Capítulo 15 - Orgulho e Preserverança

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Há dois dias, quando estava na cozinha a aquecer leite e a fazer torradas para mim e para a minha irmã Mia, vi o meu irmão chegar com alguns packs de cerveja. Embora o meu olhar desaprovador nunca deixasse os seus próprios olhos e ele nunca tenha desviado o seu próprio olhar, respondeu à Mia quando ela o cumprimentou.

“Olá, John.”

“Olá, Mia.”

Senti todos os músculos do meu maxilar ficarem tensos. Odiava este ambiente. A minha irmã havia-o cumprimentado a medo, com cuidado, quase como a testar o próprio terreno. Ela já o tinha visto bêbado. Ele, por sua vez, havia-a cumprimentado de uma forma fria, com uma voz quase vazia e uns olhos que ao invés de a olharem com delicadeza e simpatia, colavam-se a mim com uma expressão vazia ou até zangada.

“A Abby está a fazer torradas.” Anuciou ela, sorrindo à medida que apontava para mim. “Queres algumas?”

“Ele sabe fazer as suas próprias torradas, Mia.” Disse, procurando soar menos severa do que acabei por soar. “Para além disso, eu tenho de subir. Como lá em cima.” Afirmei, dando-lhe um beijinho na testa e pegando numa torrada com manteiga, num guardanapo e num copo de leite. Assim que subia as escadas pude ouvir as garrafas chocarem umas com as outras à medida que o John as colocava no frigorífico.

“Vais fazer torradas? Podes comer as minhas, eu só quero um bocadinho.” Questionava ela, com uma voz de criança inconfundível. Eu ainda achava que ela soava mais adulta do que a maioria das crianças da sua idade. Ouvi o riso do John. Isso era raro…

“Não, come-as. Eu só quero bolachas.” E, com isto, ouvi um banco a arrastar-se lá em baixo e fechei a porta do quarto. Suspirei.

Não sei bem porque agia desta forma. Não é que evitá-lo fosse ajudar a sua situação de forma alguma mas eu tinha de arranjar maneira de conseguir demonstrar o quanto eu desprezava as suas novas opções. Sim, porque ele havia de facto decidido beber. E havia decidido beber muito; demais. Talvez agora ele já não tivesse controlo, talvez agora fosse um vício. Mas ainda assim havia sido uma escolha dele – foi por aí que tudo começou.

Agora, as consequências do seu vício pareciam espalhar-se pelas paredes da casa como se fossem puro veneno e adulteravam por completo as relações que tínhamos uns com os outros. Todos estavam a senti-lo na própria pele e era tudo culpa dele.

Suspirando, pousei o tabuleiro com a ceia na secretária e sentei-me em frente ao computador. Assim que bebi um golo de leite, os meus olhos encontraram um papel do qual já me tinha esquecido. Era o papel que tinha o número desconhecido, colocado proprositadamente na minha mala. Esquecia-me continuamente da sua existência. Não era o tipo de rapariga que ligava muito a estas coisas. Preferia contacto cara a cara e se este anónimo nem tinha sequer coragem de me dar o número às claras, eu não estava minimamente interessada.

Abanei a cabeça. Era assim tão difícil dar o número a alguém? Talvez não fosse. Provavelmente dependia desse “alguém”. Sentindo que estava a pensar demasiado sobre este estúpido pedaço de papel, amarfanhei-o e atirei-o para o lixo.

Assim que o fazia, o meu telemóvel vibrou. Com as sobrancelhas franzidas, peguei nele e, verificando que era uma chamada de um número desconhecido, atendi.

“Abby?” alguém questionou. “Hum… É este o número de telemóvel da Abby Walker?” Um ruído estranho escapou da minha garganta. Era o aborrecimento que chegava com a identificação da voz.

“Okay, agora já sei que és tu.” Murmurou ele. “Obviamente, tu já reconheces-te a minha voz mas caso ainda não o tenhas feito… eu só queria pedir desculpa por te ter dado a mão à hora de almoço…”

Peripécias da Vida de AbbyWhere stories live. Discover now