6° Capítulo - Abelardo e Augusto

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A oscilação de algo sob minha cabeça me despertou de um sonho maravilhoso. No sonho me via diante de uma guerra onde um anjo travava uma batalha, o anjo vencera. Acabei deixando meus olhos vacilarem a fim de observar onde estava, e um ar tranquilizante percorreu minha espinha informando-me que o sonho foi real, intenso e prazeroso.

Girei meus olhos a procura de alguém, ele ainda estava ali, vi-me sorrindo toda boba, roçando meu corpo no dele. Jonas se entregou de corpo e alma, combatendo meu medo. Teríamos uma tarefa difícil daqui para a frente, ele era casado, eu era uma garota de programa, vidas diferentes.

A probabilidade de ficarmos juntos, em meio a tantos problemas, estatisticamente, era impossível.

Acariciei seu peito, deixando-o arrepiado, ele ainda continha sensibilidade, mesmo após tudo aquilo. Os batimentos, que a pouco permaneciam estáveis, calmos, estimularam-se aumentando as pancadas, podia ouvir seu coração.

O escritório bebericava a penumbra em um banquete de luxúria. As ruas estavam agitadas, os carros assolando meus tímpanos com as buzinadas provocando uma certa antipatia.

Não sei por quanto tempo permanecemos adormecidos daquele jeito uníssono, as pernas enlaçadas, sua mão envolta em meu ombro, acolhendo-me, sua respiração quente baforando meus cabelos, e súbitos acariciamentos.

- Jonas – ronronei, buscando sua atenção. Um falar preguiçosamente sedutor.

Ele se remexeu na cama improvisada, inspirando, fazendo com que minha cabeça subisse à medida que seu peito inflava, depois ele serpenteou, exalando aquele ar em mim.

- Vic... – sussurrou.

Estava amando esse apelido carinhoso. Empenhe-se em arrastar tamanha compaixão quando falar comigo.

- Já são quase nove da noite – informei.

E, como uma súbita tempestade em verão escaldante, Jonas se esgueirou da cama, precipitando-se diretamente à mesa onde, horas atrás, o despi. Vestiu uma meia, enfiou uma perna dentro da calça, pôs a outra meia, totalmente atordoado, de modo a considerar que algo importante ele teria que fazer naquele horário. Foi então que me lembrei que seu dedo encontrava-se um anel robusto esculpido em ouro, ele era casado. Uma pontada violenta de ciúme me abateu, eu pedi por isso. Ele havia me libertado, mas, e quanto a ele, seus braços estavam acorrentados? Tinha plena consciência de que me rotulei como uma completa egoísta.

Sou a outra, a amante. Por quanto tempo?

Quando voltei a me concentrar nele, o zíper da calça já se detinha no topo, o cinto ele passou por entre as alças da calça. As roupas que eu vestia, antes de desaparecerem do meu corpo, me fuzilava do chão. Constrangida, enciumada, querendo matar-me por isso, me propus a vestir-me, ainda queria uma carona para casa, ou melhor, pro cortiço vagabundo.

Empoleirei-me dentro da calcinha, vesti o sutiã, joguei o blusão de flanela e, por último, adentrei a calça. Por um momento desejei voltar no tempo, e não ter me submetido a entrar dentro do carro dele. Nenhum momento pensei que iria me entregar a ele, sequer considerar a possibilidade de estar apaixonada, coração tolo e fraco... Almejar um futuro ao seu lado, sendo que ele era casado, que idiota eu fui.

- E, então – arrebentei o silêncio. – Vai retomar a vida pacata de casado, e fingir que nada aconteceu? – repreendi. O bolo de engasgo se detinha em minha garganta, pronto para ser expurgado.

No momento que o apertei, ele terminava de passar o relógio pelo pulso. Não lembrava-me de vê-lo de relógio, também estava muito ocupada entre suas pernas, obrigada.

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