Luísa:
- Só pode ser brincadeira. - Falei baixo, mas todos ouviram e me olharam.
- Não vai me parabenizar, Ana?
- Parabéns pelo trabalho. - Ela disse sorrindo de lado e se aproximou de mim. - Mas nossa comemoração é algo pessoal.
- Estão me dispensando? Nossa... - Ela levou a mão ao peito fingindo que ficou magoada.
- Não entendeu ou quer que a gente desenhe? - Raquel disse tomando a frente, mas Cecí segurou ela pelo braço.
- Tudo bem, tudo bem! - Ela ergueu as mãos. - Nós vamos nos encontrar na faculdade, então até próxima semana.
Maya se retirou da área em que estávamos e eu coloquei a taça sobre a mesa.
- Vou ao banheiro. - Saí andando e desci as escadas até o banheiro do restaurante.
Fiz xixi e quando saí da cabine, Ana estava encostada na pia do banheiro.
- Tudo bem com você? - Questionou.
- Só vim fazer xixi. - Sorri de lado e lavei as mãos.
- Eu não sabia que tinha rolado seleção de professores, nem que ela estava aqui.
- Eu confio em você, acredito mesmo, só não vou com a cara dela.
- Vem cá. - Me aproximei dela e Ana segurou minha cintura, colou nossos corpos e me deu um selinho demorado. - Não vamos deixar ela acabar com nada que envolva a gente.
- Por mim ela nem existiria. - Ana riu e me deu mais um selinho.
- Vamos contar a novidade para aqueles loucos?
- Sim, do jeito que ensaiamos.
Voltamos para o local e eles estavam bebendo e conversando.
- E aí, mataram a Maya? - Cecí perguntou.
- Não ligamos para ela. - Balancei os ombros e Ana piscou para a amiga. - Aliás, temos uma coisinha pra contar.
- O que?
- Na verdade é um pequeno erro que deu no escritório. - Ana sorriu amarelo e todos lhe encararam. - Esquecemos de reservar uma sala.
- Pensei que estivesse tudo correto, Ana. De quem é a outra sala? - Fernando disse colocando a taça na mesa, sentando na cadeira e apoiando os cotovelos nas pernas.
- Daqui uns meses uma pessoa vai chegar e vai ter que entrar em nossas vidas, inclusive na rotina do escritório.
- Puta merda, quem tu trouxe da Espanha? - Raquel disse colocando a taça ao lado da taça de Fernando.
- Ela é brasileira, pequenininha e até agora tem apenas dois meses. - Falei sorrindo e Ana passou a mão na minha barriga.
Os três ficaram nos encarando por uns segundos com cara de idiota, mas Fernando foi o primeiro a falar algo.
- Sério?!
- Eu vou madrinha! - Raquel disse com lágrima nos olhos e correu para me abraçar.
Senti os braços de Cecí em seguida e quanto me afastei, Fernando me abraçou.
- Como foi isso?! - Cecí perguntou ainda sorridente e encarando minha barriga discreta.
- Após a lua-de-mel.
- Ana, você é... - Fernando perguntou encarando a calça de Ana, ela riu e lhe mostrou o dedo do meio.
- Pagamos tratamento in vitro, Luísa fez o procedimento e agora estamos grávidas.
- Estamos? Você também? - Raquel continuava em choque.
- Não, modo de falar.
- Estou tão feliz! - Ela comentou e abraçou a irmã. - Qual o nome?
- Nem sabemos o sexo, imagina o nome. Também não pensamos em nenhum nome.
- Eu lembro que quando Ana era criança, era louca por gêmeos e dizia que queria muito ter gêmeos para vestir igual. - Raquel falou revirando os olhos e rindo. - Então eu disse que iria vir mais que dois.
- Vire sua bora pra lá! - Ana disse sentando e a imitei.
- Imagina trigêmeos correndo atrás de Ana, meu Deus! "Mamãe, mamãe, mamãe!" - Todos riram, inclusive minha mulher.
- Isso vai virar praga. - Fer falou.
