Azul Profundo ( Livro 1 Série...

By PriscillaaFerreira

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ATENÇÃO! PLÁGIO É CRIME, Livro devidamente registrado junto a Biblioteca Nacional. Violar direito autoral: P... More

Sinopse
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Agradecimentos

Capítulo 4

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By PriscillaaFerreira


Gustavo

Quando abro a porta do quarto que meu pai está internado, a minha primeira reação é ficar em choque com o que vejo. O homem deitado na cama está totalmente diferente da imagem que recordava do meu pai. Nas minhas lembranças ele era grande, mais ou menos do meu tamanho, talvez até mais alto, com corpo forte e bem construído e cabelos escuros iguais os meus.

Na verdade eu me pareço muito com o homem que ele foi anos atrás. Só um único detalhe, puxei os olhos castanhos da minha mãe. Meu pai tem os olhos azuis escuros, tão intensos que parecem um oceano. Lembro-me que quando eu era pequeno e estava aprontando, só bastava um olhar recriminatório do meu pai pra eu saber que estava encrencado, ele nunca nos batia ou gritava com a gente, era só preciso olhar com aqueles olhos duros e sabíamos que depois teríamos que nos explicar sobre o nosso comportamento. Isso servia.

Éramos quatro crianças traquinas e saudáveis que corriam pela casa toda, mas que sempre sabíamos ser educados quando necessário. Afasto o pensamento da minha infância pra não me trazer mais dor e aproximo-me da cama, a cada passo que dou meu coração pula mais acelerado contra minha caixa torácica, olho mais de perto pra ele.

Eu poderia até pensar que a recepcionista me indicou o quarto errado, que este homem não é o meu pai, mas assim que olho pra aqueles olhos azuis em forma de oceano eu tenho certeza, esse é o meu pai.

O homem que nos abandonou. O herói que de uma hora para outra se transformou em vilão. O homem que eu amei um dia como se ele fosse alguém imbatível, incapaz de fazer qualquer mal.
Meu pai está conectado a duas intravenosas, um tubo de respiração no nariz, e uma máquina que não sei o que é apita a todo instante.

A sua pele está esverdeada e seca, o seu corpo está cadavérico, ossos salientes sobe a pele ressecada, o rosto abatido coberto de uma barba cinzenta e profundas olheiras embaixo dos olhos. Com certeza, ele tem a aparência de alguém muito doente, quando me falaram que ele estava entre a vida e a morte não mentiram.

Limpo a garganta criando coragem e pensando em como vou começar a questioná-lo sobre o passado. Respiro fundo e faço a pergunta mais difícil que já fiz a alguém.

— Lembra-se de mim? – pergunto lançando um olhar cético em sua direção enquanto ele me encara como se não pudesse crer que sou real.

Meu pai afasta o tubo do rosto, olha nos meus olhos.

— Sim filho, nunca me esqueci de você... Nenhum dia sequer. – sua voz está rouca e fraca. Ouvi-la novamente depois de tantos anos me deixa completamente consternado.

— O quê? - pergunto irritado. Esse cara só pode estar de brincadeira com a minha cara.

— Filho, nunca me esqueceria de vocês, estou tão feliz que você está aqui. Esperei tanto pra lhe ver.

Dou um sorriso amarelo, tentando entender qual a sua intenção.

— Você ficou louco ou o quê? Você nos abandona por todos esses anos e agora vem dizer que nunca se esqueceu de mim e dos meus irmãos? Eu não sou idiota. Pode cortar a conversa fiada agora mesmo.

— Eu sei que você não é idiota filho, e fico feliz por isso.

— Dá pra parar de me chamar de filho? Você nunca esteve lá pra mim. Você não é nada pra mim, além de um estranho.

— Eu sei Guto, e sinto muito por isso. – ele diz com a voz falha.

— Não me chame assim, nunca mais, você não tem mais esse direito. O que você quer? Por que mandou me ligarem? Pra começar, como conseguiu me achar? - pergunto pra ele já com as mãos tremendo de tanta raiva que estou sentindo. Como ele ousa me chamar da mesma forma que me chamava quando eu era criança? Como se ainda tivesse intimidade para isso.

