Carolina
Gemo conforme a pressão do meu peito diminui, mas então braços envolvem o meu corpo com intensidade e o sufocamento me impede de respirar.
— Alexander, você está me sufocando... — digo, com dificuldade.
Ouço inúmeros sons surpresos e enfim me recordo do que aconteceu a instantes atrás, então arregalo os olhos e tento me levantar. Porém, sinto uma dor perto do peito que me faz gemer dolorosamente.
Mal tenho tempo para falar nada, quando Alexander me beija de surpresa e volta a me abraçar com necessidade. Seus soluços movidos pelas lágrimas são baixos, mas me fazem chorar junto com ele.
— Carolina, eu achei que jamais te veria novamente... — ele beija a minha testa — Eu te amo tanto! — faz uma pausa e beija a minha bochecha — Eu te amo! — conclui com o beijo no meu queixo — Eu te amo!
— Eu também te amo! Por favor, me deixe respirar.
— Certo, me desculpe...
Alex se afasta e eu tento acalmar a minha respiração. Resolvo observar todos que estão a nossa volta e dou um pulo assustado quando vejo que todos estão com as feições espantadas.
— O que aconteceu? — indago, tensa.
— Amor, você foi baleada. — somente me recordo desse detalhe e então olho para o meu busto, arregalo os olhos ao ver um furo no corpete do meu vestido.
— Como estou viva?! — indago novamente, sem acreditar.
Alexander leva a mão para onde a marca da bala está e começa a apalpar o local acertado. Alex bate levemente com a mão cerrada e um barulho oco é ouvido, como se fosse duro e insolúvel.
Seu olhar chocado se volta para mim, eu arqueio a sobrancelha sem compreender e ele sorri como se houvesse ocorrido o fato mais feliz de toda a nossa existência.
— De que material é feito o seu espartilho, Carolina? — ele questiona a mim.
— Barbatana de baleia. — o sorriso dele se intensifica.
— Isso salvou a sua vida! — ele diz eufórico.
— C-c-como? — gaguejo.
— Carol, o espartilho feito de barbatana de baleia parou a bala. Você está aqui ainda por causa dele.
— Isso... é sério? — sorrio para ele.
— Sim. — ele afirma convicto — Por isso que você não sangrava, agora compreendo.
Todos a nossa volta estão surpresos e cheios de admiração pela descoberta feliz. Alguns guardas se aproximam de nós, seus rostos estão tensos e pensativos.
— O que aconteceu? — Chris indaga.
— Não há sinais do comparsa da mulher. Vocês têm certeza de que havia um?
— Sim. — Alexander se pronuncia — Até dei um chute no homem.
— Então o desgraçado deve estar pelas redondezas. — o guarda alto constata — Vamos, homens! Temos um fugitivo para caçar!
Eles assentem e correm em direção a mata escura, em uma tentativa de encontrar Drake.
Logo vejo a minha mãe ser levada por uma carruagem policial, seu olhar direcionado para mim evidenciava ira e promessas de que eu me arrependeria.
— Ela não fará mais mal para você. — Alex sussurra segurando a minha mão enquanto nos direcionamos para casa através de uma carruagem que chegou para nós dois irmos embora da cena do acidente.
— Eu sei. — digo, com os olhos marejados.
— Vou chamar um médico para saber se você está bem, ok?
— Será mesmo necessário?
— A sua saúde é sempre necessária, amor. — seu tom é preocupado, eu somente assinto.
Nós voltamos para a mansão de papai e eu corro para abraça-lo. Ele está deitado na sua cama e geme pelo ferimento de bala do seu ombro e eu me afasto um pouco.
— Minha querida, eu senti tanto medo por você.
— Eu também. — sussurro fracamente.
Observo enquanto Michael se aproxima de nós com os olhos marejados.
— Papai me contou o que aconteceu mais cedo. — ele inicia evidentemente triste — Eu estava tão longe, irmã. Deixei você na mão e para piorar estava sendo maltratada pela nossa própria mãe.
— A culpa não é de vocês. — digo, com os olhos marejando.
— Carolina, a culpa é minha sim! Eu sou o seu pai e passei anos tapando os olhos para as atitudes bárbaras de Gertrudes. Hoje eu percebo os sinais que você e ela davam, mas na época, achava que eram apenas alguns conflitos leves.
