– E aí, teve uma vez que eu fui presa, e se não fosse pelo Eric, eu estaria morta agora.
   – Como então que o senhor certinho tem uma amiga bem louca assim?
   – Eu e o Eric somos o equilíbrio perfeito. Ele centrado e eu nem um pouco. Ele organizado e eu desorganizada. Ele virginiano e eu ariana. Somos aquelas duas pessoas que todos falavam que iam namorar um dia.
   – E não namoraram? - Perguntou Pedro arqueando a sobrancelha que não estava entrelaçada com o curativo.
   – Com o Eric? Credo. Ele soa demais. Prefiro pessoas mais secas. - Respondeu Agnes. – Mas e você Pedro, não vê problemas em pessoas molhadas? - Perguntou e olhou diretamente para mim. Eu a cerrei com os olhos, a fazendo dar risos baixos.
   – Não – Respondeu Pedro rindo. –, eu não vejo problemas em pessoas molhadas.

Ouvi a porta se abrir devagar e uma voz feminina adentar a sala, e depois romper alguns metros e enfim aparecer na sala de jantar onde estávamos.

Era a mãe do Pedro. Ela pareceu surpresa ao ver eu e Agnes ali. Talvez ela não gostasse de visitas. Nunca se sabe. Eu me senti intimidado, pois não sabia o que ela poderia achar.

   – Não sabia que estava com visitas. - Disse ela.
   – Ah, essa é a Agnes, e o Eric você já conhece.

Ela me deu um sorrisinho. E eu com toda certeza do mundo retribui aquele sorriso com outro tímido. Estava nítido em minha afeição o nervosismo. Ela poderia me odiar. Poderia pensar altas ondas de negações sobre mim. Mas, quando ela se locomoveu em direção a um corredor, ela passou a mão em meu ombro, e vi o Pedro olhar para mim com um rosto cômico. Espero que aquilo seja um bom sinal.
                                       
                                     * * *

Dois dias depois eu acordei um pouco estranho.
Como se tivesse acordado com o pé esquerdo. Como se o sol estivesse brigado comigo e agora estaria de castigo com a supervisão dele.

Lavei meu rosto e não quis tomar café. Dei um beijo da testa de Agnes e fui para o jornal.
Quando cheguei, todos estavam em silêncio.
Então, apenas coloquei minhas coisas em cima da minha mesa, e fui a janela para dar uma olhada na rua. Estava bem movimentada para uma hora como aquela. Voltei a minha mesa e me sentei. Comecei a bater o pé no chão incansavelmente.

Mas, para abrilhantar minha manhã, Pedro inusitadamente apareceu no jornal. Ainda não estava cem por cento recuperado, mas parecia estar bem. Dei um sorriso para ele, e ele respondeu com outro sorriso.

As horas iam de vento em poupa. Nem rápidas, muito menos lentas. Minhas mãos estavam suando. Eu sabia que alguma coisa ia acontecer.

E droga, eu sempre acertava quando algo ia acontecer. Agnes me fez acreditar nesse maldito sexto sentido. E o meu, quando apontava algo sério, sempre acontecia.

As dez horas, dei uma saída para comprar um suco de maracujá numa lanchonete na esquina da praça.

As dez de vinte, quando retornei, fui chamado a sala do senhor Silva. Mas novamente ele não estava lá. Como alguém é dono de uma sala, mas nunca está dentro da sala?
Bárbara estava dentro da sala, e pela segunda vez senti um frio na espinha. Ela não parecia estar contente.

Eu via relâmpagos em seus olhos.
Nos meus olhos, com certeza haviam furações.

   – O que foi dessa vez? - Perguntei.
   – Quis saber se você estava bem, desde aquele dia não nos vimos mais.
   – Achei que isso fosse o melhor.

Ela deu de ombros, e me cerrou com os olhos.

