Pela Liberdade

Capítulo 25

Pagar por seus pecados? -  pensava Math em silêncio - O que aquele homem queria dizer com isso?

— Quando o questionei sobre o que faria comigo – prossegue Viktor – o Caçador respondeu que não faria nada, que naquele dia em uma estrada entre Berm e o Sul, ele havia capturado uma Atração, uma garotinha pequena com olhos esverdeados, ela chorava muito e até para ele aquilo lhe doía no peito, após tantos anos caçando aquelas pessoas o homem já estava cansado do que fazia, ele não gostava de seu trabalho e apenas o fazia para sustentar sua família, mas ver aquela criança o fazia lembrar dos seus próprios filhos, então havia decidido deixar a garota ir, havia decidido que não mataria mais Atrações, ainda que o rei pudesse matá-lo graças àquilo. 

"Eu ouvi tudo aquilo apavorado, achava que todos aqueles homens eram cruéis e assassinos sem coração, para mim ouvir aquilo era como ouvir um monte de mentiras, mas então o Caçador de Atrações, que carregava o emblema de Berm em sua roupa, retirou sua camisa revelando uma enorme marca vermelha que cruzava seu peito, uma mancha que poderia ser confundida com uma queimadura, quando me disse que havia nascido assim, que me apercebi que o próprio Caçador... era uma Atração".

  Completamente desnorteados com o caminhar da história de Viktor, todos soltaram suspiros exasperados, como uma Atração poderia caçar outras Atrações?! Se perguntavam todos eles. Impressionada com a história até mesmo Arabella, ainda tonta, abrira seus olhos espantada com o que havia ouvido. Do lado do corpo desacordado de Grace, Ben ouvia em silêncio a história que Viktor já havia contado algumas vezes para consolar seus homens no Sul, ele mesmo sempre se sentia melhor ao ouvir aquela história.
— Ele era uma Atração?! – diz Arabella erguendo seu corpo deitado sobre as raízes, com seus braços apoiando o peso de seu corpo, ainda inclinado, ela olha na direção do Príncipe, se perguntando por que ele nunca lhe havia contado aquela história.

  Ao ouvir a exclamação de Arabella o ruivo sente os cantos da sua boca subirem em um leve sorriso, o som da voz da sua Rainha, sempre lhe fazia abrandar o coração, ainda que ela estivesse exasperada, como agora.

— O meu espanto foi o mesmo que o de vocês, talvez bem maior já que eu via aquilo com meus próprios olhos – Viktor dizia olhando para todos os presentes, um por um nos olhos, enquanto voltava a falar – Foi então que o homem continuou a me contar que quando decidira soltar a garotinha se deparou com este exilado, e antes mesmo que pudesse falar algo o soldado exilado junto de seu companheiro o atacaram, ele então para garantir sua própria vida precisou atacar, e feriu gravemente o soldado, enquanto o companheiro tentava salvar seu amigo, o Caçador viu uma chance e pondo a garotinha sobre seu ombro, fugiu com ela.

"Diante de mim, o Caçador disse que havia seguido os Exilados a distância, e esperado até à noite para encontrar o homem que havia ferido, mesmo quando havia prometido para si mesmo não ferir mais um inocente ele o havia feito, e seu plano era entregar sua vida àquele soldado, para que ele pudesse finalmente pagar por seus pecados".

   Lucinda ouvia a história desde o começo em silêncio, ela entendia o pensamento daquele Caçador, ela mesma carregava rancor de si mesma por coisas que fizera no passado, ainda que fosse pela sua vida, ela não conseguia se perdoar. O mesmo pensamento para Math, ele não se perdoava por ter ferido Grace, ela era inocente, e ainda que estivesse tentando salvar seus amigos será que suas ações poderiam ser consideradas as melhores a serem tomadas naquele momento? E se tivesse outra forma, Grace não teria se ferido e estaria bem agora, ele se culpava, não sabia como se perdoar pelo que houve, o moreno tinha medo de como encararia a garota quando acordasse. Se acordar pensa ele, assustado com a idéia de a garota morrer ali mesmo.