— Não podemos mudar o que aconteceu! — afirmo — Hoje eu percebi que esse é um capítulo virado da minha vida, passei tempo demais vivendo com base nos comandos de mamãe. Ela me deu a vida, mas não faz ser certo todos os seus pecados e crimes.
Eles assentem sem dizer nada. Volto a abraça-los e o momento se estende por mais alguns momentos.
(...)
Estou indo em direção ao palácio da rainha Vitória. Alex não sabe que eu estou vindo, a verdade é que ninguém sabe. Estamos passando mais alguns dias em Londres para resolvermos as pendências de quando estávamos no campo.
A carruagem cessa o passo e eu suspiro nervosa pela perspectiva de ver a minha mãe.
O cocheiro abre a porta e eu desço com cautela pelos degraus finos e retangulares da carruagem.
— Obrigada. — agradeço gentilmente ao senhor.
— Disponha.
Sigo em direção da escadaria central e alguns guardas me interceptam.
— Bom dia, cavalheiros! Sou a Sra. Jones e desejo falar com a vossa majestade.
— Bom dia, senhora! — um dos guardas me cumprimenta — Tem um convite?
— Temo em dizer que não, mas podem fazer o favor de dizer a ela que a filha de Gertrudes Thompson está aqui para vê-la?
Os guardas se entreolham e me fitam com desconfiança. Eu levanto o queixo e mantenho a postura ereta.
— Aguarde um momento! — o guarda diz e em seguida adentra pelos portões do palácio.
Me viro de costas e fito o enorme jardim da rainha. Os arbustos são bem aparados, as flores bem cuidadas e as fontes devem ter custado milhões. Os pássaros sobrevoam o lugar cheio de verde e cantam com os seus belos timbres. Suspiro e volto a olhar para trás para checar se o guarda está voltando, mas nem sinal do homem.
Observo as minhas unhas e quase as levo aos meus dentes, mas controlo a ansiedade.
— Sra. Jones! — alguém me chama e eu me viro de frente para onde a voz veio e percebo que é o guarda de antes — A rainha disse que irá vê-la.
Assinto e ele faz sinal para que eu o acompanhe. Eu o sigo sem hesitar, nós passamos pelo hall de entrada e seguimos por um corredor luxuoso e todo revestido em tons de ouro e cheios de artefatos caríssimos.
Seguimos caminhando e vislumbro a sala do trono de relance, mas não entramos nela e isso me deixa pensativa.
— Para onde estamos indo? — indago ao guarda.
Ele vira a cabeça para o lado e me fita de relance, parece que ele sabe o motivo do meu questionamento.
— A rainha quer te receber na sala do chá. — ele esclarece.
Nada digo, apenas assinto. Seguimos e passamos por um corredor grande e ele para em frente a uma porta dupla revestida por tons em creme e dourado. Sua mão vai de encontro ao trinco e ele a abre, só então vejo a rainha sentada com a postura ereta em um sofá grande.
Ela está acompanhada pelo seu criado pessoal e algumas mulheres bem vestidas estão em pé atrás dela.
— Então a filha de Gertrudes Thompson veio me ver. — ela arqueia a sobrancelha e abre um sorriso ladino.
— Bom dia, majestade! — faço uma reverência quando me paro em frente a ela.
— Bom dia, Sra. Jones. — firmo meu olhar ao seu e ela parece me olhar dos pés a cabeça — Me deixem a sós com ela! — ela ordena e os criados saem do cômodo juntamente com o guarda e em seguida fecham a porta — Sente-se! — ela aponta para o outro sofá vazio.
— Obrigada. — agradeço.
Me assento e em seguida a fito novamente. Seu semblante parece curioso com o motivo da minha vinda.
— Veio para vê-la? — indaga com franqueza.
— Se vossa majestade permitir, eu gostaria.
Ela analisa a minha postura novamente e fita o teto, seu semblante não revela nada e a minha ansiedade aumenta conforme o seu silêncio é prolongado.
— Por quê? — ela volta a me olhar nos olhos.
Suspiro pesadamente conforme me recordo do motivo da minha vinda.
— Eu desejo saber os motivos reais dela.
— Percebo que a sua mãe ainda tem o controle sobre você. — ela me alfineta.
— Pelo contrário, somente estou aqui porque quero entender tudo com calma. Naquela noite eu ouvi coisas que não compreendi bem, coisas que estão tirando o meu sono. A minha mãe não é mais dona das minhas ações, eu sou livre, majestade, livre para voar.
