Capítulo 3: Caindo na real (Rafael)

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Estou internado há algum tempo, literalmente quebrado e tentando assimilar o que aconteceu. Sinto dor até nos fios de cabelo que me restaram depois da cirurgia e que isso não soe fresco, porque esse comportamento não condiz com o de um lutador de MMA.

Não me lembro muito do acidente, sei que cheguei de viagem, não avisei a ninguém e queria espairecer.

Coloquei minha roupa e acessórios de ciclista e deixei o apartamento, sem celular ou documentos.

Andar de bicicleta, além de completar meu treinamento, é uma paixão, algo que faço quando preciso esvaziar minha mente.

Comecei a pedalar, sorrindo com a sensação de liberdade que tinha e gargalhando quando sentia o vento bater no meu rosto.

De repente, ouvi gritos, buzinas, freadas e não me lembro de mais nada.

Sofri múltiplas fraturas, contusões e cortes. Ainda não consegui assimilar tudo o que aconteceu. Ninguém conversou comigo porque ainda não estou em condições, mas não sou ignorante. Os profissionais entram, discutem meu caso e tem zum zum zum todo o tempo. Parece que será um longo período de recuperação e ainda não sabem precisar quando ou se vou poder voltar a treinar. Eu não tinha forças nem para gritar, mas fiquei desesperado com essa possibilidade.

Isso não podia estar acontecendo comigo. O que seria de mim se não pudesse lutar mais? Que merda de vida! Será que eu mereço passar por isso?A única conclusão que chego é que devo merecer, mas isso não me basta, eu não me conformo com o pouco. Eu sou um lutador e lutarei até o fim. Desistir é um verbo que não faz parte do meu vocabulário.

****

Com o passar dos dias, apesar das dores, me sentia uma pouco mais animado. Meu novo horário preferido do dia era o horário de visitas. E, de maneira nenhuma, pensem que era por causa da Ava ou de qualquer outro. Na realidade, eu ficava louco para que fossem embora. Eu nunca conversei com eles, simplesmente não queria abrir os olhos e ver a pena estampada na cara de ninguém.

Por falar em Ava, onde eu estava com a cabeça quando fiquei com ela? Eu a pedi em namoro? Nunca soube disso. Só fiquei com ela porque Otto insistiu e disse que ela parecia ser gostosa. Ela era mais uma das delícias que eu pegava, mas nunca apeguei a ninguém e ela sabia disso. E agora ela ficava pagando de namoradinha? Sempre foi apenas sexo. Como se não me faltassem problemas, agora eu ainda tenho que arcar com as consequências de só pensar com a cabeça de baixo.

A pessoa é tão fútil que entrava no quarto do pronto-socorro e quase não olhava para mim. Ainda bem que ela nunca me encostou. Provavelmente eu a repeliria e meus planos iriam por água abaixo. Acho que só ficava trocando mensagens de celular e aquelas notificações me enchiam o saco, me incomodavam demais. Custava pelo menos deixar aquela merda no silencioso?

Poucas vezes ela se aproximou da minha cama e quando fazia o comentário era sempre o mesmo:

- Coitado, Otto! – dizia a periguete com aquela voz de taquara rachada. Sim, ela tinha essa voz por usar substâncias anabolizantes.

 - Fica quieta, Ava. – Otto sempre rosnava.

- Você acha que ele vai precisar de cirurgia plástica? Ele nunca machucou tanto nas lutas. Ele ficou tão feio com a cara toda inchada, cortada e roxa!  Não tenho nem vontade de beijá-lo. – ela disparava tanta coisa inútil que meu lado ogro queria me fazer levantar e cuspir na cara da cadela. Eu falei isso mesmo? Que coisa de mulherzinha esse negócio de cuspir na cara. Será que perdi uns neurônios nesse acidente? Pelo menos ela não tinha vontade de me beijar, e era recíproco.

- Eu mandei você calar a boca! Você não consegue ser mais agradável, Ava? – que bom que o Otto já estava dominando a questão por mim.

Essas visitas desagradáveis me desgastavam ainda mais. Sentia minhas energias minarem. Preferia que as suspendessem, mas nunca me manifestei, porque eu sempre fingi estar dormindo.

Transformados pelo amor (Livro 1: Tinha que ser Você) -  disponível até 30/09Where stories live. Discover now