9 - Violetas - Lana.

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Eu caminhei pelas longas ruas de São Paulo até chegar ao meu apartamento. Quando entrei, vi a minha casa vazia e sem vida. Ou algo na minha casa estava faltando, ou a minha perspectiva mudou durante aquela madrugada. A minha casa possuía um interior totalmente pra baixo, calmo e profundo. Eu não conseguia sentir mais empatia com ela. Algo em mim realmente mudou e o meu exterior precisava mudar também.

                                                                                            ...

Desisti de dormir. Assim que me recuperei do choque de notar a escuridão emotiva do meu lar, tomei um avoado banho e vesti um macacão estilo jardineiro, com uma blusinha laranja por baixo. Sim, laranja. Do nada, comecei a sentir essa fome de cores quentes. Peguei uma bolsa de colo e saí correndo dali.

Meu Uber parou em frente à lojinha que eu adorava. Paguei a corrida e corri para dentro da loja. Fui logo para a seção que eu mais precisava — móveis. Encomendei tudo que precisava de novo. Estantes coloridas, um sofá maior, um tapete amarelo e algumas almofadas coloridas também. Minha casa iria virar um arco-íris. O funcionário Kennedy me garantiu que os móveis chegariam naquele mesmo dia no meu endereço. Eu fiquei atônita. A conta deu quatro mil, quinhentos e noventa e nove reais. Saquei meu bom e velho cartão de crédito e parcelei tudo em dez vezes. Quando terminei a compra e saí do caixa, passei por uma seção que eu não havia visto antes. Era uma seção inteira de flores para decoração de ambientes internos. Elas encantaram os meus olhos e eu não pensei duas vezes.

— Se interessou por alguma?

Disse um moço que trabalhava na loja, quase que cochichando atrás de mim.

— Acho que por todas! — Eu respondi.

— Então leve todas! — Brincou ele, com um sorriso de um canto ao outro da boca.

— Bem que eu queria! — Lamentei. — Na verdade, acho que por agora vou querer uma flor pequena e simples, que dê uma levantada no astral do meu apartamento mas que ao mesmo tempo não ocupe muito espaço.

O moço parecia ter uns 27 anos, um pouco mais velho que eu. Ele era branco como um vampiro e seus braços eram magros como um talher. A forma com que falava era extremamente encantadora, mas ele deve ter aprendido a ser assim num curso barato de vendedor.

— Bom, já que não vai levar todas... — Disse ele, erguendo-se na ponta dos pés e apanhando um vaso pequeno no topo da prateleira com chamativas flores roxas azuladas. — Recomendo essa daqui. São violetas e formam um pequenino buquê.

— Que lindas!

Ele me entregou o pequeno vaso e eu o segurei, admirando as tímidas pétalas das violetas que iriam hospedar minha casa. Fiquei um bom tempo olhando a delicadeza daquela flor, até o moço me interromper.

— E aí, gostou dessa?

— Gostei sim! — Respondi, feliz. — Vou levar essa mesmo.

                                                                                                ...

— E não é que ficaram ótimas? — Disse Elza, ao ver as lindas violetas que estavam sobre a mesa de centro da minha sala. — Esses móveis também são perfeitos.

— O olho da cara. Todos eles. — Eu respondi, sentando no meu sofá novo. Elza fez o mesmo. — Eu só comprei por que minha mãe está sempre mandando dinheiro. Inclusive, eu preciso conversar com você sobre isso.

— Isso o que? — Questionou Elza, colocando seus curtos cabelos loiros atrás da orelha.

Eu cheguei mais perto da minha amiga.

— Eu tenho um dinheiro que o meu pai deixou pra mim. É uma boa quantia, mas eu sinceramente não faço ideia do que fazer com ele. Só o dinheiro que vem da minha mãe já me satisfaz para tudo.

— Lana, você está com muito dinheiro e está reclamando? É isso mesmo?

— Não é isso! — Eu ri. — É que... eu preciso fazer algo com ele.

— Ué... você lembra que quando estávamos no ensino médio, você falava direto que amava medicina?

— Sim, mas eu desisti faz tempo. — Respondi, olhando para o teto tentando me lembrar.

— Ah, qual é Lana? — Disse Elza, desdenhando. — Você tem dinheiro suficiente para concluir um curso inteiro de medicina sem preocupação e ainda ser uma médica maravilhosa.

— Mas eu não quero mais. Eu tinha esse sonho, mas eu não via a hora de sair do ensino médio, de parar de estudar. — Respondi, me levantando e andando pela sala. — Ser médico é maravilhoso, mas acima de tudo, é gostar de estudar e de passar anos com a cara enfiada nos livros. Definitivamente, não é pra mim.

— Você fala isso, por que você é rica e não precisa se preocupar com dinheiro. — Dizia Elza. — Olha aí, a mudança que você fez no seu apartamento. Parecia que você nunca ia perceber que esse lugar precisava de uma mudança. E, cá pra nós, assim está bem melhor. Você está bem melhor. Sempre foi acomodada, Lana! Entende que está desistindo de um sonho por simplesmente achar que estudar é a pior parte? Vai mesmo deixar a preguiça te vencer?

Uau! Ela tinha razão. Permaneci calada, apenas refletindo as palavras da minha sábia amiga que, por sinal, é psicóloga.

— Assim que sair o período de matrícula eu te aviso!

— Não disse que ia topar! — Falei.

— Veremos... Mas, e ai? — Elza ergueu as sobrancelhas, com um sorriso tarado. — Não vai me contar onde passou a noite?

— Ué, não me olha com essa cara não! — Eu respondi, rindo e jogando uma almofada nela. — Eu tava na cafeteria... com um cara. Um estranho, na verdade.

Contei tudo sobre Benjamin e a situação dele com a namorada para Elza. Falei do papo que tivemos a madrugada toda e que ele era um cara muito legal.

— Manda ele esquecer aquela vaca e ficar com você, amiga! — Disse Elza, afoita.

— O que? Está louca? Eu conheci o cara agora!

— Você nunca se importou com isso quando ficou com alguém numa festa.

— Sim, mas a festa é um lugar de pegação. O cara veio falando comigo no meio da calçada deserta dizendo que achava que eu tinha sido assaltada. Eu fiquei com medo, de início, mas depois ele pareceu ser legal. Fora que ele acabou de ser traído, né?

— Se eu fosse você, não esperava mais! Vai que ele volta com essa tal de Clara.

— Só se ele não tiver juízo!

— Só se ele não tiver juízo!

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A Graça das FloresWhere stories live. Discover now