— Você é livre para voar, mas devo te alertar que a liberdade é algo subestimado. — a rainha ajeita a postura — Eu sou a rainha e sequer sei o que é ter liberdade. Desde que fui coroada e me casei sabia que a liberdade seria tão rasa quanto uma poça de água ao chão após uma garoa. O trono carrega consigo uma grande responsabilidade que consome qualquer oportunidade de liberdade. Eu somente sigo os passos dos meus antepassados, mas mesmo assim busco trazer diferença e espero que daqui a 200 anos as pessoas ainda se lembrem de mim.
— Rainha Vitória, sei que o peso da coroa é imenso, mas não desejo ter a responsabilidade de ter que comandar um país inteiro. Compreendo que não é tão fácil quanto supomos, a verdade é que sempre abdicaremos de algo conforme nossas vidas prosseguem.
— De fato.
— Eu abdiquei da posse de mamãe sobre mim para que eu a tomasse por direito. Por anos vivi sobre o controle dela, tentei respeitá-la e compreendê-la, mas tudo não passava de uma ilusão.
— Por quê?
— Porque a vida não é uma ilusão. A vida segue incessantemente o seu percurso, não há como fazer o tempo parar para que ela se adeque a nós, somos nós que nos adequamos a ela. Eu escolhi me adequar começando a decidir sobre mim e quando parei de lutar contra a vida encontrei Alexander. Bem, ele me encontrou. — ao concluir, noto que estou emocionada, então limpo uma lágrima teimosa do canto do meu olho.
A rainha direciona o seu olhar e suspira fortemente, como se também estivesse controlando as lágrimas. A mulher de postura imponente volta a me encarar e o seu rosto permanece indecifrável, mas então ela sorri sem humor.
— Eu te invejo, sabia? — ela indaga e eu fico surpresa.
— Por quê, majestade? Eu sou somente uma dama comum entre tantas que existem pelos lugares.
— É exatamente por isso. Eu gostaria de ser comum em meio a tantas, poder experimentar uma vez pelo menos o sabor da real liberdade.
Baixo o olhar assentindo, tentando compreender o peso das suas palavras sobre mim. Contorço as minhas mãos sobre o colo coberto pela saia do meu vestido.
— Quem sabe em outra vida, majestade? — levanto o meu olhar para ela que parece estar surpresa pela minha audácia.
Penso que ela irá me repreender, mas o seu semblante se converte em divertimento. Um divertimento que eu não havia presenciado ainda pela monarca.
— Eu espero! — ela ri com leveza — Ainda quer ver a sua mãe? — seu rosto está sério agora.
— Sim. — confirmo sem hesitar nem sequer por um minuto.
Ela assente com convicção e prossegue a me fitar com insistência, mas então ela tosse levemente e olha para porta dupla que divide a parte interna do cômodo da externa.
— Guardas! — sua voz é impermeável e cheia de potência.
Dois homens abrem a porta dupla e adentram com elegância para dentro dessa saleta. Ao estarem perto de nós, mas em uma distância segura eles reverenciam a rainha com toda pompa necessária perante a monarca.
— Acompanhem a Sra. Jones até a masmorra, mas deem a ela a devida privacidade sem que a deixem sós com a prisioneira. — eles assentem com firmeza e disciplina.
A rainha me lança um olhar firme e em seguida se levanta, eu a acompanho e me ponho de pé com rapidez. Creio que ela dará alguma ordem para mim também, pois me analisa de cima a baixo.
— Terá apenas 10 minutos para falar com ela, após isso os meus guardas irão chama-la para retornar para o vosso lar.
— É o suficiente, majestade.
Ela assente e eu realizo uma reverencia em sinal de despedida, então prossigo com os dois homens em direção a um corredor estreito que não é tão chique e glamuroso quanto o resto do palácio. Avisto ao longe uma escadaria extensa, logo os dois guardas param e abrem espaço para que eu prossiga.
— Desça as escadas, Sra. Jones, ela está na terceira cela do lado esquerdo. — o guarda com cabelos loiros me informa.
— Se precisar de qualquer coisa nos avise, Sra. Jones. — o outro me informa.
— Agradeço pela ajuda. — sorrio tensamente e então dou um passo adiante.
