Território de caça

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— Ele já deve estar saindo.  

A voz de Yeri me chama de volta para a realidade. Checo a hora no celular e me abano com a outra mão, mesmo que o gesto não surta efeito algum.

— Que ótimo, não aguento mais ficar aqui — confesso, passando minha mão pela testa e limpando uma pequena gotícula de suor que ameaça escorrer.

O  dia está quente como o inferno.

Lembro de ouvir alguma coisa sobre o clima hoje pela manhã no jornal, mas fui estúpida o bastante pra ignorar e vestir uma calça e uma camiseta escura para sair de casa. Soube exatamente que foi a pior decisão do mundo quando me deparei com metade dos alunos usando roupas mais leves e chinelos, enquanto eu parecia me destacar por vestir o contrário. Foi como se o mundo todo estivesse contra mim naquela manhã.

Perto do meio-dia, quando a sensação térmica parecia assemelhar-se ainda mais com a do inferno, me dei conta de que eu ainda precisaria andar até o ponto de ônibus debaixo de um sol escaldante. Então, eu tive a ótima ideia de encontrar Yeri pra pegar uma carona com Hoseok, que tinha um carro. O pensamento de ir pra casa sem suar, no conforto do carro de Hobi com o ar ligado, me deixava muito satisfeita, então foi o que eu fiz.

Agora, nós estamos debaixo de uma árvore tentando pegar um pouco de sombra enquanto esperamos Hoseok sair do prédio onde está tendo aulas.

— Sabe, já que estamos sozinhas aqui, será que a gente pode conversar sobre o que aconteceu no sábado? Você foi embora com o Taehyung.

Sim, o sábado. A fatídica noite em que eu acabei com qualquer pingo de dignidade que existia no meu corpo e flertei descaradamente com Taehyung, um dos meus melhores amigos.

— Nada aconteceu no sábado.

Eu não falaria sobre aquilo nem em um milhão de anos. Prefiro fingir que nada aconteceu pois, com certeza, é melhor fingir que a bebida afetou minha memória do que estragar minha amizade com Taehyung.

— Tudo bem, se você quer agir assim... — Ela dá os ombros. — Ei, aquele ali não é o Taehyung?

— Rá. Boa tentativa Yeri, mas ele não estuda nesse prédio.

— Não, é sério, olha. — Ela aponta para as portas de vidro do prédio, e mesmo contragosto, acabo olhando na direção. — Oh. Meu. Deus.

Oh. Meu. Deus.

Acho que as três palavras definem bem nossa reação ao vê-lo saindo do prédio acompanhado de uma garota. Uma garota muito bonita. Eles passam pela porta de vidro, e mesmo com tantos alunos perto da escada que leva ao prédio, os dois começam a conversar animadamente.

— Será que eles estão ficando? — Ela me joga um olhar curioso, como se eu fosse capaz de responder suas dúvidas.

— Não sei. — Dou os ombros.

— Esse Taehyung, hã? Quem diria...

Não respondo. Eu simplesmente não quero falar sobre isso. Não é ciúmes, é a maldita crise de consciência que espanca meu cérebro e me avisa como é errado pôr uma amizade a perder por uma droga de boato. Um boato que nem sei se é verdadeiro. Estou com tanta vergonha de mim, das coisas que disse para Taehyung, que encará-lo no momento é a última coisa que desejo fazer.

Mas há dois lados, sempre existirá dois. E meu outro lado faz questão de repetir todas as cenas de sábado fielmente, como um loop infinito. Posso me ver tirando a máscara de Taehyung, posso ver seu rosto centímetros longe do meu, e tudo que me resta é imaginar. Imaginar como seria caso ele não desse fim àquele contato, imaginar como seria beijá-lo. Eu estive tão perto, mas tão longe. E isso me alivia na mesma medida em que dói, porque com sobriedade e sinceridade, posso a admitir que em determinado momento do fim de semana, eu quis beijar Taehyung. Talvez em determinado momento do dia, eu ainda vá querer beijá-lo.

Boatos • Kim TaehyungWhere stories live. Discover now