   – Eu estou tentando ser legal com você.
   – Obrigado, mas da última vez que você tentou ser legal comigo, me deu um beijo.
   – Ah. - Ela deu um riso. – Eu sabia que você não iria esquecer. Porque você gostou do beijo, e você queria mais.

Ela se aproximou de mim.

   – Bárbara chega. - Eu a impedi segurando seu braço.
   – Eu que faço as regras, lembra?
   – Com licença, estou atrapalhando algo?

Uma voz tímida rompeu um quase beijo.
Era o Pedro.

   – Pedro! - Falei.
   – Está, você não percebe que eu estou prestes a dar outro beijo nele? Vai procurar um monumento para fotógrafa, não acha melhor?

Todos ficamos em silêncio.
Eu e Pedro nos entreolhamos, mas não nos movemos por uns quinze segundos.
Pedro saiu dali sem expressar qualquer reação.

Bárbara tentou se aproximar de mim mais uma vez, e eu só consegui me afastar bruscamente dela.

   – O que você fez?
   – Ora, expulsei aquele rapaz daqui.
   – Você é louca, eu não quero te beijar. Eu não sou um objeto para você colocar em sua coleção.
   – Espera um pouco.
   – Esperar? Você não sabe o tanto de ódio que estou de você.
   – Ficou nervoso por causa daquele rapaz? - Eu estava respirando rápido e muito profundo. – Está tremendo? Era só um moleque idiota que nos flagrou.
   – Ele não é idiota! - Gritei.

Ela ficou muda e de olhos arregalados. Acho que nunca havia escutado alguém gritar com ela, mas, eu havia feito naquele momento.

   – Agora eu entendi, não é só um rapaz. - Disse ela por fim. – Então você...
   – Eu prometi a mim mesmo que não iria magoar aquela pessoa, mas por sua culpa, falhei em minha missão.
   – Eu não sou obrigada a isso. - Senti ela bufar e passar as mãos no cabelo.

Ela pegou sua bolsa e caminhou em direção a porta.

   – Ele não vai mais olhar na sua cara, é isso que acontece quando alguém se sente traído.

Quando ela saiu, eu fiquei ali sozinho. Naquela sala que havia se tornado imensa. Fria. Cinzenta. Me sentei numa cadeira apoiei minha cabeça na mesa, e só consegui perceber que estava chorando quando o senhor Silva tocou em meu cabelo e me disse que iria ficar tudo bem. Chorei como um recém-nascido. Como se uma coisa horrível tivesse acontecido. Mas, aconteceu.

Ouvi uma falação desenfreada ao lado de fora da sala. Ainda era a voz de Bárbara. Me levantei e sai para ver. Ela estava próxima a porta de saída com seus olhos tempestuosos. Quando ela me viu, se pós a estufar o peito e lançar o cabelo para trás.

    – E esse aí senhoras e senhores, é aquele garoto prodígio. Aquele que todo mundo gosta, mas que ninguém sabe o que esconde. E esconde coisas que deixam os melhores jornalistas de cabelos em pé.
   – Bárbara já chega. - Falei.
    – Tem medo de todo mundo aqui te odiar? Ou melhor, te excluir? Mas é isso que vai acontecer. - Ela virou-se para a escada. Mas antes de descer, inclinou seu rosto para o lado, e continuou: – Passar bem. - E desceu as escadas.

Todos estavam olhando para mim.
Eu me senti coagido, e com absurda vergonha. Queria um buraco para me esconder naquele momento. Me senti tonto, como se minha pressão tivesse baixado.

Minhas pernas tremiam, eu estava tremendo por completo. Senti a mão do senhor Silva novamente em meus ombros, mas não produziu o mesmo efeito de antes. Eu estava chovendo por dentro naquele momento.

– O que estão olhando? Não tem nada de melhor para fazer? - Gritei.

Me virei e abracei o senhor Silva, que naquele momento assumiu um papel importante para mim. O papel de um pai.

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