Dois.

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Camila

Eu sabia o que chegar atrasada ao trabalho significava. Connor ficaria furioso comigo, mas não por ter que me cobrir na recepção por menos de uma hora. Na sua cabeça doentia, a única razão possível para eu atrasar cinquenta e cinco minutos numa sexta-feira de manhã era porque eu tinha dormido com alguém. Não importava quem. O garçom do restaurante, o cara que educadamente e inocentemente abriu a porta da cafeteria para mim, ou até mesmo o caixa do banco onde demorei um pouco mais do que o normal para fazer um depósito no outro dia.

Não me lembro exatamente quando o ciúme e a possessividade começaram. Talvez sempre estivessem lá, eu só estava muito cega para conseguir enxergar. Mas, quando enfim abri os olhos, acusações já faziam parte da nossa rotina diária. Acho que o fato de eu ser dona de uma academia não ajuda muito. Um lugar cheio de homens parrudos transbordando testosterona, onde Connor passa a maior parte dos seus dias treinando para a sua próxima luta no MMA Open.

A Academia Cabello's foi fundada pelo meu pai e o sócio dele, o tio de Connor, Ray Phillips. Os dois homens eram melhores amigos desde pequenos. Ambos se dedicaram ao esporte: meu pai fez seu nome como lutador e Ray, como treinador profissional. Quinze anos atrás, meu pai — conhecido por todo mundo no universo das lutas como "The Saint" — se aposentou como campeão peso-médio da Conferência de Boxe dos Estados Unidos. Aproveitando-se da fama e do talento de Ray como treinador, os dois melhores amigos decidiram abrir uma academia dedicada a Artes Marciais Mistas. Na época, o esporte estava começando a ganhar popularidade a nível nacional e havia poucas academias destinadas a treinar lutadores que desejassem ser profissionais de MMA. A academia da dupla dinâmica deslanchou após o esporte crescer tanto e tão rapidamente. Uma academia se tornou duas, depois quatro, depois dezoito em apenas três anos. Hoje, o nome Cabello's detém o mercado de luta da costa leste, operando em sessenta e duas localidades.

Relutantemente, espio pela porta de vidro na entrada da academia. Sinto uma onda de alívio ao ver que ele não está lá. Sentado. Irritado. Esperando por mim para fazer uma inquisição ofensiva completa. Mas os malditos sinos amarrados em cima da porta balançam fortemente, mesmo eu tentando abrir cuidadosamente a porta. Merda, preciso me livrar dessas coisas.

— Onde você estava? — Connor já está em cima de mim antes mesmo que eu tenha terminado de tirar o casaco.

— Eu dormi demais. Desculpe ter te feito me cobrir aqui. — Abro um sorriso hesitante e forçado. Em seguida, dou de ombros, tentando parecer casual, e pego a correspondência em cima do balcão da recepção.

— Então, por que seu celular não te despertou? Eu liguei. Você devia estar muito ocupada para atender. — Não há nenhuma dúvida da raiva em sua voz e da ponta de sarcasmo ao dizer que estive ocupada.

Pegando meu celular na bolsa, olho a tela e vejo onze ligações perdidas. Todas de Connor. Uma rápida avaliação entre o tempo das chamadas me diz que ele estava ficando impaciente. E rápido. As primeiras ligações foram com intervalos de cinco minutos... as últimas, com menos de um minuto.

— Sinto muito. Devo ter esquecido de ativar o som novamente ontem à noite. Fui para a aula e depois caí no sono.

— Você está se desculpando muito essa manhã, não é?

Baixo o tom de voz. Não quero uma cena. De novo, não.

— Por favor, não faça isso, Connor. Eu fui para a aula e depois para casa. Não ouvi o alarme do celular pela mesma razão que não ouvi suas ligações. Ele estava no silencioso. Não transforme isso em algo mais do que é. — Faço uma pausa, ponderando as palavras por alguns segundos. — E você precisa parar de agir como se ainda estivéssemos juntos, Connor.

Fighter - IntersexualOnde as histórias ganham vida. Descobre agora