No chão dois galões de tinta óleo branca estão com a tampas abertas. Sobre um deles um rolo grande e um pincel para as laterais. Caio já tinha avançado bastante, para ser honesto.
— Então... podemos começar.
Ele pega o rolo maior e volta ao seu trabalho em uma das pareces. A camisa manchada e algumas partes da pele também.
Pego o pincel menor e começo a dar um jeito no canto. Meu coração não se acalmou, pelo contrário, eu parecia a porra de um adolescente. Eu queria conversar, queria que ele falasse comigo. Engulo em seco e tento:
— Como estão as coisas no teatro? — os segundos que levam a respostas parecem eternos. Pensei na possibilidade dele não me responder, pensei que poderia ficar ali como um idiota com o pincel na mão e em silêncio.
— Bem, a Letícia tinha razão, Bernardo é um grande cara, sabe? A peça está caminhando, estamos em período de ensaio agora. Acho que você gostaria de ver, a galera da sonoplastia já falou de você, disse que conheciam uns trabalhos que você fez para a faculdade e... o que você tá olhando?
— Estou olhando você.
— Bom, olhe para o que está fazendo, por favor, você disse que queria ajudar.
Assinto e, a contra gosta, foco na minha tarefa entediante.
— Certo. Continue falando, o que disseram sobre mim?
— Um cara e uma garota já saíram contigo, perguntaram se eu ainda tenho seu contato, outros já trabalharam com você naquele curta metragem sobre a estação vazia de trem. Disseram que você é bom.
Ah... isso não é bom.
— Fico feliz em ouvir isso. A parte profissional, claro... eu, eu não tenho intenção de pegar o telefone de ninguém — gaguejo e tento coçar o queixo, sinto as cerdas do pincel tocando minha pele quando vejo que levantei a mão errada.
Que droga!
— Ok — É a resposta que recebo, mas meu tom de voz pouco firme o faz virar em minha direção. Se deparando com meu eu pateticamente manchado de tinta.
— Damien, tá tudo bem? Você tá esquisito.
— Estou?
— É, você tá com aquele olhar.
Franzo o cenho.
— Qual?
— O que eu não sei o que significa.
Pisco algumas vezes e volto a atenção ao canto que estava pintando, a vergonha de ser pego em flagrante me fazendo analisar precisamente a parece porque isso, claramente, era melhor do que encarar Caio agora.
Meu Deus, eu sempre fui assim?
Estendo a mão o mais alto que posso, tentando alcançar o pedaço alto da parece antes do rebaixado que estava ainda em amarelo, mas meu braço não chega até lá.
— Caio, você tem uma escada?
— Não, por que? Ah... — ele entende sem que eu precise dizer uma palavra sequer. Estendo a ele o pincel para cantos e digo:
— Vem me dar uma ajuda. — Caio franze o cenho quando pega o objeto em minhas mãos.
— Não me olhe com essa cara desconfiada — viro de costas e me agacho no chão, apoiando a mão na parede ainda seca. — Suba, vamos alcançar o canto superior.
Caio gargalha.— Nem fodendo.
— Caio, precisamos pintar é caso de vida ou morte.
Ignoro meu papel de idiota e espero. Eu sei o que o silêncio significa, ponderação, ele está considerando. Sorrio quando o ouço suspirar em derrota.
— Se me deixar cair eu te mato.
— Não confia em mim?
— Nem um pouco — Levando devagar com ele montado em minhas costas e o escuto dar uma risadinha quando alcança o objetivo. Espalmo a mão em suas coxas, segurando com firmeza, evitando pensar nas sensações que aquilo me causa. O peito dele grudado as minhas costas, as pernas enroladas em meu tronco. Não me lembro de tê-lo segurado assim antes e me arrependo imensamente de não ter feito parecido antes.
— Demore o tempo que quiser.
— Cala a boca, eu vou derrubar tinta.
Suas palavras são seguidas de gotas gordas de tinta branca, me encolho por um momento. Sinto Caio apertar as pernas ao meu redor.
— Acabei, quero descer.
Com cuidado ele escorrega por minhas costas e ouço o baque de seus pés tocando o chão. Me viro e o vejo bem de perto, os olhos grandes e castanhos ainda com o restinho do sorriso fornecido pela brincadeira.
O pequeno espaço que nos divide parece errado, parece pecaminoso, um insulto. Seria fácil acabar com ele, passar o polegar pela bochecha de maçãs proeminentes, bem em cima da tinha branca que respigara ali e então sussurrar as coisas que pareciam travar minha garganta.
"Você pensa em mim como antes?"
"Você me odeia?"
"O que você faria se eu te beijasse agora?"
— Damien, você tá fazendo de novo — a voz dele me traz de volta a realidade.
— O que?
— Aquele olhar.
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Oblíquo
Любовные романыCaio sabia, estar apaixonado era uma maldição que em nada parecia com filmes ou séries de TV onde tudo acaba em um lindo beijo cinematográfico, tudo o que ele conhecia depois de quatro anos amando em segredo seu melhor amigo, Damien, era a longa lis...
E se fosse verdade?
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