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KIRA

O suor escorria da minha testa enquanto eu forjava uma faca nova. Já fazia semanas que eu estava naquele lugar, mas jamais me acostumaria com aquilo. Tudo parecia um pesadelo horrível do qual eu não conseguia acordar.

— Hey, você — um guarda grita vindo na minha direção.

Meu coração deu um salto, o que eu tinha feito de errado dessa vez?

— O rei quer te ver — ele avisa me puxando pelo braço. O movimento me faz soltar a faca no chão e receber um olhar cortante do Tyr.

Tyr era o elfo "no comando" ele falava quais armas tínhamos que fazer e quantas fazer. Ele era um pé no saco.

— O que o rei quer comigo? — pergunto enquanto deixo ele me conduzir para longe do burburinho de vozes e trabalho.

Mas ele não responde, envés disso continua me levando por um corredor escuro.

Meu coração começou acelerar, conforme nos afastávamos das pessoas. O corredor estava vazio e escuro.

Imagens da garota amarrada a mesa me atingiram, junto com elas o medo. Medo desse homem me forçar a alguma coisa.

Mas antes que eu pudesse reagir de alguma forma senti um toque no meu braço. Quando olhei pro lado não havia nada, mas o toque permaneceu. E se apertou levemente em torno do meu braço, como se estivesse me dando um apoio.

— Obrigada! — sussurrei o mais baixo que consegui.

Então a mão invisível me soltou. Parte de mim queria agarrar o ar e implorar para que ele ficasse ao meu lado, mas não precisava, mesmo que eu não visse ele eu sabia que ele estava ali.

Então o alivio foi tomando conta de mim, eu não estava sozinha. E mesmo que eu não confiasse totalmente no homem que ficava invisível ainda assim, saber que ele estava comigo, trazia um tipo de alivio e consolo.

Paramos em frente a uma enorme porta de madeira. Havia dois minotauros guardando a porta.

— Siga reto até o fim e depois vire a direita — o guarda me orienta — Não se desvie do caminho. Nem pense em bisbilhotar o que não é da sua conta.

Apenas faço que sim com a cabeça e ele abre a porta.

O que surgiu a diante quase me deixou de queixo caído.

Era um imenso e lindo corredor.

No chão havia quadrados branco e preto, como um jogo de xadrez.

As paredes eram cinzas claro e tinha alguns quadros e vasos de flores.

Do lado esquerdo tinha três enormes janelas, através do vidro perfeitamente limpo, era possível ver montanhas e areia. Apesar da escuridão que pairava naquele lugar, havia algo de belo naquela paisagem.

Comecei a caminhar pelo corredor devagar. E dei um pulo de susto quando as portas de madeira foram fechadas atras de mim. Eu estava sozinha.

Segui pelo corredor devagar e em alerta.

— Se você ainda estiver aqui, por favor. Me de um sinal — sussurro torcendo para o homem misterioso ter me acompanhado.

Mas nada aconteceu, nenhum toque, nenhum vaso de flor mexendo sozinho.

Eu estava sozinha então.

Continuei caminhando e virei a direita como o homem ordenou. Não demorou muito para eu chegar a uma sala.

Meus joelhos quase falharam quando avistei a deusa Hel no canto da sala tocando um piano, enquanto Osíris cantava baixinho alguma musica em uma língua antiga.

Alexandre estava sentado no sofá. Ele tinha uma postura relaxada, em uma de suas mãos estava um copo de whisky e ao seu lado estava o deus Hades. Os dois conversavam animadamente, como velhos amigos.

Fiquei paralisada observando a cena até que os olhos intensos do Alexandre recaíram sobre mim.

— Não seja tímida Kira, aproxime-se. — ele diz abrindo um espaço ao seu lado.

Caminho até ele e sento no espaço vago. Era entre ele e Hades e naquele momento senti minhas mãos tremerem levemente.

— Meu mais novo amigo Hades, estava me contando uma história engraçada de como ele sequestrou a Perséfone. Você sabia disso? — Alexandre pergunta.

— Acho que ouvi histórias. — admito.

— Ah mais vindo direto da fonte é sempre melhor, você não acha?

— Com certeza.

— Você certamente vai adorar essa. Parece que Hades e eu temos algumas coisas em comum. Vimos algo que gostamos e simplesmente vamos lá e pegamos. — seu sorriso malicioso me fez querer entrar dentro do sofá e sumir, mas vez disso me peguei dizendo.

— Pela quantidade de pessoas nesse lugar você deve gostar de muita coisa.

Ele me encara tão intensamente que achei que tivesse descoberto que eu não era como os outros escravos alienados. Mas então, aos poucos ele abre um sorriso.

— Eu tenho um grande coração.

— Ou um grande dom pra encher o saco — Hel comenta.

— Eu não disse pra você falar querida, apenas toque. Mas rápido. — apesar das palavras terem sido ditas entre sorrisos havia uma agressividade disfarçada nelas.

E quando observei a Hel, notei pequenas manchas nas teclas do piano. Sangue. As pontas de seus dedos estavam sangrando.

A quanto tempo ela estava tocando?

Então eu finalmente entendi tudo aquilo. A principio eu tinha pensado que os deuses estavam ao lado do Alexandre, mas aquilo era apenas uma cena. Os deuses estavam sendo obrigados aquilo. Mesmo Hades que parecia ser o mais relaxado, possuía um leve brilho de raiva em seus olhos.

E quando ignorei a cena inicial e prestei atenção ao redor, notei que Osíris estava rouco. E pelo tom de sua canção imaginei que estivesse amaldiçoando o Alexandre, ou implorando para que aquilo parasse.

— Alguma coisa errada Kira? — Alexandre pergunta notando meu olhar nos deuses. Imediatamente volto minha atenção a ele.

Tudo estava errado e eu queria sair correndo.

Por que se ao meu lado estava um homem que podia fazer três deuses obedece-lo como um cachorro, o que ele não faria comigo? Uma simples rainha parte elfa e parte demônio que nem conseguia empunhar uma espada direito?

Antes que meu pânico se tornasse visível aos olhos dele, eu sorri.

— Nada, apenas estou curiosa... por quê me chamou aqui? Não que eu não esteja grata majestade, me sinto profundamente honrada. — soou o mais grata possível. Se os deuses podiam forçar aquela encenação, então eu também podia.

— Queria sua companhia para o jantar. É sempre bom jantar com uma rainha — ele responde me lançando um sorriso malicioso.

Eu tinha que admitir que o desgraçado era bonito. Seus cabelos negros destacavam seus olhos azuis, quase tornando a beleza dele rara.

— Igualmente meu rei — respondo.

— Vamos então? — antes que eu pudesse responder ele já estava pegando minha mão e me puxando para levantar.

Seguimos pelos corredores de braços dados. Estávamos tão perto que foi possível sentir o cheiro dele. Um perfume agradável, do tipo que fazia você querer se aproximar e inspirar aquele cheiro.

Isso me fez lembrar como eu estava suja e necessitando de um banho, mas tentei empurrar minhas necessidades pra longe. Eu precisava me manter alerta ali.

Então ele me conduziu por longos corredores. Eu estava admirada, o lugar era impressionante. Parecia que ele tinha conseguido construir um castelo bem no meio daquela poeira toda. O que me fez pensar, a quanto tempo ele vivia ali? A quanto tempo ele estava reunindo exércitos?

Meus pensamentos foram interrompidos quando chegamos a sala de jantar e meu queixo quase caiu quando vi meu irmão Zeythan a nossa espera.

Herdeira do Submundo 2 - Coroa InfernalOnde as histórias ganham vida. Descobre agora