Lembretes

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Ruggero

─ Você está horrível.

Fiz uma careta para o meu amigo e perguntei se podia entrar. 

Eu não tinha como desmentir suas palavras. Meu rosto provavelmente demonstrava toda a péssima energia que me rodeava, além do cansaço severo que corroía tudo em mim.

Não voltei para a casa, tampouco consegui falar com o Blaine na delegacia.

Passei a noite inteira rodando com o carro pela cidade, sem saber para onde ir, com medo de voltar ao apartamento e dar de cara com sentimentos que não sei lidar – que não quero lidar, na verdade.
Eu simplesmente não sabia o que fazer.

Por isso assim que o dia amanheceu, dirigi até a casa do Michael e encontrei Jeff saindo.
Era até melhor falar apenas com o meu amigo, porque apesar do marido dele ser um cara incrível, ele não me entendia como Mike era capaz.

─ O Jeff foi trabalhar. ─ Comentei casualmente, jogando-me no sofá. ─ Eu o vi tirando o carro da garagem.

Michael empurrou meus pés que estavam em cima das almofadas e me mandou retirar as botas para não sujar tudo; então foi se sentar na mesinha de centro, de frente para mim.

Sua cara de preocupação era evidente.

─ Ele disse que ia passar na mansão e remanejar uns trabalhadores, depois vai tomar café com a Margô. Acho que é a manhã das fofocas, ou algo do tipo. ─ Deu de ombros, rindo.

Era só falar no marido e ele ria automaticamente.

─ Ótimo. Posso ficar aqui até escurecer? Não quero voltar pra casa de dia. ─ Bocejei e massageei as têmporas. ─ A minha cabeça está fervendo. Não posso voltar lá e ver...

─ A moça que você inventou de seduzir?

Rolei os olhos.

─ A maluca é mais inteligente do que eu pensava.

Michael bufou.

─ Não me diga que ela descobriu tudo?!

Nem respondi. Ele não precisava de uma confirmação minha.

Infelizmente sua gargalhada não tinha freios e, de um momento para o outro, sua preocupação se esvaiu e se transformou em risadas histéricas e piadinhas sem graça, como se eu fosse um completo palhaço e sua maior diversão naquela manhã gelada de inicio de inverno.

Levantei do sofá e caminhei até o outro lado da sala, afastando as cortinas e fitando a natureza que acordava pouco a pouco.

Como sempre me surpreendi com tamanha capacidade daquele lugar em ser belo. Nem parecia que estávamos em NY.
A vida acontecia tão freneticamente lá fora, mas ali, naquele refúgio, tudo parecia calmo, correto e bom. Acalentava até a alma mais fodida – no caso, a minha.

Quando percebi que Mike estava parando de zoar com a porra da minha cara, girei nos calcanhares e o encarei.
Ele tinha que perceber que eu não estava para gracinhas.

Na verdade, tudo parecia estar desabando.

─ A sua sorte é que nem posso te prender por desacato. ─ Apontei para o coldre vazio na minha cintura. ─ Estou fora da corporação por tempo indeterminado.

Meu amigo mudou drasticamente de expressão. Ele parecia estupefato.

─ Você fora da polícia? Mas... como isso aconteceu? Eu devo estar delirando.

Abanei a cabeça.

─ O Blaine me chutou de lá. Até parece que eu sou moleque... ─ Cocei a cabeça, agoniado. ─ Ele quer que eu tenha completa certeza de que quero mesmo servir à polícia, enfim... Não sei o que deu na merda da cabeça dele.

À Prova de BalasOnde histórias criam vida. Descubra agora