- Espero que não. Somos mães de primeira viagem. - Falei segurando a mão dela e sorrindo de lado.
Ficamos o restante da noite conversando e comendo. Ana e eu retornamos para casa e logo adormecemos.
Os dias foram passando. O escritório havia sido inaugurado e obviamente funcionando. Por Fernando fazer uma grande divulgação, algumas pessoas já estavam procurando. Eu ficava pelo período da tarde junto com Ana e Fernando. Pela manhã Raquel e Cecília (algumas vezes) ficavam com estagiários.
A maioria dos estagiários eram da nossa faculdade, então facilitava ainda mais o trabalho, colocamos até para atender algumas vezes.
Maya realmente havia começado a lecionar em uma cadeira de Direito do Trabalho e isso me irritava, visto que eu estava com outra área e não a que eu queria, mas Direito Penal ainda é bom.
Maya lecionava pela manhã e noite, então algumas vezes eu ficava enciumada com isso, pois pela noite eu estava no mestrado e Ana no bloco com ela, então a louca poderia tentar qualquer coisa.
Minha barriga já estava ficando em evidência, estava com quase três meses e com as roupas mais coladas de escritório, elas ficava marcada. Senti alguns olhares de alunos do mestrado e até de Roberta, mas fingi que não vi. Joyce estava animada com minha gravidez e me passava até a ideia de alguns nomes.
- Você sabia que já dá para ver o sexo, né?
- Sim, amanhã vou fazer uma nova ultrassom, talvez a gente saiba, vai depender da posição.
- Quantas ultra-sons você já fez?
- Apenas uma, não consegui fazer no mês passado por causa da correria do escritório.
- Está com três meses, né? - Assenti. - Acho que sua barriga está evidente demais para três meses.
- Joy, eu já tinha barriga, né? Cerveja, sanduíche e pizza...
- Nunca pensou em gêmeos?
- Vire a boca pra lá, Joyce. Queremos um, não vamos ter capacidade para cuidar de três.
- As meninas querem dividir o assunto com a turma? - Roberta parou a aula e perguntou a nós.
Os olhares de todos bateram em mim e Joyce, fiquei nervosa e Joyce deu uma risadinha.
- Estávamos falando da ultrassom da Luísa, ela vai descobrir o sexo do bebê amanhã, mas agora que já fui atualizada das informações, pode retomar a aula sem conversa. - Joyce falou e eu quis enfiar a cabeça em um buraco.
Roberta me encarou e depois de alguns segundos, voltou a dar aula.
O restante da aula fiquei olhando Roberta, mas viajei pensando em outras coisas. Quando terminou a aula, peguei o carro e fui logo para casa. Tomei um banho, comi alguma besteira e fui deitar.
Quando Ana chegou, eu já estava cochilando. Ela beijou meu rosto e foi para o banheiro, depois disso vi mais nada.
***
Na sexta, acordei com Ana beijando minha barriga.
- Bom dia, meu amor! - Ela disse subindo e me dando um beijo.
- Estou com sono... - Reclamei.
- Normal, sabe que a médica disse. - Assenti. - Vamos? Temos que dar aula e depois vamos pra consulta.
- Estou com fome.
- Vou preparar nosso café enquanto você toma banho.
- Certo.
Levantei com bastante esforço. Tomei banho, coloquei um macacão que batia abaixo do joelho e fui para a cozinha. Ana tinha feito misto quente, panqueca e suco.
- Vou tomar banho e já venho.
- Vou te esperar.
Ana sorriu e foi para o quarto. Fiquei beliscando meu misto quente até que ela voltou e eu comi o restante. Pegamos nossas coisas e fomos para a faculdade em um único carro.
- Mamãe quer jantar com a gente. - Avisei quando vi a mensagem no celular enquanto ela dirigia.
- Lá em casa?
- Não, ela disse que vai fazer um jantar na casa dela. Pode ser?
- Claro, confirme.
Confirmei o horário com mamãe e logo chegamos na universidade. Ana foi para o Tutorial e eu fui dar a primeira aula do dia.
