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Já está de madrugada, e o movimento nas ruas de São Paulo se resumem a bêbados, drogados, aos perdidos e aos que acreditam que hoje é um bom dia para procurar por diversão. O carro de Gustavo já não anda mais a uma velocidade inaceitável – ele desistiu quando percebeu que seria muito mais difícil encontrar uma agulha num palheiro. O bairro do limão é vasto, e ele não faz a menor ideia de onde procurar.

Passaram pelas principais avenidas, entraram em diversas ruas menores, mais residenciais, mas ele não encontrou o carro que viu sair da rua na Lapa. Ele está quase aceitando que deve esperar que o irmão de Alberto e a polícia façam seu trabalho e a encontre com vida.

— Cara, a gente já passou por essa rua... estamos andando em círculo nessa merda — Alberto olha para os lados, xingando e procurando por algo que Gustavo não sabe o que é. Será que ele espera que Melinda coloque uma placa de "estou aqui"?

—  Eu sei, Alberto, mas não sei mais o que fazer. Você quer voltar para o apartamento? É do outro lado da cidade. Aqui estaremos perto de Melinda...

— Você não sabe mesmo, Larissa? Já conhecia ela quando namorava o filho da puta. Ela nunca te disse nada? — Alberto parece ter incorporado o irmão policial, e faz a mesma pergunta pela décima vez à Larissa, que continua no banco traseiro, chorando silenciosamente.

— Já te falei que não! Ele sabia muito bem o que eu pensava dele... nunca me convidou para vir aqui. Eu nem sei se ele morava aqui mesmo. A Glória pode estar louca. Ou protegendo ele.

Gustavo já pensou nessa possibilidade, mas quer acreditar no bem que as pessoas têm dentro de si, e que a avó dele queira proteger uma pessoa inocente, ao invés de seu neto psicopata. Assim como ele estava acreditando no bem que Alberto pode ter dentro de si, mesmo sendo um extremo babaca.

— Não consigo mais falar com o Miguel também... mas ele disse que não sabia nada sobre o lugar onde ele morava. Foi quando ele morou fora do país, só voltou logo antes de Melinda terminar seu namoro com ele. Ele disse que provavelmente os pais deles saibam... mas não sei você, Gustavo, eu não tô a fim de ir incomodar duas pessoas hospitalizadas e contar que sua filha foi sequestrada... de novo.

Ele também não estava disposto a colocar os pais dela nessa situação. O melhor é continuar procurando e rezar para algum milagre acontecer. A maior parte das luzes nas casas estão apagadas, as pessoas normais vivendo suas vidas normais – enquanto que o pesadelo de Melinda toma forma logo ao lado.

Gustavo para o carro, impaciente. Não consegue aceitar que não existe nada a ser feito. Alguma coisa deve ser feita, alguma pista deve ter sido dada. Mas ele não consegue pensar direito. Não consegue descobrir um único detalhe que possa fazer com que ele a ajude.

Seu telefone toca e ele o pega nervosamente, as mãos tremendo, mas se decepciona quando vê a imagem da mãe. Gustavo fica dividido, seu ressentimento por ela ainda forte. Como esquecer a maneira como ela tratou Melinda? Como suportar, ou sequer aceitar que ela decidiu, seguindo apenas o que Vó Neide tinha a dizer, baseado em sonhos e vidas passadas, que Melinda não merecia estar ao lado de Gustavo?

Mas está muito tarde, então algo de errado poderia estar acontecendo com seu pai ou sua irmã.

— Alô — Gustavo deixa sua voz neutra, e os outros ocupantes do carro param subitamente de falar para prestar atenção na ligação.

Filho... sou eu. Está tudo bem com você? — a voz de Olívia está um pouco histérica e Gustavo fecha os olhos. Como ela saberia que algo está errado?

Mas pensando bem... sim... ela saberia se estivesse com Vó Neide.

— Eu estou bem, mãe. O que você quer? Não posso falar no momento — ele não quer perder tempo com ela, quer apenas continuar a procurar por Melinda.

A Chance do TempoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora