Instinto

Chester

Ele estava vinte minutos atrasado quando entrou na W. Mandeville naquela manhã. Tentou passar despercebido para trás do balcão, mas acabou por levar uma bronca pelo horário. Harry apenas suspirou e se desculpou. Não tinha muito que fazer. Não era como se ele fosse explicar que se atrasou porque transou com seu namorado duas vezes logo pela manhã e ainda o deixou no próprio trabalho antes de praticamente voar até a confeitaria.

Apenas a lembrança dos momentos que passou com Louis desde a última noite o deixavam totalmente arrepiado. Não somente por se lembrar do aroma floral que a pele de Louis exalava, ou do quão quente ele era por dentro, mas também porque ele se lembrava de quão brilhantes ficavam os olhos cor de mar de Louis quando eles se tocavam. E quão úmidos seus lábios vermelhos se tornavam ao balbuciar coisas sem sentido enquanto seu corpo tremia nos braços de Harry.

Louis o enlouquecia...

Mordeu o lábio e balançou a cabeça, tentando afastar os pensamentos impuros que já rondavam sua mente. No entanto, pelo olhar que recebeu de Charlotte, tinha certeza de que ela sabia o motivo de seu atraso. Não com tantos detalhes, é claro, mas aquele arquear de sobrancelhas — que a deixava tão parecida com Louis — foi suficiente para que Harry apenas virasse a cabeça e fosse pendurar seu casaco antes de vestir o avental.

Por um momento ele havia se esquecido de que o turno de Lottie era pela manhã às terças. Talvez ele devesse anotar os horários dela, só pra não ser pego de surpresa novamente, e ter toda a sua alegria sugada pelos enormes olhos azuis dela.

Apressou-se em prender o cabelo, que já quase tocava os ombros, e foi até a cozinha lavar as mãos. Encontrou Barbara lá, mexendo algum creme apressada no fogão. Cheirava bem. Numa rápida conversa, ela lhe explicou que a paróquia faria uma festa de Natal naquela noite e que eles precisavam terminar de rechear os 300 cupcakes da encomenda.

Seria uma manhã cheia.

Entre confeitar cupcakes, atender alguns clientes, tentar responder as mensagens de Louis e se esquivar de Charlotte, ele acabaria falhando em alguma coisa. E, infelizmente, foi na última.

— Ei, Harry — sentiu a mão pequena da garota tocar seu braço, já do lado de fora da loja, quando caminhava até a Sally na hora do almoço.

Com um suspiro cansado, girou nos calcanhares, encarando a cunhada. Precisava admitir que ela era bonita. Realmente bonita. O cabelo loiro e comprido estava jogado pra frente, sobre os seios fartos. Vestia um suéter cor de vinho que lhe moldava a cintura muito bem, junto com jeans claros que revelavam suas formas arredondadas, ainda mais marcadas do que as de Louis. Suas botas pretas de cano baixo, salpicadas de spikes, eram muito parecidas com as que ela usava naquela sexta-feira em que se conheceram, há alguns anos. Foi o fato de encontrar uma garota usando botas sem salto e munhequeiras pretas que motivou Harry a puxar assunto com ela pela primeira vez, ainda no colégio.

Eles engataram uma conversa sobre bandas de rock e filmes antigos, e Harry realmente pensou que eles se tornariam amigos. Até que Louis apareceu, chamando Charlotte para ir para casa. E foi então que Harry pensou que, pela primeira vez, a sorte estava a seu favor.

O que ele não imaginava, no entanto, é que Charlotte o veria como algo a mais do que um parceiro. E muito menos que ela seria sua colega de trabalho e que estaria ali, encarando-o com olhos tão azuis quanto o céu de julho, esperando uma resposta.

— Lottie — limitou-se a chamá-la.

— Eu queria pedir desculpa por aquela bagunça e por você ter tido que limpar comigo — falou timidamente, entrelaçando os dedos com as longas unhas pintadas de preto. — Eu sei que eu sou totalmente desajeitada e que você se irrita, é só... Eu ainda estou aprendendo, sabe?