— Mas... – Viktor continuava a falar, chamando a atenção de Lucinda e Math, os tirando de seus pensamentos –  ouvindo aquilo eu não fui capaz de suportar, aquele homem queria pagar por seus pecados pelas mãos de alguém que naturalmente era considerado seu inimigo, mas ao notar que o soldado estava ferido demais para tirar sua vida, diante de mim o homem sacou sua espada, achei que fosse morrer, eu ainda estava apavorado, as palavras dele tinham sido demais para minha mente processar, até que ele virando o cabo da sua espada em minha direção, me disse que se não pagaria por seus pecados pela mão de seu inimigo, que pagasse pelas mãos de uma Atração, me entregando a espada, se ajoelhou no chão e entregou sua vida a mim"
— Você o matou? – pergunta Marjorie que se mantinha calma enquanto ouvia toda a história. Se levantando e olhando para todos ao redor, Viktor conclui.
— Eu nasci herdeiro ao trono deste país, e para mudá-lo e torná-lo melhor é que sobrevivi, mesmo um garoto eu sabia o significado de perdão, quando aquele homem entregou sua vida nas minhas mãos eu decidi que o perdoaria, é claro que meu Perdão não mudaria as vidas que ele tirou, mas uma vida cheia de arrependimento é muito pior que uma morte cheia de vingança, então eu permiti que ele vivesse, ainda que com muita insistência da parte dele de que não merecia viver, eu lhe disse que ele servia ao rei de Frid, mas que se quisesse poderia servir ao verdadeiro herdeiro de Frid, onde encontraria paz junto de sua família, e jamais precisaria sujar suas mãos de sangue inocente novamente. Lhe contei quem eu era, a vida de quem ele havia poupado naquela noite e por causa disso garanti que ele e sua família seriam mantidos protegidos sob a tutela dos Exilados do Sul, hoje este homem é um dos meus mais leais soldados, e estes – diz Viktor apontando para Ben e Grace – são seus filhos!

  Com as palavras de Viktor e a história daquele homem, os Guardiões não puderam conter o que estavam sentindo e até mesmo o mais durão e carrancudo alí, não pôde conter suas lágrimas, a surpresa ao descobrir que Ben e Grace eram os filhos daquele Caçador pegou todos desprevenidos, e Math que chorava igual uma criança pedia perdão ao arqueiro por ferir a sua irmã, Ben não parecia chateado com Math, e ainda que Math pedisse perdão Ben se negava a ter que responder, já que para ele, desde o começo, nenhum daqueles alí eram culpados de coisa alguma.
— Math – Viktor segurando o moreno pelo ombro, se aguacha ficando de frente à ele, que estava sentado – o que quero dizer com isto é que... Até mesmo uma pessoa boa pode ser tornar um assassino, e até mesmo o assassino mais cruel pode merecer perdão pelo seu erro. O que você fez Math foi para proteger seus amigos, ainda que não tivesse intenção seu erro não vai desaparecer, mas você não acha que a filha daquele mesmo Caçador, não vai entendê-lo se você pedir desculpas? – com uma enchente de lágrimas Math assente balançando a cabeça expressivamente, ele sorri e enquanto limpa suas lágrimas freneticamente com suas mãos, olhando nos olhos do ruivo com gratidão, a vista ainda embaçada pelas lágrimas ele abraça o príncipe e agradece pela ajuda.

  Com o peito mais leve, o coração mais brando e o medo em seu corpo indo embora... Math chora por mais algum tempo, a cabeça deitada no colo de Lucinda, que o ouvia enquanto ele dizia baixo que se sentia bem melhor e que pediria perdão a Grace assim que ela acordasse. A castanha acariciando seu cabelo o deixando sonolento, até que pacificamente, Math dorme no colo da sua Lucinda.