Capítulo 30

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    Domingo de manhã. Encaro o teto do meu quarto indecisa se me levanto ou não. Aos poucos, lembranças da noite de ontem surgem em minha mente o que faz eu querer permanecer em minha cama por mais algumas horas, ou até dias.

    Apesar de eu não ser uma apreciadora de bailes ou qualquer coisa que envolve música e muitas pessoas, ontem foi um tanto agradável e me senti confortável — tirando alguns acontecimentos inusitados —, e acho até que me fez bem sair um pouco da minha vida monótona. Decido por finalmente me levantar de minha cama e me dirijo até o banheiro e opto por tomar um banho gelado. Minha cabeça ainda está o maior rebuliço.

    Descendo as escadas, estranho ao ouvir vozes no andar de baixo, reconheço a risada de minha mãe. Chegando na cozinha, meu corpo paralisa ao ver Nathan em um dos bancos da bancada enquanto toma o que reconheci ser a vitamina de frutas que minha mãe faz quando tenta agradar alguém. Eu nem sei como ele consegue tomar aquilo, nada contra vitaminas de frutas, mas a que a minha mãe faz parece carregar meio kilo de açúcar, eu já avisei à ela sobre isso, mas a mesma parece não se importar. Mas é claro que ela não se importa, porque ela parece mais uma formiga, fanática por doces.

    Ao perceber minha presença, minha mãe olha para mim.

— Bom dia, querida — ela diz enquanto guarda um prato no armário.

— Bom dia — digo ainda estática na entrada da cozinha, aflita pela presença de Nathan. O que ele está fazendo aqui?

— Oi — ele diz assim que se vira para mim. Pisco algumas vezes, voltando a realidade.

— Oi. — Me aproximo do mesmo. — Por que você está aqui? — pergunto sentando no banco ao seu lado, tentando ao máximo espantar o nervosismo.

— Sua mãe meio que me trouxe — ele responde e sorri, me permitindo admirar a sua covinha solitária na bochecha. Franzi o cenho por sua resposta. — Eu estava no quintal com Charlie, aí ela apareceu e me convidou para tomar uma vitamina — acrescenta.

— Deixa eu adivinhar. Ela disse que essa vitamina é a especialidade dela? — digo apontando para o copo a sua frente.

     Nathan faz que sim com a cabeça e toma um gole da bebida. Seguro uma risada quando o mesmo faz uma leve careta ao tomar a bebida, mas ele logo disfarça.

— Está boa? — pergunto sorrindo de lado.

— Sim — ele diz com a voz falha e limpa a garganta.

— Seja sincero, isso está puro açúcar.

— Ei! Minha vitamina é muito boa, mocinha, você que tem essas frescuras de não gostar de nada — minha mãe diz aborrecida.

— Isso é muito açucarado. Vai que Nathan é diabético — digo cruzando os braços.

— Se ele fosse, ele falaria. — Ela termina de guardar a última louça. — E ele gostou da vitamina. Não gostou? — ela pergunta para Nathan.

— Gostei sim — Nathan diz apreensivo, dando um sorriso forçado. Falso.

— Está bem. Eu vou ficar com meu bom e totalmente equilibrado café — digo e pego a cafeteira em cima do balcão e uma xícara.

    Minha mãe sai da cozinha e vai para seu escritório, apesar de ela folgar aos domingos, mesmo assim ela decide resolver alguns assuntos do trabalho em casa. Olho para Nathan que faz outra careta ao bebericar a vitamina. Sorrio negando com a cabeça, pego um copo e vou até a geladeira, servindo água no mesmo. Sento novamente no banco e deposito o copo na frente de Nathan. Ele me encara franzindo o cenho.

— Só achei que você quisesse um pouco de água. Se não, não vai conseguir apreciar mais essa bebida na qual você adorou tanto — digo ironicamente e o mesmo sorri.

— Obrigado. — Ele pega o copo e bebe toda a água sem intervalos.

— Você não gostou, né? — pergunto. Nathan olha ao redor para certificar se minha mãe não estava por perto, e diz em voz baixa.

— Nem um pouquinho. Não gosto de vitaminas.

— Então por que aceitou? — Bebo um gole do meu café e pego alguns cookies em uma tijela. Nathan agora encara o copo de água vazio.

— Por... porque sua mãe disse que era a sua vitamina favorita, então eu tive curiosidade em experimentar. Achei que fosse um tipo de vitamina diferente — ele diz tudo sem me encarar.

— Bom, é uma vitamina diferente, de fato, mas essa não é a minha vitamina favorita. Acho que nem tenho uma — digo e demos risadas. Estendo a tijela de cookies para Nathan. Ele nega com a cabeça.

— Acho que vou ficar longe de coisas açucaradas por um bom tempo.

— É porque não experimentou o pudim de chocolate que ela faz. Aí sim, você iria ter aversão a doces, por quase um ano — digo de boca cheia e Nathan sorri.

    Durante um minuto, um silêncio tomou conta da cozinha. Eu gostaria de falar com ele sobre a nossa dança, gostaria de saber se ele gostou tanto quanto eu. Gostaria de perguntar por que o seu coração estava batendo tão acelerado. Gostaria de perguntar se ele teve as mesmas sensações que eu. Sensações essas que eu tento a todo custo ignorar.

    É nítido para mim que Nathan me carrega para um turbilhão de sentimentos, sentimentos esses que pareceram surgir de uma hora para outra. E a falta da minha compreensão com relação a esses sentimentos, faz me questionar sobre tudo. Por que agora a sua presença de certa forma me deixa desconcertada? Por que quando conversamos e sorrimos juntos, me sinto tão calma como se eu pudesse passar o dia inteiro em sua companhia? Por que tudo ao mesmo tempo parece complicado e simples demais? Por que esse garoto tem que estar em quase todas as coisas que eu penso?

— Como você e Sophie fizeram aquela surpresa para o baile? — Nathan quebra o silêncio. Nos encaramos.

— Usamos alguns projetores holográfico.

— Isso é bem legal. Ficou muito bonito no baile. Era como se estivéssemos no Espaço.

— Essa era a intenção.

— Chiara, você... — Nathan começa a dizer, mas não completa, e endireita a postura.

— O que? — pergunto para que o mesmo continuasse. Ele suspira.

— Nada, não é nada demais. — Nathan se levanta do banco. — Eu vou para minha casa — ele diz cabisbaixo, dando um sorriso mínimo. Aconteceu alguma coisa? Me levanto também do banco e paro em sua frente.

— Você está bem? — pergunto me aproximando mais de Nathan. Ele me encara, e eu o encaro, seus olhos percorrendo o meu rosto.

    Nathan se aproxima mais de mim, fazendo-nos ficar a poucos centímetros de distância, nossos corpos quase colados. Sua boca está entreaberta e por um momento penso que ele vai me beijar, e por um momento desejo que ele me beije. Por um momento desejo quebrar a distância entre nós. Minha respiração começa a se tornar descompassada e minhas mãos tremem. Mas ele apenas balança de leve a cabeça em negação apertando os olhos com certa força.

— Estou bem. — Ele se afasta. — Só tenho que ajudar meu pai em uma coisa.

— Ah... sim — digo atordoada. — Eu o acompanho até a porta. — Nathan apenas concorda com a cabeça, sem me encarar.

    Abro a porta, Nathan para quando já estava saindo, na escada da entrada, ele se vira para mim, abre a boca parecendo querer dizer algo, mas a fecha e sorri forçado.

— Tchau — é a única coisa que ele diz antes de voltar para sua casa.

— Tchau — digo e respiro fundo.

Pelos Caminhos Do Seu Coração Where stories live. Discover now