Titânio

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Dias depois

Ruggero

Quando pedi Belinda em casamento comprei um apartamento que ficava ligeiramente longe da delegacia.
Ali seria o nosso refúgio, principalmente nas nossas folgas, afinal merecíamos respirar bem distante daquela loucura em que vivíamos diariamente.

Não era um lugar muito grande, mas me lembro de ouvi-la soltar um gritinho assim que passou pela porta, repetindo várias vezes que aquele era seu sonho. Ela não queria nada extravagante e no meio do vai e vem da cidade. Não. Assim como eu, a minha Bel amava a tranqüilidade de um lugar afastado, silencioso e sem espaços para problemas.

Tínhamos a nossa própria fortaleza.

O problema é que quando ela se foi, aquele lugar deixou de ser um bote salva-vidas e se tornou uma trincheira aonde eu me escondia quando a guerra dentro de mim começava.

Os móveis eu vendi. Os objetos dela, doei. Não sobrou nada.

Quer dizer...

Havia as telas que eu pintava, mas estavam todas inacabadas. Os desenhos tinham traços do passado e o olhar dela em um dos quadros me arrastava para mais e mais dor, então joguei um lençol em cima de todos eles e coloquei no lixo as tintas, os lápis. Tudo.

O apartamento era um breu total.

Mandei que cortassem a luz, mas pedi que religassem a água. Continuei pagando o aluguel, mesmo que ninguém estivesse por lá.
No fundo, lá no fundo mesmo, era uma forma de não soltar o passado.

Mas...

Como diz um personagem que eu adoro em um seriado: Não importa o quão forte seguremos o passado, pois ele já foi.

─ Mas eu não quero que você se vá... ─ Balbuciei para o quadro coberto, sabendo que ali embaixo jazia um desenho dela.

O último que fiz.

Soltei o ar pela boca e meu corpo inteiro estremeceu.

Eu tinha seguido o conselho do Michael, mas não no sentido literal, porque não sai da cidade. E não que Margô soubesse disso, porque eu menti para ela. Apenas expliquei que precisava de um tempo fora e garanti que tudo ficaria bem; mas na verdade nada mudou. Nenhum pensamento se clareou, tampouco consegui me entender.

Tudo só se embaralhava mais na minha cabeça.

Fiquei trancado naquele apartamento escuro por dias e tudo o que consegui foi ter pesadelos e...

Não.

Aquilo não podia ser saudade. Não se pode ter saudade de quem mal se conhece.

Eu não sabia nada sobre ela.

E mesmo que tenhamos dividido um bolo de chocolate e ela tenha adormecido encostada no meu ombro isso, literalmente, não quer dizer nada.
Foi apenas uma situação embaraçosa.

Ela adormeceu, eu a coloquei no colo e a levei até o quarto. Apenas isso.

E no dia seguinte sai de casa e não voltei.

Duas semanas e meia. Duas semanas e meia e um milhão de dúvidas.

─ Becca... ─ Li em voz alta quando meu celular começou a vibrar com uma mensagem dela.

Eu a tinha encontrado numa noite dessas e pensei que colocar para fora o meu desejo reprimido me ajudaria, mas parece que só piorou.

No segundo seguinte o aparelho tocou. Era ela.

À Prova de BalasUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum