Capítulo Três

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NÃO SEI PORQUE, mas, sinto algo frio no meu estômago. Brianna se sente desconfortável e disse que vai dar uma volta na praia, Heitor dá um longo beijo em sua testa e ela sai. Louise se senta ao lado de mamãe e Heitor ao meu lado. Às vezes ele não se comportava como meu irmão mais velho, mas como meu pai. Instintivamente ele pega minha mão e a segura por um longo tempo. Me senti um tanto constrangida e incomodada por aquele gesto de afeto, contudo me senti segura. Eu não estava sozinha, nunca estive. Por mais que Heitor brigue comigo, me negligencie, ele me ama, assim como papai.

Sr. Holding categoricamente põe os papéis na mesa, coloca outros na sua perna, e os analisa mais uma vez. Sei que naquelas páginas contém as últimas palavras do meu pai, seus últimos desejos. Ele o escreveu antes mesmo de descobrir a doença. Ou ele já sabia e só contou para nós, um ano atrás? Já que não havia mais jeito? O imagino sentado em sua mesa no escritório, ditando cada linha, ponto e vírgula para que nada saísse fora de controle, para que tudo estivesse como ele queria.

Papai sempre fora assim, controlador e perfeccionista.

- John tinha desejos um tanto peculiares. Ele me disse que antes de tudo, não houvesse atritos ou objeções a sua vontade. O que estava escrito era para ser cumprido e a não ser que fossem cumpridas as cláusulas não haveria acesso a sua herança. – Holding fala.

Minha caixa torácica está inflando mais do que o normal. Subindo e descendo em ritmos descontrolados, Louise estala os dedos rapidamente e nervosa, assim como eu. As palmas de minhas mãos estão transpirando, ou é a mão de Heitor? De qualquer modo, parecemos neste momento compartilharmos de um momento tenso, e isso de forma que desconheço me alegra.

- Vamos à leitura... – Holding pega o primeiro papel e estende a sua frente. Ele parece tão pesado quanto nós neste momento, o quanto de amizade existia entre ele e meu pai? – Possuo hotéis na América, Europa e Oceania. Disponho de uma fortuna avaliada em 300 milhões de dólares. Tanto não me faria rico se não soubesse compartilhá-lo de maneira sábia entre aqueles que estão ao meu redor. Portanto, destino aos cuidados de Heitor Montenegro Hill, meu primogênito, a gerência dos hotéis de Paris e de Veneza e 30% do meu capital particular e acesso aos 100% dos lucros de ambos os hotéis.

Heitor respira fundo, e suas mãos parecem parar aos poucos de transpirar. Ele ficara milionário e de certo modo tive uma vitória, ele tirara Louise da gerência do hotel de Paris. Algo ocorreu para que ele tomasse essa decisão. Agora ela gerenciava apenas o de Dublin, na Irlanda. 

- Quanto a Louise Montenegro, a casa em Nova York será repassada a ela e a Bridget Montenegro Hill, minha esposa. – Sinto uma pontada no peito, e dessa vez as mãos a transpirar são as minhas. A casa de Nova York era a que no mínimo eu merecia ficar, as únicas lembranças mais duradouras e fortes que tenho está naquela casa. – Terão, juntas, acesso a 30% do meu capital particular. Quanto a gerência dos hotéis na Irlanda passo esta para os sócios que outrora cuidavam.

Louise acena lentamente, parecendo decepcionada. Outro gosto de vitória. Ao menos ela não cuidará mais de nenhum dos negócios de papai. Estávamos protegidos.

- Quanto a Leigh Hill, esta ficará com 40% de todo meu capital particular, cuidará das gerências dos hotéis, em Londres na Inglaterra, e em Vancouver no Canadá. – A essa altura nem eu nem todos que estavam na sala não conseguíamos respirar. Eu havia ficado com a maior parte da herança. E com a gerência dos hotéis até então mais lucrativos considerando as estações. – A casa em Beaufort será passada após a leitura deste testamento para o nome de Leigh, e terá acesso a 70% dos lucros dos hotéis gerenciados.

Sinto gosto de bile e ao mesmo tempo admiração. Os últimos desejos do meu pai era deixar a maior parte da herança pra mim. Mas tinha algo de errado, Holding parecia que não tinha terminado de ler. E eu tinha razão.

- Portanto, Leigh, só poderá ter acesso à herança e aos 40% do meu capital particular, mediante as cláusulas a seguir. – Heitor me olha inexpressivo, e sua mão não está mais na minha, eu nem percebi quando ele a tirou. Não quero olhar pra mamãe nem Louise, tudo que quero é sair daqui. Estou sufocada.

- Terá de passar  um fim de semana de cada mês na casa de Beaufort durante um ano. Holding dará uma carta especificando o que irá fazer durante todo esse ano.

Ouço a voz de Louise, mas ela está longe. Um zumbido. Estou paralisada, estagnada... Não sei bem entender o que estou sentindo.

- Gerenciará pessoalmente o hotel de Vancouver, em Londres você poderá escolher outro sócio ou diretor para assumir os comandos. Contudo no primeiro ano você terá acesso a somente 50% dos lucros deste hotel em específico. E nesse período de 12 meses trabalhará como garçonete em uma lanchonete em Vancouver, nas montanhas.

Não sinto mais meus batimentos cardíacos. Um ano... Porque ele especificava um ano em tudo? Garçonete... O que ele queria com isso? Preciso de ar puro o quanto antes. Agora os murmúrios são mais altos e são de satisfação. Louise e mamãe estão explodindo de alegria, claramente.

- Garçonete? – Percebo minha garganta seca.

Holding pela primeira vez levanta os olhos e me encara.

- Sim Srta. Hill. Na verdade, quanto as cláusulas específicas de garçonete, ele queria que conversássemos a sós. Se é que os presentes não se importam. – Ele olha para Heitor que não se opõe e rapidamente se levanta. Ele deve estar nauseado também, pois respira fundo como se estivesse sufocado há muito tempo.

- Acho que nós deveríamos... – Louise começa mas eu a interrompo.

- Sr. Holding se quisermos podemos conversar no escritório. – Digo o mais calmamente possível.

Ele olha para Louise e assente lentamente para mim.

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Querida LeighWhere stories live. Discover now