Capítulo 5: Bolo

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Felizmente, a porta da cozinha estava apenas encostada. Ela empurrou a mesma, adentrando a cozinha perfeitamente organizada de Brenda.

As cortinas amarelas com estampas de reluzentes limões combinavam com os reais que enfeitavam a fruteira, ao lado de maçãs e ameixas.

Pensou apenas em depositar o bolo sobre a mesa e sair, mas outra ideia lhe ocorreu.

Com cuidado, cortou um pedaço do bolo e colocou-o em um guardanapo, lavando e guardando a faca logo em seguida. Depois, teria de trocar os bolos para que não desconfiassem.

Respirando fundo e com o coração batendo mais forte, começou a subir as escadas.

O caminho estava escuro, mesmo com o sol entrando pelas frestas das cortinas fechadas. Quadros e mais quadros cobriam as paredes quase que de cima a baixo, e o corredor cheirava levemente a cloro e um odor quase imperceptível de algo que ela não sabia definir.

Um ruído extremamente baixo se fazia ouvir, como um leve arranhar nas paredes.

- Olá? - Chamou. O ruído cessou.

Pé ante pé foi percorrendo o corredor, tentando descobrir em qual das muitas portas se encontrava a filha de Jimmy.

Ao virar o mesmo, deu de cara com uma escada íngreme, que levava a uma única porta branca.

O sótão.

Na mesma, havia uma portinhola rente ao chão, impossível de se passar alguém, mas suficientemente grande para se passar algo.

Deitou-se de barriga no chão e puxou a portinhola para cima, espiando o lado de dentro.

O quarto estaria em completa penumbra, se não fosse a pequena janela que o iluminava de forma precária.

Tentou ver alguma coisa, mas de onde estava, só conseguia ver a janela, uma cama vazia e desarrumada e uma boneca de pano estirada no chão.

- Olá? - Chamou novamente, desta vez num sussurro.

Sentia o sangue pulsando em suas orelhas, enquanto tentava respirar o mais silenciosamente possível. Sua bexiga apertou-se em uma repentina vontade de fazer xixi.

O sentimento lhe lembrava as brincadeiras de pique-esconde, onde a adrenalina somada a expectativa de ser encontrada a qualquer momento quase sempre acabava com as roupas de baixo úmidas.

Estava quase indo embora, quando, de repente, um rosto apareceu rente ao seu, bem perto da portinhola.

Alyssa sentiu seu coração pular uma batida por conta do susto, e teve de conter um grito.

A garota a sua frente aparentava ser bem jovem, com um rosto fino, esquálido, boca pequena e olhos azuis levemente arregalados. Possuía cabelos lisos, finos e castanhos escuros, que caíam em uma de suas bochechas fundas, enquanto a outra estava prensada no chão, na mesma posição que a loira.

- Oi. - Sorriu Alyssa de forma doce, recuperando-se do susto.

A garota não respondeu, fitando-a silenciosamente com a curiosidade e o medo visivelmente estampados em seus olhos.

- Eu trouxe uma coisa para você. - Ela pegou o bolo ao seu lado e empurrou-o pela portinhola. A garota recuou. - Ei, calma! Eu não vou te machucar, tudo bem? É só bolo.

A morena aproximou-se do doce de forma cautelosa. Pegou-o entre as mãos encardidas e machucadas e o cheirou de forma desconfiada.

- Não se preocupe. É chocolate. Espero que goste.

A garota pareceu se convencer, dando uma grande mordida na fatia.

Em pouco tempo, até o chocolate que havia grudado no papel se fora.

- Parece que temos algo em comum, eu adoro chocolate.

A menina empurrou o guardanapo vazio com a ponta dos dedos para o lado de fora do quarto, recolhendo-os rapidamente em seguida.

- Qual o seu nome? - Indagou ela.

Silêncio.

- Bom... eu sou Alyssa. Sou a nova esposa do seu pai.

No momento em que terminou de dizer aquilo, a garota olhou para ela com o olhar alarmado e começou a grunhir de forma quase selvagem, batendo na porta como se quisesse sair.

Assustada com a mudança brusca de comportamento, Alyssa se jogou para trás, mas a garota conseguiu agarrar seu tornozelo, fincando as unhas longas e irregulares em sua pele.

Com o coração aos saltos, conseguiu se desvencilhar do aperto, correndo para fora daquela casa o mais rápido possível.

Não parou até que chegasse em sua própria.

Ao entrar, recostou-se na porta, escorregando até o chão enquanto tentava controlar sua respiração.

O susto havia sido tão grande que havia voltado à infância, afinal. Enfiou-se no chuveiro de roupa e tudo, tremendo e processando a imagem e o comportamento da garota presa no sótão.

Alyssa deveria ter ficado assustada, mas não era exatamente este o sentimento que apontara dentro de si naquele momento. Sabia que Jimmy prometera começar o tratamento o mais rápido possível, mas ela sentia uma sensação de urgência dentro de si que dizia que aquela garota precisava de ajuda o mais rápido possível. Se o problema fosse dinheiro, então ela poderia ajudar. Afinal estavam casados e ela tinha suas economias.

Estava piamente decidida a ajudar, quer eles queiram ou não.

Ela só não sabia se era por compaixão ou pura tolice.

Doce InocênciaWhere stories live. Discover now