20° Capítulo - As Portas

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Jonas

Já estávamos preparados para sair daquele lugar, só não sabíamos se iria dar certo o que ficamos horas bolando, cabeças pensantes de um jeito que eu nunca vi antes. Gabriel, nas horas vagas, escalava lugares que eu preferia nem mesmo chegar perto, lugares tão altos que eu sentia náuseas só de pensar e falar. Ele disse que seria moleza, apenas teríamos que saber como abrir a passagem por dentro.

Gabriel estava segurando a maleta com provas que conseguimos pegar, aquelas mais comprometedoras que seriam imprescindíveis para incriminar facilmente os envolvidos. Havia dito que seria mais eficiente botar esse lugar a baixo do que pôr fogo em tudo, no entanto algumas provas estavam muito danificadas; molhadas, queimadas, rasgadas, eles fizeram de tudo para deixar muito complexo de ser investigado.

Nos dirigimos até a lareira de onde caímos há poucas horas, dias, não sei direito quanto tempo, mas era o suficiente para sentir falta de tudo, até da rotina de acordar, tomar café com a família.

Mas, mesmo Victória sendo uma das pessoas que eram recentes na minha vida e que eu me preocupava, havia outra pessoa. Jorge não costumava ser o filho perfeito. Não sei se o fato de ser o filho do meio era um problema, até porque esses são os que mais se sentiam injustiçados e esquecidos, um drama a aturar até a maioridade, quiçá na fase adulta.

Meu tempo era muito corrido para sentar e conversar com ele, acho que era isso que faltava, ser um pai ausente não lhe dava o direito de questionar a personalidade que destorceu-se na adolescência. Até certa idade Jorge não aparentava que um dia seria rebelde, inconsequente, e respondão. Já peguei diversas vezes ele e Blenda discutindo como dois iguais, foi quando tudo desandou, transbordou. Blenda o calou com um tapa no rosto que tirou total respeito dele, mesmo estando batendo boca com a mãe.

Após o incidente infernal, Jorge mudou da água para o vinho em questão de segundos. No outro dia ele acordou com o cabelo roxo, piercing na boca, alargador nas duas orelhas, e uma maquiagem preta muito forte nos olhos. De pronto eu pensei que estava assumindo sua orientação sexual, mas ele disse que não suportava mais conviver com a mãe histérica, e que dali em diante seria outra pessoa, com outra identidade, já que não tinha idade para ser dono do próprio nariz.

Eu tentei conversar com ele, perguntar se ele queria alguma ajuda, porque eu o conhecia o suficiente para conhecer seu caráter. Ele não quis conversa. Foi a partir daquele dia que eu não via mais ele com frequência, Jorge passou a ser violento, chegava em casa com cortes na boca e os olhos com lentes coloridas, sempre se metendo em confusão nas boates, ele virou um problema total. Blenda tentou colocá-lo num colégio militar, mas ele fugiu antes disso. Ficamos sem notícias suas durante uma semana, pensávamos que havia morrido em alguma outra briga. Foi então que o hospital ligou relatando que ele havia tentado suicídio, os pulsos estavam abertos e sangrando muito, foi encontrado uma faca, e uma corda na qual ele havia se pendurado. A salvação fora uma viatura que passara na hora e o tirara da morte. Ele pediu para que não deixasse Blenda entrar, ele queria me ver.

Entrei pela porta e o vi com os olhos fechados. Não tinha mais piercing nem mesmo a maquiagem, só o cabelo estava pintado. Seus pulsos cheios de esparadrapos, estava no soro, alguns arranhões no rosto, ele parecia o mesmo de antes.

- Pai... – ele sussurrou. Eu o vi abrindo os olhos para mim, deixando um sorriso acalentar meu coração. Naquele momento eu senti meus olhos encherem d'água, sentindo um alívio por não ter perdido meu filho que eu amava tanto. – Não foi dessa vez... que você me perdeu. – completou, a voz saía bem lentamente com uma força arrastada.

- Por que, Jorge? – perguntei.

- Ah, pai. Você não sabe o que passa na cabeça de um adolescente. – respondeu.

Garota de ProgramaWhere stories live. Discover now