73● Com o tempo vem a saudade

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Ficarei bem aqui, enquanto os dias durarem e o amor permanecer.

Rafael

3 meses depois

Dias e horas eram difíceis, tornava complicado respirar e aceitar. Acordava todos os dias e tentava me envolver nas pequenas coisas, em uma foto, em um áudio, em gravações de quando cantávamos juntos, mas nada era o suficiente, parecia haver uma brecha em cada canto que antes ela habitou. Mais estranho do que estar sozinho era ver a vida de todos a minha volta ganhar um novo sentido, enquanto a minha parecia apenas despencar.

O filho do Léo e da Isa tinha nascido, aquele foi um dia bastante turbulento. Isa queria que a Lu estivesse com ela  e eu queria fugir pelo mesmo motivo, mas fiquei lá. Dei apoio ao Leonardo e garanti que tudo ficaria bem, mas quando o pequeno Andrew nasceu tudo o que consegui fazer foi fugir, não gostava de ver a sombra de uma vida que talvez eu jamais tivesse, e não queria ser um fardo em um dia tão memorável.

Os cachorrinhos da Nevasca e do Darth também tinham nascido, porém  dessa tarefa era impossível fugir. Comecei a me sentir da família da Luiza, todos os dias ia a casa dela e cuidava daqueles filhotinhos, pelo menos até chegar o tempos e doa-los. Minhas visitas sempre acabavam em um café da tarde ou uma conversa com sorrisos dolorosos, por gestos eles deixaram bem claro que minha presença preenchia um enorme vazio, mas a verdade era que eu me sentia bem naquela casa, havia partes da Lu em casa cantinho. Pelo menos eles entendiam o que eu estava passando.

Talvez a única coisa que me fizesse me sentir melhor era ter a certeza de que realmente estava recuperado, depois que tive alta precisei voltar a ir regularmente ao hospital, primeiramente pela Lu, e depois porque ainda tinha algumas seções de químio. Quando terminava  simplesmente me desvencilhava para o lado dela, e segurava sua mão até alguém me expulsar de la.

Nato tinha reaberto o Golden, ele relutou por dois meses dizendo que não era justo celebrar quando a Lu estava no hospital, mas chegou uma hora que nem as contas e nem os clientes puderam esperar, por isso  reabriu, e como uma forma de consolo e fuga me ofereci para voltar a tocar. Pelo menos naquele palco eu conseguia senti-la ao meu lado, conseguia acreditar que um dia tudo voltaria ao normal. Por vezes até  dividia o palco com o Dante, voltamos a nos dar bem, talvez até ja o considerasse um amigo, mas não admitia.

Desde então comecei a compor, em partes por que era bom contrariar o meu bom senso e escrever música para ela, meu pai sempre me pegava escondido testando as notas e ria, dizendo que sabia que em algum momento aquilo iria acontecer. As letras não faziam muito sentido, mas mas me davam certo consolo, pois ali estariam marcados detalhes da Luiza, detalhes que eu não queria esquecer, mas que o tempo insistia em arrancar de mim.

Todos os dias eu ia a ver, os pais dela a visitavam de manhã e a noite, mas me permitiram passar a noites ao lado dela. Tinham a transferido para um quarto, três meses era tempo de mais para ficar em uma UTI. Todas as noites eu tocava para a Lu, tentava decorar cada traço do seu rosto e me lamentava, abria meu coração apenas porque sabia que ela jamais se lembraria dos meus lamentos. Não queria que Luiza se recordasse de tudo o que falei, pois jamais me senti tão deprimido. Continuava tentando ser forte, tentava prosseguir com a minha vida e me lembrar que em algum momento tudo ficaria bem, mas sempre tinha uma voz que insistia em sussurrar que talvez as coisas só piorassem, talvez eu fosse obrigado a viver sem a parte essencial de mim, talvez eu fosse obrigado a seguir em frente.

Consequentemente toda a situação me tornou mas frio, meus amigos diziam que eu não sorria mais, não era mais quem costumava ser, e então eu ria achando tudo ridículo. Como alguém podia ser o mesmo depois de ter passado pelo que passsei? Eu ao menos podia dormir direito a noite por causa dos pesadelos. Apenas passava pelos dias, mostrando o que restou de mim e tentando não perder essas partes devastadas também.

EternoWhere stories live. Discover now