— Filho, eu não quero nada seu, só queria te ver. Você sempre será meu garotinho traquina. Vi você na TV e queria me despedir... - uma lágrima desce dos olhos do meu pai. Lágrima de crocodilo, com toda certeza. Talvez ele deve estar achando que chantagem emocional vai me convencer de que ele é um pobre coitado arrependido.

— Por que eu? Por que você procurou a mim? E não a meus irmãos? Ou a minha mãe?

— Porque eu sempre soube que eles me perdoariam e você não.

— Você não tem ideia não é? Você não sabe de nada... Eu odeio você. Sempre odiei, desde o dia que você foi embora nos deixando para trás. Ódio é a única coisa que sinto com relação a o que você representa. O que você quer? Dinheiro pra te manter aqui nesse hospital? Sinto muito mais procurou a pessoa errada, eu até tenho a grana, mas prefiro gastá-la com quem se importa comigo, e não com quem me abandonou quando eu só era um moleque e só reaparece quando está fodido em cima de uma cama.

Sinto as lágrimas lavarem o meu rosto, mas não consigo me controlar, sei que ele é meu pai, que ele está em cima de uma cama correndo risco de não sair vivo dela, mas eu preciso falar. Meu peito está doendo, é como se uma mão apertasse meu coração me sufocando. Não podia controlar minha raiva, é muitos anos de mágoas e ressentimentos pra agir cordialmente.

Precisava desabafar e dizer que não esqueci tudo que ele me fez. Ele era meu pai, era dever dele prezar pela minha felicidade. Cuidar de mim, dos meus irmãos e da minha mãe. E não fugir como um garoto imaturo atrás de aventura sem se preocupar com quem ele estava deixando para trás com essa decisão. Senti-me abandonado por todos esses motivos e nunca nem soube o porquê, me culpei por não ser um bom filho, mas depois que cresci percebi que a culpa não era minha, e sim dele que decidiu partir.

— Eu não acredito nisso filho, você me ama, sempre me amou, se não, nunca teria se dado ao trabalho de vir até aqui. Eu não preciso do seu dinheiro, longe disso. Trabalhei todos esses anos para deixar vocês em uma situação confortável. Por isso estou aqui, gastei toda a minha vida trabalhando para repor a falta que vocês me faziam.– meu pai tenta se levantar, mas é impedido pelos fios ao qual está conectado. Ele começa a tossir, mas não isso não me afeta.

— Nunca precisamos do seu dinheiro, nem depois de morto isso aconteceria. Minha mãe deu duro pra nos criar, e hoje eu e meus irmãos temos nossas vidas planejadas, não precisamos de nada que venha de você. Acredite nas minhas palavras quando digo que eu odeio você. – cuspo sem qualquer remorso porque é verdade.

A máquina começa a apitar um pouco mais alto me deixando zonzo, me sinto enjoado. Mas meus olhos continuam travados nos seus, sinto meu corpo tremer pela força das minhas palavras. Seco as lágrimas antes de uma enfermeira entrar no quarto e começar a verificar meu pai na cama.

Ela pede pra eu esperar lá fora quanto ela o examina, porém eu já disse tudo que tinha pra dizer.

Assunto encerrado.

Saio cambaleando para o corredor, simplesmente não enxergo nada ao meu redor, eu estou com tanta raiva, tanta amargura e ressentimento que se eu pudesse, bateria em alguma coisa. Vejo uma lixeira, corro até ela e vomito tudo o que tinha no meu estômago. Isso foi demais pra mim, vê-lo naquele estado me dizendo aquelas palavras foi mais difícil do que imaginei que seria. Começo a me perguntar se ele morreu, será que ele está bem? Porque a enfermeira pediu pra eu sair? Será que ele vai morrer sem acreditar que eu não o amo? Que ele não é o meu pai? Será que ele vai morrer porque vim até aqui? Eu sou um maldito idiota. Mas essa é a verdade não é? Eu o odeio. Quer dizer, isso é o que eu deveria sentir, não é? Mas por que me sinto tão ansioso pra saber se ele ainda está vivo?

