Saída do Vilarejo

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Novamente eu me via dando passos e mais uma vez a floresta estava sumindo...

Ouvi um chamado, dessa vez parecia mais perto, quase um sussurro e abri os olhos.

Com um pouco de pesar percebi que não era um chamado no sonho o chamado, era Jena.

Fiquei confusa por vê-la.

— Precisamos ir. Está na hora.

Um súbito gelo passou pela minha espinha, estava na hora... Minha mudança, o ritual.

— Você disse...

— Eu sei o que eu disse, mas não há mais tempo a perder. Vamos?

Ainda atordoada por ter o sonho interrompido, levantei um pouco atrapalhada.

Eu não sabia como eram os costumes, mas não parecia ser comum ser levada às pressas desse jeito, mas eu tinha aceitado a oferta e não tinha porque enrolar.

Jena me sorriu de modo tranquilo, tentei retribuir, mostrar a mesma tranquilidade, mas o medo natural do desconhecido me deixava com as mãos trêmulas.

— Deveria ser diferente. — Jena falou ao olhar para minhas mãos inquietas. — Como se fosse seu debute para a vida lupina, mas não temos mais tempo. Se não fizermos agora, perderemos a oportunidade. Só haverá uma lua nesse tempo que dispomos.

Relanceei um olhar especulativo para ela, mas ela balançou a cabeça como se entendesse o que eu pretendia.

— Não posso explicar com detalhes, pois estou no escuro aqui, estamos nos baseando em informações tardias e suposições estratégicas, o que vou adiantar é que daqui em diante tudo pelo que passar, será para o seu crescimento, e preciso que confie em mim.

Sentindo minhas entranhas revirarem concordei com um aceno, eu compreendia o tamanho do passo que estava dando, tinha tido vários dias refletir sobre o ritual, mas, mesmo que Jena tentasse parecer tranquila, não precisava ser um gênio para perceber que tinha coisa errada.

E mesmo percebendo isso eu não tencionava voltar atrás, já tinha uma mordida comigo, e sentia que era graças a ela que muito dos meus terrores estavam ficando para trás e eu queria isso, então, mesmo com as pernas bambas e a sensação de que estavam omitindo coisas de mim, eu me mantive quieta, pois aprendi a resiliência quando servi a meu pai, aprendi da maneira difícil que de nada adiantaria saber o que ia acontecer comigo se eu não fosse capaz de resolver.

— Olha. — Jena colocou a mão em meu ombro e me encarou por um momento. — Após o ritual, muita coisa vai acontecer, mas não está mais sozinha. Uma vez sendo um de nós, seus problemas serão nossos problemas. Entendeu?

Balanço a cabeça e ela continua.

— Talvez, outros lobos apareçam para buscar você, e quanto a isso não poderemos fazer nada, pelo menos até agora não encontramos uma saída para essa regra em particular, mas saiba que o melhor que poderemos fazer para cuidar de você, é adiantar esse ritual, fazer com que você fique preparada para sua loba para que ela possa te proteger e nos ajudar a proteger você. Sei que está com medo, que deve estar achando estranho essa pressa toda, mas com os lobos o estranho é normal, então vou perguntar mais uma vez, tem certeza que fazer parte dessa raça tão imprevisível?

— Tenho. — Não precisei pensar duas vezes porque eu sentia essa gana de buscar uma nova identidade, de pegar toda a história da Celina humana e reescrever por cima, contando a história da loba Celina. Um palimpsesto de vida, era disso que eu precisava.

Mas no meio disso tudo, de tantas esperanças, uma coisa que ela tinha dito estava me deixando inquieta, eu tinha que perguntar.

— Você disse que posso ser levada.

Tratado dos Párias - Supremo Alfa.Where stories live. Discover now