Os alunos estavam conversando demais e não se concentravam direito. O ruim de dar aula para alguns alunos de 18 anos é que muitos saem do colégio e já entram em universidade particular, então não tem maturidade suficiente para se calar e prestar atenção em aula importante que vai ajuda-los profissionalmente.
Terminei a aula, fiz a chamada e fui esperar a aula seguinte na sala dos professores. Estava no notebook organizando algumas questões para as provas quando Maya entrou rindo com Ana. Olhei de relance e voltei a encarar a tela, tentando nem dar cabimento.
- Luísa, o convite do meu casamento. - Uma professora de Processo sentou ao meu lado e me entregou o convite. - Dentro tem seu exibível e o de Ana.
- Obrigada. - Ela sorriu e levantou.
Quando voltei a encarar o computador, Ana estava entregando um copo de café para Maya. Revirei os olhos, olhei a hora e baixei a tela do notebook, guardei na bolsa e saí da sala pisando firme com meu salto.
- Bom dia. - Falei para as duas e saí da secretária.
Subi a rampa sem nem checar meu celular que vibrava com várias mensagens. Cheguei na sala e mais uma vez o barulho dos alunos. Estava ficando com dor de cabeça, olhei a lousa anotada ainda da primeira aula e comecei a dar uma aula diferente, buscando trazer a atenção para mim.
Quando finalizei, permaneci na sala para dar logo a última aula da manhã. Quando terminou, desci a rampa e fiquei sentada numa mesa do hall do bloco, enquanto esperava Ana se tocar do horário da consulta.
- Já ia atrás de você, esqueceu da consulta? - Ana disse quando me encarou no hall.
- Sua conversa com ela acabou? Ou ainda estão trocando histórias?
Ana olhou para alguns alunos do hall e me encarou.
- Estou indo para o carro. - Levantei.
- Vou buscar minha bolsa.
Segui para o estacionamento e Ana chegou um minuto depois destravando o carro. Entrei no passageiro e ela no motorista. Ela jogou a bolsa no banco de trás e afivelou o cinto.
- Vocês ficam rindo sempre que estou longe?
- Amor, você estava na sala.
- Uhum.
- Já almoçou?
- Só quero fazer essa consulta e ir para casa. Não irei ao escritório hoje.
- Luísa...
Fiquei calada e ela dirigiu até o consultório. Esperamos por uns vinte minutos, ambas caladas e mexendo no celular. A médica chamou e fomos para a sala.
- Vista aquela bata azul. - Ela apontou e eu fui ao banheiro vestir.
Deitei na cama alta e Ana ficou ao meu lado. Ela passou o gel frio na minha barriga e espalhou. Quando o monitor mostrou um bebê, meu coração acelerou e encheu-se de lágrimas. Senti a mão de Ana segurar a minha e apertei.
A médica continuou espalhando o gel com a máquina pequena.
- São quantas semanas?
- Doze.
- Três meses, né? Sua barriga está em tamanho normal para dois. - Ela sorriu e continuou a espalhar.
- Dois não, três meses. - Ana corrigiu.
- Não, são gêmeos.
- Gêmeos?! - Falamos em uníssono.
- Não sabiam? São dois bebês! - Ela mostrou cada um. - E aqui tem alguma coisa, mas um está no meio.
- Como assim?
- Pode ter outro bebê aqui atrás, mas não é certeza. Em outra ultrassom podemos confirmar.
- Nã-não! Amor, não tem condição de ser trigêmeos. - Ana disse nervosa e apertando minha mão.
- Calma, vamos focar em gêmeos. Esse é certeza. - A médica riu.
- Vou ficar enorme! - Resmunguei.
- E linda. - Ela me deu um selinho. - Dá pra saber o sexo?
- Está vendo aqui e aqui? - Ela apontou. - São dois meninos. Parabéns! Mesma placenta, são idênticos.
- Meu pai amado! - Ana colocou a mão no coração e acabei rindo. - Seremos mães de gêmeos!