Suspiro profundamente e começo a descer a escadaria e um lugar sujo começa a dar as caras. As paredes cobertas por pedras acinzentadas retangulares aumentam a sensação de eu estar em um lugar impuro. Para ser sincera o lugar exala uma penumbra maligna que é capaz de tirar qualquer um dos eixos.
Estou quase concluindo a tarefa de descer a escadaria quando ouço vozes femininas em uma conversa com os ânimos exaltados. Torno o meu passo cauteloso e prendo a respiração para tentar ouvir o que estão falando. Me escondo atrás de um pilar e aqui permaneço enquanto os meus batimentos cardíacos aumentam gradualmente que consigo ouvi-los nos meus ouvidos.
— Como você ousou? — uma das vozes indaga com irritação.
Reconheço a voz que parece ser da minha mãe. Seu tom é irado, mas contido.
— Foi bem simples na verdade. — a outra voz diz, mas essa eu não consigo reconhecer por estar sussurrando — Gertrudes, o seu defeito sempre foi se achar inabalável. O seu ego é maior do que a sua capacidade de compreender que és uma mera mortal.
— Maldita!
— Maldita, eu? — a voz ri com leveza — Aceite que uma mera empregada fez a grande marquesa de Brighton ser pega pela coroa!
— Não se glorifique pelo meu infortúnio. Se eu cair, você também irá!
— Só existe uma diferença, marquesa de Brighton, você não estará aqui para ver a minha queda.
— Sua imunda!
— Marquesa de Brighton soa bem, não é? — a voz indaga de modo questionador.
— O que pretende, maldita?
A outra voz ri com leveza e a minha curiosidade aumenta para descobrir quem conversa com a minha mãe. Ajeito a postura e respiro levemente para controlar o nervosismo que estou sentindo.
— O seu filho demonstrou interesse por mim, sabia? Talvez eu me esforce para amarra-lo de vez a mim, assim poderei garantir que serei a próxima marquesa do marquesado de Brighton.
— Eu não irei permitir isso!
— Posso saber como? — a voz misteriosa gargalha com leveza — Se quando acontecer você estará se revirando no túmulo. — sua voz conclui em um sussurro maldoso.
— Você e a sua mãe são meras ratas! — mamãe brada.
— Não ouse falar da minha mãe, sua megera! Mamãe provavelmente se casará com o seu marido, mas ela o ama de verdade, isso não posso ousar contradizer. Ela é boa demais, por isso, eu estou agindo sozinha e eu quero garantir uma vida de riquezas. Eu terei tudo que você teve, Gertrudes Thompson enquanto o seu corpo seguirá apodrecendo sob a terra.
— Eu disse para Britney que não era uma ideia boa te manter a par das nossas decisões sobre Carolina, mas ela julgou você boa o suficiente. Ideia tola, pois você não passa de uma traíra!
— Você foi ingênua o suficiente para crer que eu me uniria a quem despejou duas pessoas pobres no olho da rua? O que você fez a minha mãe e a mim não se faz. Todos acreditam que a minha vingança foi deixada para trás, pobres tolos! Eu quero o sangue de todos os seus descendentes!
— Eu morrerei, sei disso, meus dias estão contados. — mamãe assume com certa cautela — Mas não ache que terá triunfo, pois Carolina apesar de ser a minha decepção verá quem você é de verdade.
— Carolina? — a voz gargalha com ênfase — Carolina é tão tola quanto uma porta!
— Creio que você esteja subestimando a minha filha.
— Não estou!
— Você enlouqueceu! — mamãe bufa.
— Não estou nem perto da loucura, Gertrudes! Sabe o que será uma loucura? Quando eu me tornar a comandante do seu grupo, ao invés de caçar as pessoas humildes, eu ordenarei que matem sem dó ou pena os nobres, os mais ricos e cheios de pompa!
— Não ouse fazer isso, sua rata!
— Todos comerão na palma da minha mão, inclusive os homens que você pretendia deixar para trás. Sabia que eles estão com raiva por você ter considerado deixá-los desamparados? — uma gargalhada é acrescentada ao final da indagação — Eu prosseguirei com o seu legado e eu terei o sucesso que você jamais foi capaz de ter!
— Você mesma disse que eu me achava inabalável, percebe que está cometendo o mesmo erro, Patrícia?
Esperavam por isso? Então aguardem para o próximo que será o último!
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Beijooos