23| INDESTRUTÍVEL

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— Conte seus passos. Não se esqueça.

Foi a última coisa que Oliver sussurrou em seu ouvido durante o abraço que deram antes que ela fosse levada. Assim como seus amigos, não lutou ou resistiu. Não havia motivo para que o fizesse. De um jeito ou de outro ela iria ter que passar por isso e teria que sobreviver. Por si mesma, por Oliver e principalmente, por Emily.

Durante o trajeto, enquanto lutava para não perder a conta, pensava neles dois. A imagem da irmã ainda morava em sua mente ainda que àquele ponto já fosse algo mais suportável de pensar. Era bom saber que Emily ainda vivia e viveria por mais tempo até que tivesse todo o seu potencial e o potencial que o chip lhe provia testado. O depois ela não gostava de imaginar.

Quanto a Oliver imaginava seu sofrimento. Conhecia bem a agonia uma vez que esteve na mesma posição que ele se encontrava e o sentimento ainda lhe era familiar. A fala do menino ainda reproduzia-se em sua mente, repetindo, de novo e de novo, como uma música presa num infinito replay: por mais que você deseje a morte e o fim de tudo, sabe que nenhuma das duas coisas vai vir e que você terá de ficar lá, à mercê de uma situação que você não é capaz de controlar ou de interromper.

O lado bom — se é que havia algum — era que ela poderia usar suas habilidades ao máximo. Poderia aprender a controla-las e usá-las a seu favor algum dia. Gostava de pensar positivo enquanto caminhava para o que seria possivelmente a maior dor que enfrentaria em toda sua existência e experiencia até ali.

Os ecos dos passos — não sabia ser eram dos guardas ou seus próprios ou talvez os dois convergidos em um único som — era completamente desconfortável. Perdia parte de sua lateralidade com o capuz que a cegava o que ocasionava em passos irregulares e tortos que quase a levavam ao chão. Tinha as mãos dos guardas grudadas em seu braço amarrado e esta era sua única forma de guia até o destino que ela não conhecia.

Ainda se segurando a sua contagem, dedicou-se à tentativa de tentar reconhecer qualquer sinal que indicasse que já havia passado por ali antes. O sopro do vento gelado em contato com sua pele? O volume dos pisos que sentia com seus pés? A pressão que seu corpo sentia com as paredes que apertavam-se a seu redor, tornando o ambiente um tanto claustrofóbico a ela?

Mas nada pareceu familiar o que a levou a elaborar para uma nova teoria: talvez estivesse indo para uma nova sala que não havia conhecido, andando por um novo corredor que ela não havia passado antes. Já havia corrido por esse lugar antes e ainda se lembrava do quanto se chocou com o quanto aquilo se assemelhava a um labirinto.

No fim da trilha, no entanto, acabou se concentrando apenas nos números que repetia a si mesma dentro da própria cabeça por não ter mais o que distrair sua mente. O caminho pareceu longo e quando ela enfim parou, suas pernas coçavam e tremiam de tanto cansaço.

Não demorou para que seus braços foram soltos e ela enfim retirasse o gorro negro de sua cabeça, libertando seus olhos da visão escura que suas pupilas já haviam se acostumado a enxergar. Tudo parecia seguir o mesmo roteiro das histórias que seus amigos lhe contaram: a caminhada, as picadas, a libertação das marras e o ambiente aleatório em que ela se encontrava.

A única diferença era que ela visivelmente não estava sozinha, como haviam mencionado os outros.

O ambiente se assemelhava a uma simples sala. Ladrilhos cobriam as paredes com desenhos xadrezes de pequenos quadrados pretos e brancos intercalados entre si. Do outro lado havia uma porta que camuflava-se com a própria parede, quase que irreconhecível e obviamente, trancada. Em um dos cantos havia uma planta inacreditavelmente verde que florescia de um enorme vaso acinzentando. Nunca mais achou que ver a cor da natureza com seus próprios olhos já que, após a explosão, verde era uma cor rara. À sua frente — apagando o brilho que testemunhar a natureza trouxera a ela —, havia uma mesa com diversos objetos cortantes: facas de todos os tamanhos e formatos, um cutelo, martelos e pregos, alguns pedaços de vidro quebrado e dardos pontiagudos e, seguindo com o olhar, adiante à mesa, sentava-se em uma cadeira marrom de madeira envernizada um guarda completamente imóvel.

REDENÇÃO | PARTE 1 |Where stories live. Discover now