é  dermatologista e o Miguel pediatra. Trabalham em uma clínica particular, são sócios, mas seu amigo detém uma parte maior da sociedade.

— É o que sugere que eu pegue uma mulher só por uma noite e com isso esqueça minha ex esposa?

Miguel casou-se aos vinte e três anos, com Yara, ela com vinte e um, jovens e cheios de planos, principalmente no que se referia às suas profissões. Ele a conheceu ainda na universidade, ela se formou em educação física, mas diferente dele o casamento não foi a prioridade na sua lista de realizações nem o que de fato a fazia feliz.

— Não. Mas é um começo, podemos sair, mas não é necessário pegar uma mulher – Ele suspirou desanimado, não era a primeira vez que tentava convencê-lo. — Yara está realizando seu sonho, vai mesmo ficar esperando por ela, e se de onde ela está receber outro convite para trabalhar com uma equipe fora do país, você acha que ela irá recusar?

Miguel deitou a cabeça sobre a mesa, desiludido e aborrecido. Sabe que o que ouviu era verdade.

Permaneceram casados por sete anos, mas a dois não mais se entendiam. Discussões por besteiras no início, nas reuniões de família um deles passou a ir sozinho. 

O trabalho dela na academia de ginástica passou a requerer mais a sua presença, pois estava com mais clientes e nos dias de folga do Miguel ele  passava sozinho em casa. 

As cobranças passaram a ser recorrentes. Ele queria ser pai, mas ela não.

"Não posso estragar meu corpo, tenho minha profissão, meus alunos, quero viajar, ainda sou jovem e a mais impactante: não gosto de crianças!

Miguel lembrou de todas as desculpas usadas por ela, desanimado sugeriu que dessem um tempo, porém ela não aceitou. Prometeu que tentaria pensar e para ir se acostumando com a ideia iria ao médico para preparar seu corpo para conceber um filho.

— Não quero te ver de uma hora para outra depressivo, sabe que não vai ser nada bom para a sua profissão.

Miguel ergueu a sobrancelha desconfiado, já ouviu a mesma coisa só que de uma mulher. Antônio não desanimou.

— Beber e ficar sem dormir, não são solução – inesperadamente falou. — Não está pegando  drogas? Pelo amor de Deus homem...

— Quando falou com a minha mãe? E desde de quando vocês estão planejando isso?

UMA NOITEWhere stories live. Discover now