Elevador

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Uma gota de sangue escorreu pelo meu dedo indicador. Consequência da unha ruída quase inexistente. Mamãe tentou por anos me fazer largar esse hábito, chegou até mesmo a colocar pimenta nos meus dedos. Não foi uma experiência agradável, muito menos eficaz e serviu apenas para que eu adquirisse ainda mais ódio por ela. Apenas superei mesmo essa mania há uns dez anos atrás, quando tive meu primeiro namoradinho. Ele gostava das minhas unhas grandes, pintadas e bem feitas, tinha um verdadeiro pavor dos cotocos roídos e ensanguentados.

Assim que senti o gosto de sangue parti instintivamente para o próximo dedo, mas para a minha completa surpresa, este também estava praticamente sem unha. Reparei então na minha mão inteira, depois olhei para a outra e voalá, eu oficialmente não tinha mais unhas para roer. A ansiedade me fez destruir todas elas. Talvez eu até devesse voltar a pintá-las, quem sabe assim eu voltaria a ter unhas decentes.

Mandei a primeira mensagem às 8h, quando acordei e imediatamente me veio a ideia de convidá-lo para jantar, de fazer algo diferente para variar. Comprei um vinho antes de ir para a universidade e não consegui prestar atenção nas aulas, pois eu precisava decidir o cardápio, ou até mesmo decidir onde iríamos jantar.

Sentei no fundo da sala como sempre, onde eu não poderia ser vista mexendo no celular. Até consegui prestar atenção na primeira aula, pois eu sei que ele acorda tarde nas sextas-feiras e não adianta esperar por uma resposta antes das 10h da manhã.

A segunda mensagem contendo as sugestões de restaurantes eu mandei às 9:30h. Ele estaria acordado dentro de instantes. Sei que ele ama frutos do mar então já estava esperando que ele escolhesse o restaurante do porto, onde tudo é fresco, pois a pesca é feita na hora, basta que a reserva seja feita com antecedência.

Fui para a segunda aula às 10h, já sem muita disposição de prestar atenção no que o professor diria. Às 10:05 conectei o celular à internet novamente. Eu não queria parecer obcecada, mesmo que dentro de mim eu soubesse que já estava. A mensagem já tinha sido visualizada e eu abri um sorriso automaticamente, apesar de que me senti mal por ter me comportado como uma obcecada, claramente eu poderia ter esperado mais um pouco antes de ficar online, nem sequer estava dando tempo para ele pensar.

Com o celular no colo, comecei a digitar alguma coisa sem sentido, apenas para chamar a atenção dele. Já fazia uns cinco minutos que ele estava online e não respondia as minhas seis mensagens. Talvez alguma coisa tivesse acontecido, ele nunca demorava tanto assim a me responder.

"Você não é a prioridade dele", lembro a mim mesma e então decido apagar as mensagens. Quão tola eu sou. Não somos namorados, não podemos ser vistos juntos, não temos nada sério. Não fui eu mesma que concordei com tudo isso. Percebi então que eu não estava obcecada, eu estava apaixonada. Me senti ainda pior. Selecionei as mensagens e quando já estava prestes a apagar veio a resposta.

"Já vou te responder, aguarde só uns minutinhos. Estou com uns problemas aqui."

Pronto! Finalmente respirei a aliviada, a vontade de chorar se dissipou. Estava tudo bem. Eu sabia que deveria ter sido alguma coisa grave.

Fui para o trabalho às 13h, até então nenhuma mensagem dele o que me deixou realmente preocupada com o que poderia ter acontecido. Deixei a internet ligada para o caso dele falar alguma coisa, mas nada. Apenas silêncio de uma pessoa que estava online. Será que eu não merecia uma resposta?

"Não espere grandes coisas de alguém que apenas transa com você", eu disse a mim mesma.

Larguei do trabalho às 19h e ainda nada. Voltei a sentir os sintomas da ansiedade e da tristeza, pensei em desligar o celular pelo resto do dia para que não voltasse a me iludir. Definitivamente a reserva no restaurante do porto estava perdida e eu já tinha feito previamente, mesmo enquanto ainda esperava uma resposta dele.

BABYWhere stories live. Discover now