- Estou ansiosa para conhece-los.
- Vou deixa-las a sós. - A médica desligou o visor, acendeu a luz e saiu.
Me sentei na cama e ela sentou ao lado, beijou minha boca e me abraçou.
- Não podia ser melhor que isso.
- Eu te amo. - Meus olhos encheram-se de lágrimas mais uma vez e ela me abraçou forte.
- Vamos escolher os nomes, montar o quarto e esperar a chegada deles para daqui uns seis meses.
Depois de conversar mais com a médica, deixamos o consultório e fomos almoçar no restaurante favorito de Ana, e agora meu.
- Desculpa pelo ciúmes. - Falei sem graça.
- Seus hormônios estão diferentes, eu super entendo. - Ela segurou minha mão e sorriu. - Eu te amo, sabe que apenas sou simpática com ela.
- Aham, tudo bem.
Ficamos conversando, comemos e fomos embora, direto para casa, não iríamos nem ao escritório. Passamos a tarde inteira vendo filme e quando anoiteceu fomos para casa de minha mãe.
- Não é uma loucura? Gêmeos? Não teríamos que ter algo na família para facilitar? - Ana perguntou.
- Sim, mas ninguém na minha família tem.
- Vamos tirar a dúvida. Sua mãe sabe? - Neguei. - Vamos fazer uma surpresa.
Quando chegamos, Ana contou toda animada que seriam dois netos e minha mãe ficou enlouquecendo.
- Já escolheram o nome?!
- Não, vai ser um longo processo. - Ana disse sentando na mesa de jantar.
- Queria Francisgleydson e Francisgládson, mas negaram. - Falei revirando os olhos e mamãe riu.
- Até sua mãe acha uma piada!
- Sabia que seu pai era gêmeo, né? Só que o irmão dele morreu quando ainda era pequeno, acho que três anos. E o seu avô paterno era gêmeo também, mas não cheguei a conhecer nenhum dos dois.
Arregalei os olhos para Ana, que riu.
- Está aí porque engravidou de gêmeos. - Ana disse rindo.
- Vou ficar enorme demais. - Resmunguei.
- Pare com isso, ficará linda. - Ana beijou meu rosto.
- Fora que a médica disse que tinha algo, pode ser trigêmeos... - Falei.
- Meu Deus, vocês com três bebês? - Mamãe disse de olhos arregalados. - Deus, por favor, ajude essas duas.
- A senhora vai ajudar, né? - Perguntei e ela negou.
- Não, responsabilidade de vocês, posso ajudar vez ou outra, mas direto não. Precisam criar responsabilidade.
Assenti e fiquei em silêncio. Ana beijou meu rosto e sussurrou: "Vamos conseguir, amor".
Depois do jantar, voltamos para casa e ficamos coladinhas. No sábado, arrumamos a casa, preparamos o almoço e fomos ao shopping ver algum filme.
- Estou com fome. - Falei assim que entramos no shopping.
- Você acabou de almoçar em casa.
- Seus filhos estão pedindo comida, Ana.
- E o que ele quer?
- Doce.
Ela me puxou até uma doceria.
- Escolha.
- Quero dois brownies, um frozen iogurte com chocolate e uma paleta mexicana. - Falei pra mulher e Ana arregalou os olhos.
- E você? - A vendedora perguntou a Ana.
- Eu comerei com ela.
- Nada disso, isso tudo é meu.
- Minha nossa senhora... - Ana disse e pediu apenas um brownie.
Pagamos e ficamos ao lado esperando, abri logo um brownie e comi.
- Não acredito... - Ana disse e acompanhei seu olhar, era Roberta e Maya de mãos dadas.
- Maya é casada, né?
- Divorciou e voltou ao Brasil, os filhos ficaram.
As duas nos viram e vieram até nos, sorridentes.
- Oi, desejo de doce? - Maya perguntou encarando minha barriga.
- Sim, uma pena que o azedo chegou primeiro.
Ana me deu um beliscão por debaixo da blusa.