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Encostei a cabeça no ombro de Minnie, com muito sono para fazer qualquer coisa naquele intervalo. Mesmo vendo todos animados, rindo fazendo piadas, eu não conseguia pensar em nada a não ser que depois daquele dia infernal na escola, teria que ir trabalhar e ainda teria que buscar a minha irmã na escola. Chegaria em casa ainda teria que lavar a louça que provavelmente ainda estaria na pia, fazer a comida... eu simplesmente não aguentava mais.

Aos poucos fui me entregando ao sono, o ombro da Minnie havia virado meu travesseiro favorito. Várias vezes dormir ali, várias noites sem dormir resultava naquilo. Resultava na minha morte interior.

- LISA!- eu dei um pulo, abrindo os olhos atordoada, levando um susto ao ouvir Seulgi me chamando.- O que você tem?

- Sono, Seulgi, sono.

- Você comeu algo

- Não sinto fome.

Era isso todos os dias. Era tão perturbador em alguns momentos, tantas perguntas, eu não queria perguntas. Queria saber se alguém ainda me enxergava, se alguém via a verdadeira Lisa. A menina que precisava urgentemente de uma ajuda. E mesmo guardando tantas coisas, sentia, me via no espelho, eu não estava aparentemente normal.

- Aqui, como essa barrinha.

- Não sinto fome, Jennie, muito obrigada.- sentir a sua mão segurando a minha era meio... bom? Não. Não sabia se era bom. Ela estava segurando a minha mão, ela me olhava nos olhos, me oferecia um tipo de ajuda. Aquilo... poderia ser bom.

- Por favor, Liz.

De todos, Jennie era a única que me chamava de Liz, ela chegou a dar um tapa em Yeji quando a mesma me chamou assim, alegando que aquele apelido era apenas dela. Aceitei por fim aquela barrinha de cereal. Falando pra ela que comeria depois, mas ela se sentou na minha frente, abriu a embalagem e só não colocou na minha boca pois eu não deixei.

- Você vai comer agora, Lisa. Você está aparentemente... cansada. Come isso por favor.

Acabei sedendo, sentindo um pouco de dor, olhei de relance para o meu braço e vi que uma mancha de sangue começava a ser aparente ali. Sem querer havia apertado muito aquela faixa.

- E-eu preciso ir no banheiro.- tive que sair correndo, sendo barrada por Sooyoung e a sua turminha. Eu odiava elas demais.- Me deixa passar, por favor...

- Ora ora, se não é a caipira do Colégio. Como está, Lisinha?

- Estaria melhor se você não estivesse no meu caminho. Me deixe passar.

- Como se algum dia faria algo que você pedisse.

Ao tentar dar a volta, as outras três garotas me impediram. A dor em meu braço só aumentava. E a minha raiva também.

- DEIXA ELA EM PAZ, SOOYOUNG!- eu não gostava de ninguém me defendendo mas aceitava ser protegida por Minjae, o meu amigo urso, pois ele era grande e o seu abraço me trazia conforto.

Muitos tinham medo de Minjae, e não era diferente com o quarteto nojento era assim que chamávamos elas. Eu corri, sem olhar para trás quando elas me deram espaço, me trancando em uma cabine. Sentei no chão, sentindo aquela vontade de chorar, tirei a faixa, vendo o meu braço em estado de calamidade. Só pude pegar a manga do moletom que eu usava e tirar o sangue que havia ali, murmurando por sentir dor. Por me sentir fraca todos os dias.

Era muita coisa, muita coisa para eu pensar, muita coisa para eu compreender, muita coisa para eu sentir. E ainda tinha aquela droga de paixão idiota que eu sentia por Jennie. Tudo aquilo somando em uma grande vontade de sumir, uma vontade de ser invisível, ser inexistente.

Eu abracei as minhas pernas, chorando, querendo gritar. Querendo algo que eu não teria. Querendo a minha avó de volta, querendo voltar para a minha cidade, apenas querendo me sentir bem uma vez depois de sete anos.

Dês que cheguei em Las Vegas, me sinto pequena, me sinto uma formiga perto das pessoas. A minha avó sempre me ensinou que nunca era pra eu deixar alguém me subestimar, ou mandar em mim. Era pra eu ser aquela garota forte.

Ela me chamava assim porque certa fez eu quebrei a perna por conta de um tombo que levei enquanto andava de bicicleta, e doía demais. Ela me disse que se eu fosse uma menina forte aquela dor passaria, e dês dali, eu nunca chorei por conta de quedas ou machucados, sempre gostei de ouví-la me chamando de forte.

A idealização das pessoas sobre quem tem algum tipo de problema psicológico, é que a pessoa se isola, se tranca dentro do quarto, se revolta contra todos, e que tem tendência a cometer suicídio o tempo inteiro. Mais uma vez, erradas.

Nem todo mundo que sofre com essa doença é isolada, fica trancada no quarto, se revolta contra todos, ou tem tendência a cometer suicídio o tempo todo. Muitas pessoas que sorriem, que brincam, fazem piadas, tenta sempre ajudar o outro tem essa doença, pode ter ansiedade, bipolaridade, algum distúrbio, a gente nunca tem a idéia de quem está ao nosso redor, nunca sabemos o que a pessoa passa, ou com o que ela trava uma batalha.

- Lisa?

- Estou saindo.- sequei algumas lágrimas que caíram, e cobri o meu braço novamente. Jennie estava ali. Nunca me acostumaria com ela ao meu lado.

- Tudo bem?

- Sim, só precisava fazer xixi. Não quero que se preocupe comigo, Jen.

- Gosto quando me chama assim.

Não é errado gostar de alguém. É errado gostar dela. Por muitos motivos, sua orientação sexual, o seu namorado, e principalmente, a minha família. Ah, e ela era a minha amiga também, não poderia.

- Sabe pensei em te acompanhar depois da escola, vi o percurso que você faz, eu vou pelo o mesmo caminho.

- Não estou dispenasando a sua companhia, mas eu não vou pra casa. Depois da escola, eu trabalho. Na cafeteria a dois quarteirões daqui.

- Hum... me bateu uma vontade de tomar um café depois da aula.

Senti o meu coração acelerar de um modo estranho, e um sorriso queria brotar em meus lábios, mas eu me contive.

- Tudo bem, te encontro no portão depois da aula.

Stay For Me (Jenlisa)Where stories live. Discover now