Interlude: Jungkook e Frank

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A clínica não era extremamente luxuosa, porém confortável o suficiente. Tinha um quarto apenas para si e isso já bastava para lhe deixar aliviado. Sua cama era uma de solteiro simples, e quando deitava seus pés ameaçavam ficar para fora do colchão. A decoração em geral lembrava um hostel de duas estrelas.

Jungkook não tinha uma opinião formada sobre o lugar. Nos primeiros dias a sua rotina consistia em conversar com médicos e tomar alguns remédios para a ansiedade, e na maior parte do tempo sentia apenas uma dor de cabeça. 

Tinha muito tempo livre. Perguntava-se se tinha feito a escolha certa, em procurar esse tipo de ajuda, pois à medida que o tempo passava a ociosidade apenas lhe deixava mais ansioso.

Talvez essa fosse a intenção: ensinar o corpo a aceitar que não iria receber mais nenhuma substância química, e que faria isso sem trocar por outras manias.

Então, começou a fase de desintoxicação, em que sentiu praticamente todos os sintomas da abstinência: dores, tremores, convulsões, crises de ansiedade. 

A pior parte de todas, Jungkook descobrira, era dormir. Havia desenvolvido uma insônia terrível, e mal sabia que este seria o sintoma que perduraria por mais tempo. Muitas vezes passava uma noite inteira sem conseguir pegar no sono. Tinha chegado a um ponto em que já nem esperava descansar durante a noite mais. 

Não sabia até que ponto o seu desassossego era por conta da abstinência ou por conta de seus pensamentos sobre tudo o que acontecera na sua vida nos últimos meses. Nos últimos anos até.

Estava no refeitório quando conheceu Frank. Era sua segunda semana ali, e sempre lembraria dela como sendo a pior. Até mesmo sua aparência denunciava todo seu desconforto, suas olheiras estando quase tão escuras quanto a camiseta que vestia.

Estava jantando, apesar do baixo apetite que tinha, quando o homem mais velho entrou batendo a porta atrás de si e chamando a atenção de todos que estavam ali. Aparentava ter seus setenta anos e andava de maneira altiva. Sentou-se ao fundo, na mesa mais vazia.

Jungkook apertou os olhos. O rosto lhe era familiar. Olhou para o seu prato, tentando lembrar onde o tinha visto antes. 

A realização veio com uma boa surpresa. Mordendo os lábios, ele levantou-se de seu lugar, levando sua bandeja até a mesa do homem mais velho.

– Você é Frank Short, certo?

Ele não queria parecer um fã muito excitado, mas fora exatamente assim que soara quando alcançou a mesa.

Frank o olhou com uma sobrancelha arqueada e voltou para o próprio jantar, claramente não querendo conversar.

Jungkook postou-se na mesa ainda assim. Que mal tinha tentar conversar? Não tinha nada para fazer durante todo o seu tempo. E agora tinha acabado de encontrar um dos maiores maratonistas de todos os tempos, então que mal teria puxar uma conversa?

Comeram em silêncio, Jungkook tentando buscar uma abertura para iniciar uma conversa que agradasse o outro. Não precisou, porque foi Frank o primeiro a cortar o silêncio.

– É a minha quarta tentativa de internação.

Jungkook apenas ficou calado. Deixando seu prato de lado, apoiou as duas duas mãos na mesa, fixando-se em seus dedos. Desviou do assunto.

– Você me inspirou muito a entrar para o atletismo. – Jungkook começou com um sorriso. – Meu pai adorava ver aquela maratona das Olimpíadas de 72. Você inspirou o mundo inteiro a participar de corridas de rua…

– Jungkook, certo? – Frank o cortou. Jungkook não fazia ideia como o homem sabia seu nome, mas não houve tempo de perguntar, pois o mesmo já estava levantando de seu lugar. – Sabe qual o meu maior arrependimento?

Jungkook negou com a cabeça, seus grandes olhos negros fixos no ídolo.

– Foi não ter feito algo por atletas mais jovens como você. Não ter contado a minha história, para que ela não se repetisse.

Saiu, deixando Jungkook estupefato. Mais tarde, deitado em sua cama, Jungkook pôde enteder o porquê de Frank não querer conversar sobre suas conquistas. Era dolorido falar de momentos de glória quando se estava em seu pior.

Ficou grato pela interação que tivera, porém, pois agora tinha outras palavras para pensar. Palavras que motivam um pensamento no futuro, e não no passado.

Foi não ter feito algo por atletas mais jovens como você.

Lie to Me (jjk + kth) - ConcluídaWhere stories live. Discover now