Encontro inesperado.

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— Sim, como os sombrios.

— Ah! — Ela riu. — Não esse tipo de laço, mas existe uma ligação, um laço diferente.

— Mas eu não o conheço.

Jena levantou. — Talvez conheça, só não sabe disso ainda. Mas não tem motivos para tanto alarde e não precisa se precipitar, afinal você o verá mais cedo ou mais tarde. Enfim... hoje é nosso último dia aqui. — Ela abriu os braços abrangendo os arredores do acampamento. — Vá aonde sentir vontade, se arrisque menina, vai ser bom para você.

Pensei em chamá-la de volta, mas sabia que não adiantaria. Jena já tinha se embrenhado na mata.

Por fim restava eu, a fogueira e um monte de dúvidas. Ainda fiquei um tempo sentada, distraída com as chamas. Algumas lobas surgiam, conversavam um pouco e logo voltavam a sumir. Era uma caça em grupo para juntar carne para levar para a vila dos humanos.

Havia um tipo de comércio de troca entre os lobos e os humanos da vila do padre Moura. Briana tinha comentado muito irritada sobre isso, por causa do Tratado em vigor eles não podiam mais sair roubando das fazendas externas, já que o novo rei humano era aliado dos Licans.

Comecei a andar a esmo. Papai estava morto e graças aos céus por isso, mas se ainda estivesse vivo eu queria poder roubar dele, mesmo que um pouco.

Contudo, não estaria na forma de loba, toda a experiência sobre compartilhar meu corpo com ela tinha sido naquele sonho, ainda assim era uma sensação fresca na memória.

Então seria assim? Observando e sentindo e até mesmo participando das sensações do meu corpo, mas não necessariamente sendo eu a conduzi-lo? Não era ruim, também não tinha sido bom, apenas me pareceu certo, normal, se eu nunca olhasse para baixo, nunca saberia que não estava na forma humana.

Mas era um aprendizado complicado, ainda mais baseado em sonhos.

Quanto ao tal de Laican, não adiantava eu me afobar, Jena estava mais que certa, eu o conheceria mais cedo ou mais tarde.

Perdida em meus pensamentos mal me toquei que tinha me distanciado do acampamento, mas não fiquei preocupada, ainda sentia a presença das lobas, ainda podia ouvi-las.

Então não retornei, avancei um pouco mais. O lugar era menos arborizado e havia ruínas que ainda ostentavam certa imponência.

Eu sabia mais ou menos que era um lugar do passado, de antes da guerra da Supremacia por causa de Tiago e sua mania de folhear livros ilustrados com essa parte esquecida da história. Papai não gostava dessa mania dele, e o mataria se soubesse que ele compartilhava comigo essas figuras, que me explicava o que era cada coisa, era nosso segredo, embora eu não soubesse ler, ele ia contando cada coisa, com a voz sussurrada e com André de sentinela para avisar caso algum guarda se aproximasse.

Meus encontros com Tiago eram às escondidas, mas ele nunca deixou de se esforçar para manter o laço fraterno, sempre tentou nos ajudar, mesmo que na época fosse um adolescente magrelo e cheio de espinhas com sonhos demais e força de menos.

Lembrar isso me fez sorrir, por fim, minha vida não tinha sido somente amargura, ainda tinha lembranças boas, e Tiago era uma delas.

Foquei minha atenção nas ruínas à frente. Havia uma organização de pilares que ainda sustentavam uma estrutura.

Trepadeiras, líquens e cipós tomavam tudo, mas dava para perceber que tinha sido uma grande casa, ou casarão, fiquei curiosa para saber como era por dentro.

Poderia seguir por aqui? Incerta sobre os limites permitidos olhei para os lados, buscando alguma loba que me fizesse sinal negativo, que me fizesse voltar ao acampamento.

Tratado dos Párias - Supremo Alfa.Onde histórias criam vida. Descubra agora