Esse assunto nunca estará encerrado, porra!

Sento em um dos bancos da recepção do hospital, baixo a cabeça entre os joelhos e tento me acalmar tomando respirações profundas. Depois de alguns minutos a enfermeira que estava com meu pai me chama.

Eu vou até ela esperando que ela me diga que ele morreu, meu Deus! Eu não quero que ele morra. Apesar de tudo eu sou sangue dele. Não posso desejar que meu próprio pai morra, pelo contrário eu sinceramente espero que ele fique bem, entretanto apenas fique longe de mim. 

Ela sorri pra mim aquele sorriso bobo que as mulheres me dão quando estão interessadas. Azar o dela é que não estou com cabeça pra isso agora.

— Ele agora está bem, só ficou nervoso. Sr. Augusto está com a saúde muito fraca para ter emoções muito fortes, então nada de assuntos delicados. Então você é o filho piloto de quem ele tanto falava...

— Hum... Não sei. – resmungo baixinho ainda interpretando suas palavras.

— Seu pai fala muito de vocês, todas as pessoas do hospital amam seu pai. Ele é meu paciente preferido, sempre tão sábio e amoroso. Mas não o deixe saber que eu lhe disse isso, às vezes ele fica um pouco metido.

— Não sei porque está me dizendo isso. Só quero saber se ele ainda está vivo.

— Ah me desculpe, não quero lhe alongar. Bem, nós ligamos pra você para que possa fazer o teste de compatibilidade para o transplante. O médico daqui a pouco vai falar com você. - a enfermeira sorri e sai me deixando pensando no que ela acabou de dizer. Teste de compatibilidade? Que merda é essa? Nem fodendo irei doar meu rim para esse cara.

Um médico baixinho e careca se aproxima de mim e pergunta:

—Você é o filho do Sr. Luiz Augusto Salles não é?

— É o que me dizem. - confirmo irritado descontando minha frustração de toda situação nele. Sei que sou um idiota, mas estou muito puto para raciocinar direito e nesse momento eu não queria ser o filho miserável de um homem acamado.

— Me chamo Dr. Antônio Pontes e estou acompanhando o caso do seu pai. Poderíamos ir até minha sala para conversarmos?

— Eu não sei em que posso ajudar doutor.

— Vamos até minha sala, fica logo ali, lá conversaremos mais à vontade assim posso te explicar o porque da nossa ligação. – ele insiste.

Mesmo sem vontade, eu o sigo até seu consultório. Dr. Antônio senta-se atrás de sua mesa e me faz um sinal para sentar na cadeira a sua frente. Começo a me sentir enjoado novamente, santo Deus!

— Gustavo, descobrimos seu contato com uma revista de esportes que fez uma matéria sobre você no mês passado, seu pai nos contou que você é piloto de motocross. Sr. Augusto tem muito orgulho de você. Ele coleciona todas as revistas e jornais que falam sobre você.

— Eu estava em Los Angeles para uma competição quando vocês me ligaram.

— Eu vi que você ficou entre os cinco primeiros colocados, parabéns! Seu pai ficou exultante de felicidade.

— Acho que orgulho não é o sentimento que ele nutri por mim, talvez culpa possa se encaixar melhor. Eu realmente não sei em que posso ajudá-lo como já lhe falei anteriormente, nós não temos nenhuma relação afetuosa, o senhor me entende?

— Imaginei, mas quero que saiba que seu pai infelizmente está com os dias contados se ele não fizer um transplante o mais rápido possível, estamos correndo contra o tempo e eu não sou um homem de desistir de meus pacientes. Estava contando que você pudesse fazer um teste de compatibilidade para doar o ruim ao seu pai. Gustavo... - o senhor baixinho e calvo a minha frente me encara com a testa franzida, girando a caneta entre os dedos num gesto de impaciência ou nervosismo.

Ele respira fundo e continua:

— Não sei sobre o relacionamento de vocês, mas espero que você entenda que a vida dele depende disso. – o médico conclui fazendo questão em frisar a palavra vida como se isso me fizesse entender a necessidade dele ter me chamado até aqui.

