Um sonho com fim.

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...A floresta estava mais clara, mas uma neblina fria e úmida não permitia que se pudesse ver muito longe. Uma pequena área ao meu redor estava tudo nítido, como se um bolsão de ar me indicasse exatamente até onde eu poderia ver.

Mas o céu, era todo limpo, eu podia ver a lua que brilhava de forma extravagante, e estava tão grande que parecia um prato enorme colado no céu. Fora ela, o céu não tinha estrelas, parecia um lençol com nuances acinzentadas.

Tentei avançar já antevendo o momento que seria expulsa do sonho como sempre acontecia.

Um, dois, três... quatro passos e o chão não desvaneceu dessa vez.

Arrisquei o quinto passo e a neblina recuou, liberando um enorme trecho de floresta, talvez fosse o sinal de agora eu podia seguir.

Meus passos então forma automáticos, eu sentia um puxão como se um fio ligado diretamente a minha alma me incitasse a continuar, e movida por uma estranha certeza do caminho a seguir eu apressei o passo.

O lamento que antes era tão distante agora estava perto.

Logo pude ver quem tanto chamou por mim. Era um animal, ele uivava e reconheci a silhueta ao longe. Um lobo, um enorme lobo castanho. Seu corpo estava preso por grossas raízes e ele lutava para se libertar.

Meu corpo eletrizava a cada passo que eu diminuía a distância entre ele. A sensação era nova, eu o sentia a um nível impossível de numerar. O som de seu uivo era familiar, ficar tão perto dele me dava nostalgia como se eu o conhecesse há muito tempo, ainda assim era um lobo que nunca vi antes.

Mesmo confusa pelos sentimentos estranhos eu me aproximei devagar e então ele se aquietou, sua atenção passou a ser toda para mim.

Quando estava perigosamente perto antecipei o momento que ouviria o rosnado, que ele começaria a se debater para se soltar, havia ainda a chance de ele se afastar ou até mesmo me atacar.

Mas ele continuou apenas me encarando, esperando alguma coisa. Seus olhos brilhavam intensamente, não conseguia distinguir uma cor específica já que a lua refletia seu brilho neles. Mas era lindo, só isso me vinha à mente quando parei a pouco mais de um metro de onde ele estava.

Ainda receosa fixei meu olhar nos dele tentando lhe dizer que eu não tinha intenção de feri-lo, que não lhe oferecia perigo e ele continuou inerte, não parecia preocupado e isso fez com que eu diminuísse ainda mais a distância.

Os ramos estranhos se emaranhavam em suas patas como algo vivo, eu precisava libertá-lo.

Abri a boca, mas estranhamente não consegui falar, tentei novamente e o que saiu de meus lábios foi um choramingo, estranhei a selvageria do som.

Baixei a cabeça e prestei maior atenção ao meu próprio corpo, vi patas onde deveria estar meus pés, vi o meu peito forte e os pelos prateados pelo brilho da lua.

Um animal, eu não tinha percebido até esse momento, mas eu era apenas uma observadora. Não era eu que estava ali. E não era eu a morder os cipós com dentes afiados. Não era eu que estava libertando aquela linda criatura castanha e enorme, mas o sentimento de euforia quando o vi liberto era meu...

Despertei de forma lenta, sentindo ainda minha alma naquela floresta. Por um momento ouvi os sons, não era parecido com os do sonho, eu tinha voltado e estranhamente dessa vez não fui expulsa e nem acordei assustada como se tivesse caindo.

Precisei piscar várias vezes para ter certeza que ainda não estava lá, que a luz era do sol e não da lua, mas a lembrança persistia, foi tão nítido e confuso, era eu e ao mesmo tempo...

Tratado dos Párias - Supremo Alfa.Where stories live. Discover now