3| O ESCOLHIDO

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— Então, onde paramos, minha filha? — Isaac perguntou, ainda sentindo o rosto queimando devido ao número de ataques que recebera de Rebecca.

Ele ouviu gemidos vindo da filha, mas nenhuma palavra específica. Ela estava deitada sobre a cama com a camisola que ela sempre usava antes de dormir e com seus lindos cabelos ruivos espalhados pelo lençol.

Havia lágrimas em suas bochechas e ela estava vermelha, possivelmente pela força que estava fazendo para conseguir falar. Foi então que ele se lembrou da injeção com o soro paralisante.

— Me perdoe, esqueci que não está em condições de se comunicar. Se me lembro bem, paramos quando o homem que cuidava da organização me apresentou os mísseis. O chefe do projeto disse que eu poderia fazer parte da organização e receber a enorme quantia de dinheiro que ele havia prometido e eu aceitei. Então, comecei a trabalhar.

Isaac se lembrava de todos os dias e noites que passara em claro enquanto trabalhava na criação das bombas. Quando Isabella perguntava, ele dizia que era assunto da faculdade e nunca mais tocava no assunto. Naquela época ele se manteve trancado dentro de seu escritório e mal conversava com a esposa e com a filha. Ele se lembrava de se sentir culpado, mas afastava o sentimento ao lembrar da enorme quantia que iria receber. A filha de quatro anos estaria com seus estudos pagos até a faculdade e eles poderiam se mudar para uma casa melhor, com uma boa condição de vida.

Levou meses para que enfim ele terminasse o trabalho. No dia que finalizou, saiu de casa às pressas, sem se despedir sequer da filha e foi de encontro com o chefe da organização apresentar o projeto.

— E ele adorou. Na semana seguinte eu já estava trabalhando na construção dos mísseis. Passava o dia inteiro numa usina escondida pelo governo, para qual mudei quando o projeto foi aprovado, montando-o e sua mãe me ligava desesperadamente atrás de notícias. Não importava quantas vezes eu dissesse, aquela mulher não entendia que eu não atenderia o celular durante o trabalho.

Rebecca resmungou algo, mas Isaac a ignorou.

— Enquanto eu construía o que seria o primeiro e o mais importante projeto de toda minha carreira, desenvolvi uma amizade muito forte com Alan. As vezes almoçávamos juntos e conversávamos muito quando tínhamos um intervalo. Ele trabalhava na Toca, então era bem difícil termos uma pausa ao mesmo tempo. Mas isso não nos impediu de conversar por mensagens de texto e sair para beber algumas vezes depois do trabalho. Eu disse a ele tudo sobre meu casamento, a doença de sua mãe e sobre você, e embora eu soubesse que ele era apaixonado por mim, gostava de conversar com ele.

"Ele também se abria comigo e, de pouco em pouco, consegui fazê-lo me contar sobre o do chip. Detalhe por detalhe, eu acompanhei todos os passos do desenvolvimento e criação do chip, até mesmo dei algumas ideias de aperfeiçoamento que Alan acatou."

Aquilo parecia que havia acontecido há décadas, Isaac pensou enquanto falava. Parecia que ele e Alan haviam sido amigos há um bom tempo atrás. Se perguntou rapidamente como ele reagiria se visse como as coisas mudaram e como se sentiria em relação a Isaac. White entendia o porquê de tudo ter ocorrido como aconteceu, mas Alan entenderia? Repreendeu o pensamento, lembrando a si mesmo que Alan estava morto.

Rebecca gemeu outra vez e Isaac percebeu que havia parado de falar. Respirou fundo e recomeçou. Lembrava daqueles dias como se tivessem acontecido há poucos minutos, ainda que a sensação que a lembrança trazia era de pura nostalgia.

— Dias depois ele me disse que o chip estava pronto. Eu fiquei surpreso e perguntei quando os testes iriam começar e ele me respondeu que não sabia.

O chip é secreto, Isaac — ele dissera —, por isso precisamos testa-lo em alguém que faça parte do projeto para ter certeza de que funciona. As pessoas irão suspeitar se não for divulgado nenhum experimento em algum ser vivo antes de manda-lo para a comunidade.

REDENÇÃO | PARTE 1 |Where stories live. Discover now