— Eu não sei o porquê você espera isso de mim doutor. Sei que o senhor está fazendo seu trabalho, e admiro isso, mas é como lhe falei, não tenho nada haver com esse homem.

— Esse homem é o seu pai. Esse é o porquê eu espero que você faça o teste, como também indique outros parentes para que também possam fazê-lo.

Fito o médico ainda sem acreditar no que eu estou ouvindo. Eu não posso fazer isso. Não depois de tudo que ele nos fez passar.

— Dr. Antônio, eu respeito sua opinião, mas acho que não posso fazer isso. – falo sendo curto e grosso, pra já deixá-lo ciente de que estou fora dessa responsabilidade que ele quer jogar nas minhas costas.

— Pelo menos pense Gustavo, pense que você pode deixar seu pai morrer caso não concorde em fazer o teste. É só um teste. Não tem nada certo ainda, e eu não estou lhe pedindo o coração, é só uma parte do seu rim, isso caso sejam compatíveis. – ele sorri fracamente pra mim.

— E a fila de doação? Deve haver outra maneira, eu não posso fazer isso. Como deve saber sou atleta e não posso passar nem perto de um procedimento como esse.

— Meu caro, pense. Não acho que você viveria uma vida plena sabendo que não fez o bastante para salvá-lo. À fila para transplantes no Brasil chega há durar dois anos de espera para acharmos um doador compatível, e a fila tem cerca de trezentas pessoas para esse tipo de órgão e não temos tempo para isso. Então, se você ou alguém da sua família puder ser o doador será maravilhoso, além de que poderíamos tirar a chance de salvar a vida de outra pessoa usando um órgão doado pelo sistema tendo um parente compatível e legível para doar. Agora se você me der licença tenho que atender outro paciente.

Saio da sala atordoado de tanta coisa pra pensar, fui direto em direção à saída do hospital. Preciso sair daqui. Preciso de ar. Preciso respirar. Ando pelas ruas sem saber em que direção seguir, só quero andar e esquecer que essas últimas duas horas aconteceram. Avisto um café e entro. Peço a garçonete um expresso. Sento-me em uma mesa próxima a rua e fico observando o vai e vem de pessoas.

Será que a vida delas tem tantos dramas como a minha? Arrependo-me de ter atendido aquela ligação do hospital. Nada disso estaria acontecendo se eu não fosse curioso e tivesse atendido a chamada do número desconhecido.

O que eu estou fazendo aqui? É a pergunta que não quer calar na minha cabeça. Agora tenho a responsabilidade da vida de uma pessoa nas minhas costas. Começo a relembrar as palavras do meu pai.

Sim filho, nunca me esqueci de você nenhum dia sequer.

Ele só podia estar brincando comigo, como ele tem coragem de dizer isso na minha cara, depois de tudo? Faz vinte anos que ele foi embora, porra!

Filho, nunca me esqueceria de vocês, estou tão feliz que você está aqui.

Ah! Ele só pode estar feliz, já que está contando que eu lhe dê um rim. Foi por isso que ele me procurou, pra eu ajudá-lo. Procurou a mim porque sabia que eu era um fraco e seria mais fácil me enganar. Ele precisa saber que eu não sou um idiota e não tenho mais sete anos.

A garçonete chega com o café, me entrega e sai rebolando querendo chamar minha atenção. Nem me lembro do rosto dela, é uma pena, ela tem uma bela bunda.

Eu não acredito nisso filho, você me ama, sempre me amou.

Não, eu não o amo, quem o amava era o garotinho de sete anos que pensava que o pai era o super-herói incrível, que lhe protegeria das dores do mundo e sempre estaria ali, perto.

Daria qualquer coisa para não ter vivido esse dia, mas logo me arrependo do que desejei porque hoje eu conheci a mulher mais linda que já vi na vida.

Liz. A garota com nome e cheiro de flor.

Imediatamente lembro-me do mecânico e resolvo ligar. Sr. Jorge marca de me encontrar no prédio para fazer o reparo no carro.

Graças a Deus, hoje mesmo terei meu carro funcionando. Apesar de que não me oporia a ganhar uma carona de Liz pra cada lugar que eu quisesse ir.

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