Dor.

18 4 2
                                    

Japão, Tokyo. 19:05.





Nagumo não iria.

Havia decidido-se. Não queria ter de lidar com tudo aquilo, não queria ter de fingir ser alguém plenamente feliz, não queria precisar olhar para a face de Kiyama Tatsuya sem lembrar-se de tudo. Era incrível como doía, mesmo depois de anos terem passado-se. Todas as vezes em que fitava aquele olhar indescritível, sentia seu estômago revirar em resposta à cada uma das lembranças que vinham-lhe à tona. Odiava aquele sorriso, como odiava. Odiava aquela personalidade tranquila, aquele ar de maturidade, tudo. Havia passado por maus bocados e tudo o que queria no momento era ter a "tranquilidade" - entre aspas, pois não era a mesma propriamente dita - que nunca tivera desde aquele dia. E o pior é que sabia que o seu ódio por ele não fazia o mínimo sentido. Provavelmente, seu inconsciente havia adotado a idéia de que, se ele estava naquela situação tenebrosa atualmente, a culpa havia sido dele, o dono da Gênesis. Ah, sim. Ele tinha dedo nisso, mesmo que provavelmente não soubesse, de fato, o que estava se passando com o ruivo. Droga. Por que somente ele sofria? Por que Kiyama Tatsuya aparentava não deixar-se abalar por nada? Aliás, por que ele mesmo ainda submetia-se àquilo se agora as coisas haviam mudado tanto para ambos?

Obviamente, era medo. Mas além do medo, Nagumo via-se em um dilema que estava a agoniar-lhe a cabeça desde o momento em que dissera um "não" curto e grosso para Suzuno Fuusuke no estacionamento do shopping. Não queria vê-lo, não queria interagir com Kiyama, mas seu coração parecia dizer-lhe outra coisa. De repente, as imagens de Gazel, ou "Suzy", como costuma chamar, pareciam tomar conta de si mais do que o próprio Tatsuya. Recordou-se que, se parte de sua felicidade havia voltado para si, era porque Suzuno havia aceitado ser seu amigo. Burn esforçou-se, ele também, e gradativamente ambos foram construindo laços no qual nunca tiveram, já que Nagumo passara toda a sua vida utilizando-se de máscaras para conquistar seus amantes e deleitar-se em desejos carnais. Mas agora, o ruivo estava provando de um relacionamento verdadeiro, no qual viu-se realmente bem, suave, pleno. Se Gazel estava com ele, tudo ficava tão bonito. E o mais estranho era que sua felicidade parecia neo ser nada quando comparada ao do estilista; era tão gratificante vê-lo bem ao seu lado. Ele estava fazendo certo, não estava? Ele estava melhorando, correto? Era o que queria. Não gostaria de ver-se sujo novamente. Não queria fazer coisas sujas, não queria utilizar-se de feições e personalidades que não eram suas. E agora, ele tinha um melhor amigo. Alguém no qual confiava em si e vice-versa. Burn era grato aos céus por aquilo... E percebeu então que havia sido egoísta demais.

Passara todo esse tempo remoendo este egoísmo no peito. Seu orgulho não o fazia mover-se, mas seu íntimo já havia reconhecido que ele estava errado. Não deveria ter falado daquela maneira, não deveria ter respondido de maneira tão rude alguém que, claramente, só queria mesmo auxiliá-lo. Ter pensado somente em si e no que sentia havia sido um erro, e quase que instantâneamente ele mudara a resposta das perguntas que Suzuno tanto lhe fizera; sim. Valia à pena ir ao suposto jantar, pelo menos por ele. E tendo em vista esta afirmação, pôs-se ao trabalho para poder comparecer à casa do amigo e não acabar estragando tudo; saiu à tarde para comprar alguns doces, como brigadeiros, para levar ao jantar, como uma surpresa. Pensou em sorvete ou em churros, mas desistiu, já que de repente encontrara os doces primeiro - e não que não houvesse um do sabor "churros". - Tomara banho, arrumou-se, trajando uma calça jeans clara, uma camisa de manga curta em branco e azul, com estampas que mais pareciam pichações em tons de amarelo, preto e laranja, e um tênis também preto de cano alto. Gostava dessa combinação. Estava nervoso, porém mais ainda ansioso. Havia criado coragem o suficiente para de repente dar as caras na casa do amigo. Inclusive não cogitara a idéia de avisá-lo antes, já que preferiu lhe fazer uma surpresa.

Spice!Where stories live. Discover now